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Produtor abre cafeteria e faz saca de café valer quase 50 vezes mais

José Bonato

Do UOL, em Ribeirão Preto (SP)

24/10/2013 06h00

No mercado tradicional de café, uma saca de 60 quilos obtida na fazenda Sapecado, em Cravinhos (SP), vale R$ 400. Essa mesma saca transformada em bebida rende R$ 19,8 mil --quase 50 vezes mais-- na cafeteria que os produtores abriram em um shopping da região.

O dono da fazenda, Francisco Castilho, 47, abriu a cafeteria em parceria com a mulher, a advogada Mariana Boechat, 34.

Essa tem sido uma saída adotada por alguns produtores: mirar no consumidor final para aumentar a rentabilidade das colheitas e reduzir a dependência em relação ao mercado de grãos, no qual os valores pagos pela saca nem sempre cobrem o custo de produção.

Abertura de cafeterias, criação de franquias, e produção e venda de grãos especiais vêm se tornando uma tendência, segundo Nathan Herszkowicz, 63, diretor executivo da Abic (Associação Brasileira da Indústria do Café).

Enquanto o segmento de bebidas especiais, preparadas com café gourmet, cresce 15% ao ano, o de commodities (grãos vendidos crus) se mantém no patamar anual de 1,5%, de acordo com Herszkowicz.

“É uma tendência crescente e, por isso, o Brasil vem sendo considerado o maior provedor de grãos de alta qualidade. O mercado gira em torno de R$ 2 bilhões por ano”, afirma.

Dono de fazenda em Cravinhos (SP) já lançou franquia de cafeteria

O esforço em busca do consumidor final tem compensado financeiramente, segundo Castilho, da fazenda Sapecado, em Cravinhos (292 km de São Paulo).

A fazenda Sapecado colhe em média 3.500 sacas por ano, em 65 hectares cultivados.

Cada saca do grão torrado, que “encolhe” para 48 quilos devido à perda da umidade, rende 5.500 xícaras na loja de café, a R$ 3,60 cada.

“Eu nunca fechei o mês no vermelho”, afirma Mariana Boechat, que fez cursos sobre a bebida nos Estados Unidos e administra a cafeteria DOC Café juntamente com a irmã Carolina Boechat, 35.

A família lançou, recentemente, sua primeira franquia, que funciona em um shopping na zona sul de Ribeirão Preto (SP), e negocia a criação de outras duas em cidades do interior paulista.

Família de Batatais (SP) cria marca própria de café

Produtora do grão há mais de um século, uma família de Batatais (352 km de São Paulo) criou há um ano uma marca própria de café, o Café Ananias. O plantio é feito em fazendas em Altinópolis (333 km de São Paulo) e Itamogi, cidade do sul de Minas Gerais.

A área com plantio de café ocupa 120 hectares.

São colhidas, em média, 4.500 sacas de 60 quilos por ano nas duas propriedades, segundo o produtor Rudolf Kamensek Júnior, 48, que divide a responsabilidade do negócio com os irmãos Fernando, Andréa e Adriana.

Depois da colheita, entre maio e agosto, a parte mais nobre da produção, que corresponde a 20% dos grãos, é separada, embalada e vendida sob quatro denominações: Premium, Espresso, Gourmet e Gourmet Premium.

Esse café diferenciado é vendido para empórios, cafeterias e supermercados de São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, conta Kamensek Júnior.

Os preços variam de R$ 20 o quilo (Premium) a R$ 35 (Gourmet Premium). Considerando um preço médio de R$ 27,5 o quilo, cada saca, pesando 48 quilos depois de torrada, chega a valer R$ 1.320.

Diversificação é estratégia para driblar crise do setor

Agregar qualidade ao produto é uma tendência para driblar a crise da cafeicultura, afirma Kamensek Júnior. "O produtor que sair na frente vai ganhar mercado”, diz.

Há um ano, toda a produção das fazendas de Altinópolis e Itamogi era comercializada, como café "verde", em cooperativas e torrefações.

Depois de receber prêmios pela qualidade do grão, há dois anos, a família Kamensek resolveu investir em qualidade para aumentar a rentabilidade do negócio. Em 2012, teve início a torra do grão, numa empresa aberta em Batatais.

O próximo passo, segundo Kamensek Júnior, vai ser a criação de uma franquia de lojas de café.

Parceria fornece máquinas e grãos especiais para cafeterias e padarias

Já o Café Vicentini, que produz seus grãos em 300 hectares distribuídos entre cinco fazendas centenárias em Altinópolis (SP), vem mirando forte o consumidor final nos últimos quatro anos, mas numa estratégia de parceria com cafeterias, em vez de abertura de lojas ou criação de franquia.

Segundo Guilherme Salomão Vicentini, 33, presidente do Sindicato Rural de Altinópolis e sócio da empresa, são fornecidas máquinas e grãos especiais para cafeterias e padarias de Ribeirão Preto (SP) que queiram colocar o produto na xícara do consumidor.

Ribeirão Preto é o foco da empresa na distribuição dos grãos finos, que representam entre 20% e 30% da colheita anual de 10 mil sacas de 60 quilos. A empresa usa somente grãos de suas fazendas para compor os lotes de cafés de qualidade.

“Nós misturamos café de diferentes safras, degustando cada lote até atingir o padrão de qualidade almejado. Agora, por exemplo, estamos acrescentando os grãos da safra deste ano aos que foram colhidos no ano passado”, disse Vicentini.

Para ele, o caminho do produtor é agregar qualidade à produção para obter melhor remuneração.

“Não tenho dúvida disso. A cafeicultura vive atualmente uma de suas piores crises. Os R$ 250 pagos hoje pela saca são os mesmos que os produtores recebiam há 15 anos. Para se ter uma ideia da situação, comprava-se uma tonelada de adubo com um saco de café há 15 anos. Hoje, são necessários quatro sacos. O óleo diesel custava R$ 0,43 o litro na mesma época. Hoje custa R$ 2,30 nas bombas.”