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Azeite brasileiro tenta se impor em mercado dominado por importados

André Cabette Fábio

Do UOL, em São Paulo

19/12/2013 06h00

Um azeite brasileiro está buscando lugar nas prateleiras de supermercados do país, espaço tradicionalmente ocupado por produtos importados de Portugal, Espanha e Itália, entre outros.

O produto é o Olivas do Sul, azeite extravirgem fabricado com azeitonas colhidas em Cachoeira do Sul (RS). A produção comercial é feita desde 2011 e, neste ano, chegou a 15 mil litros.

O volume é maior do que o da soma de todos os outros 30 produtores de azeite da região Sul, que, juntos, fabricam cerca de 10 mil litros por ano.

Esse azeite também tem se destacado pela qualidade. Entre as oito marcas de azeite extravirgem aprovadas num teste de qualidade realizado recentemente pela Proteste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor), envolvendo 19 produtos disponíveis no mercado nacional, o Olivas do Sul foi o que obteve a melhor avaliação.

"Quando eu disse que queria produzir azeite, minha família olhava atravessado, pensava que eu estava louco. Quem não era da família tinha certeza", afirma o agricultor José Alberto Aued, que produz o azeite gaúcho.

De acordo com a pesquisadora Juliana Teramoto, do IAC (Instituto Agronômico de Campinas), em décadas passadas, já houve várias tentativas de se produzir azeite no país.

Mas bons resultados só apareceram mais recentemente, em iniciativas como as de Aued e da Epamig (Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais), que tem dado apoio à produção de azeite na região da Serra da Mantiqueira.

Segundo a pesquisadora, o cultivo da oliveira esbarra no uso de variedades não adaptadas ao clima brasileiro, assim como na dificuldade dos produtores em adequar o plantio às condições do país.

"Muitos dos agricultores começam a produzir por causa da história de sua família de imigrantes, que vêm de regiões produtoras, mas acabam deixando as plantas crescerem demais e não podam as árvores corretamente, mantendo poucos espaços entre elas", afirma Juliana Teramoto .

Outro problema, diz ela, é o ritmo lento de desenvolvimento da oliveira, que só começa a produzir azeitonas depois de três anos e atinge a maturidade plena aos 15, o que afastaria produtores que querem resultados imediatos. "A produção de azeite não acontece do dia para a noite", afirma.

As importações brasileiras de azeite somaram, de janeiro a novembro deste ano, o equivalente a cerca de 64 milhões de litros, segundo dados do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

De acordo com Enilton Coutinho, pesquisador da Embrapa Clima Temperado, atualmente as azeitonas são produzidas em 1.800 hectares no Sul do Brasil. Ele estima que, além do Olivas do Sul, a região produza mais 10 mil litros de azeite por ano.

Desde 2011, também se produz azeite comercialmente na porção mineira da Serra da Mantiqueira. A estimativa do pesquisador Luiz Fernando Oliveira, da Epamig, é de que 5.000 litros tenham sido produzidos em 2013 por 70 produtores da região. Todo o produto é vendido localmente.

Azeite da marca brasileira tem sabor suave, diz especialista

"Para uma produção no início, o Olivas do Sul tem obtido bons resultados", afirma Paulo Freitas, engenheiro alimentar especialista em azeite.

Segundo ele, o azeite da marca brasileira tem sabor suave, típico da azeitona arbequina, que é a variedade cultivada em maior volume pelo produtor José Aued.

"O sabor lembra bastante o de frutas verdes, como o tomate ou a maçã verde. Também tem sabores amargos e picantes suaves, o que agrada ao público brasileiro, além de uma nota final amanteigada", afirma Freitas.

De acordo com o especialista, o produto foi classificado como de boa qualidade no guia italiano Flos Olei, que lista alguns dos melhores azeites do mundo. "Para ser mencionado nesse guia, o azeite foi avaliado por um grupo grande de profissionais", afirma.

A marca pode ser encontrada em redes de supermercado no Rio Grande do Sul e na cidade de São Paulo, e em pontos de venda em Salvador, Brasília e Rio de Janeiro. Cada garrafa de 500 ml custa, em média, R$ 21, mas o valor chega a até R$ 39 em alguns estabelecimentos, segundo o produtor.

"Estamos acostumados no Brasil a grandes e boas marcas de referência, como Gallo, Andorinha e Borges, que custam uma média de R$ 15 [a garrafa de 500 ml]. Mas os azeites com perfil melhor, que vêm de pequenos produtores, estão num patamar de valor mais alto, porque os custos são maiores", diz Paulo Freitas.

"Saindo das marcas comerciais mais conhecidas, o azeite é mais caro, e isso não é exclusividade do Brasil", afirma.

Produção comercial do Olivas do Sul começou há dois anos

A primeira produção comercial de azeite de José Alberto Aued ocorreu em 2011, quando, segundo ele, obteve cerca de 16,6 mil litros do produto. Em 2012, teriam sido atingidos 25 mil litros, mas o volume caiu neste ano para 15 mil litros, devido à seca na região, que diminuiu a produção de azeitonas. No ano que vem, ele espera aumentar a produção mais de duas vezes e meia.

A colheita em Cachoeira do Sul acontece geralmente em março. Aued afirma que o processo de produção de azeite deve começar no máximo 12 horas após as azeitonas terem sido retiradas das árvores.

Depois de lavadas, as azeitonas são trituradas com o caroço e transformadas numa pasta, que é mantida numa centrífuga durante 30 minutos.

O equipamento, que gira a 4.200 rpm, faz com que o azeite se separe da água e das partes sólidas. Um cano coleta o azeite, que então segue para o envasamento.

Originária do Mediterrâneo, oliveira precisa de cuidados especiais no Brasil

Como a oliveira é originária do Mediterrâneo, ela precisa de cuidados para se desenvolver também no Brasil. Segundo Juliana Teramoto, do IAC, a planta não necessita de solos muito férteis, mas é preciso escolher regiões onde o volume de chuvas se mantenha entre 600 mm e 800 mm anuais.

Mais do que isso pode gerar azeitonas com uma proporção maior de água e menor de azeite, além de trazer doenças às árvores. Aued conta que propriedades com um relevo levemente ondulado ajudam a escoar a água das chuvas e controlar a umidade.

Também é necessário que a região atinja temperaturas baixas, de 5°C a 7°C, no período do inverno.

Como as plantas se desenvolvem mais rapidamente no clima brasileiro, é fundamental podá-las para se manterem produtivas --com mais galhos e folhas, há menor produção de frutos. Aued poda as copas das árvores no formato de uma taça.