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Reinaldo Polito

Por qué no te callas?

11/11/2010 14h11

Um candidato ganha ou perde eleições não somente por aquilo que diz e pela forma como age durante a campanha. Quando se apresenta diante dos eleitores, especialmente pela televisão, não é avaliado apenas pelo discurso que faz naquele momento, mas, sim, pela reputação que construiu ao longo da vida.

Talvez essa seja a explicação para a derrota de Serra. Por que perdeu a eleição se é hoje o político mais bem preparado para assumir o cargo de presidente? Por que não se elegeu presidente se tem melhor currículo, mais experiência, mais competência oratória que todos seus adversários? Por que não convenceu se sabidamente é um político honesto, sem manchas ao longo da extensa carreira?

Ao fazer inúmeras análises sobre a comunicação dos candidatos desde o início da campanha confesso, foi difícil, muito difícil encontrar um defeito na maneira de falar do Serra. Todos os itens da sua oratória se mostravam irrepreensíveis. Houve momentos em que se aproximou da perfeição.

O fato interessante é que tendo comunicação excepcional e obtendo extraordinários resultados nos debates ainda assim era criticado. Poucos percebiam, entretanto, que censuravam não o que estavam observando naquelas apresentações, mas, sim, a imagem negativa que ele havia construído ao longo das últimas décadas.

Quantos me revelaram que votaram no Serra não porque gostavam dele, mas porque era o adversário do governo que queriam combater. Se tivessem outro candidato para escolher, mesmo que não fosse tão competente, teria o voto deles.

Eu mesmo nunca fui grande admirador do Serra. Entre vários motivos, o principal, sua maneira arrogante e antipática de tratar as pessoas. Já ouvi essa crítica de fontes tão diversas que não há dúvida de que ele seja mesmo assim. Ele se basta. Por isso, não chegou na frente.

Ainda assim não se pode admitir que uma desconhecida participante da Fundação Zapata, do México, que assistia ao seu discurso no encerramento do XI Fórum de Biarritz, no sul da França tenha tido a petulância de dizer da plateia: “Por qué no te callas?”. Por mais que se aplauda o direito de uma pessoa se expressar, a afronta não se justifica.

Como candidato derrotado, mas com quase 50 milhões de votos, e um dos principais nomes da oposição em nosso país, tem o direito, diria mais, o dever de criticar a política econômica do governo e mostrar os caminhos que poderiam ser mais adequados para nós, independentemente de agradar ou não àqueles que o ouviam.

Serra, com todos os senões que enumerei, não é uma pessoa qualquer. Foi governador e prefeito de São Paulo, dos melhores ministros que o Brasil já teve, senador atuante, líder perseguido e exilado. Como ele mesmo diz, tem currículo e não ficha corrida.

Uma coisa é o rei Juan Carlos de Espanha dizer essa frase ao presidente venezuelano Hugo Chaves, que, de forma irresponsável, acusava o ex-primeiro-ministro José Maria Aznar de fascista. Nesse episódio era o rei espanhol com sua importância e autoridade fazendo calar a verborragia inconsequente de alguém que não conhece limites para suas investidas.

Outra é uma desconhecida piratear a frase do rei para atacar alguém que ela, provavelmente, nem saiba quem é. Serra pode não ser a pessoa mais simpática que conhecemos, mas possui estatura, passado, competência e integridade que merecem respeito e consideração.

As eleições terminaram. A presidente eleita não é presidente apenas do nordeste ou de um partido, é sim presidente de todo o país, de todos nós. Quem gosta do Brasil vai torcer para que faça um excelente governo para o bem dos brasileiros. E como vivemos em um país democrático deverá sofrer oposição. Principalmente de pessoas bem preparadas como José Serra. Por isso, nosso pedido é: Serra, no te calles!

SUPERDICAS DA SEMANA

- Você será julgado não apenas pelo que diz no momento do discurso.
- Quando você falar os ouvintes levarão em conta toda sua história de vida.
- O que você diz precisa encontrar respaldo em suas atitudes.
- Se prometer, cumpra. Se não puder cumprir, não prometa.
Livro de minha autoria que ajuda a refletir sobre esse tema: “O que a vida me ensinou”, publicado pela Editora Saraiva.