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Reinaldo Polito

Tchau, Zé

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Imagem: Divulgação

12/10/2011 17h42

O Brasil perdeu um dos maiores comediantes da nossa história. Um gênio do humor. Um imitador excepcional. Um artista que arrastava multidões para os seus shows. Um dos humoristas mais engraçados e inteligentes que tive a felicidade de conhecer. Perdemos Zé Vasconcelos.

Ele nos deixou aos 85 anos, depois de ter encantado durante décadas plateias em todas as cidades importantes do país e do mundo. Zé Vasconcelos foi o inspirador de inúmeros comediantes que hoje são admirados e reverenciados. Foi o primeiro artista que vi atuando no gênero Stand-up comedy.

Meu primeiro encontro com ele foi assim. Toca o telefone. Atendo. Do outro lado da linha está uma pessoa que diz ser José Vasconcelos. Não acredito. Tinha certeza de se tratar de um trote. Ele insiste. Queria assistir a uma de minhas aulas. Ainda cético disse que seria uma honra recebê-lo em nossa escola. Era ele mesmo.

Zé Vasconcelos chegou cedo para o nosso encontro. Para minha surpresa seus cabelos estavam brancos. Totalmente brancos. O rosto um pouco envelhecido. Era uma pessoa diferente daquela que eu via com os cabelos pretos pela televisão e pelas revistas. Sua voz, entretanto, continuava inconfundível.

Assim que me cumprimentou fiquei emocionado. Quase me belisquei para ter certeza de que não estava sonhando. Nunca imaginei que um dia receberia a visita de um dos meus maiores ídolos. Cancelei as aulas da tarde. Nada poderia ser mais importante que conversar com Zé Vasconcelos. 

Fomos almoçar em uma churrascaria na Avenida Faria Lima. Com calma, sem nenhuma pressa perguntei tudo o que sempre desejei saber da sua vida. As histórias que ele contava soavam como música para mim. Ele era naturalmente engraçado. Até quando não tinha intenção de fazer graça.

Saímos do restaurante no finalzinho da tarde. Retornamos a minha escola onde à noite eu ministraria uma aula de apresentação do meu curso. Sempre disposto, Zé Vasconcelos disse que ficaria comigo até o momento de fechar a escola. E foi exatamente o que ele fez. Só se despediu depois que apaguei as luzes e fechei a porta.

Durante a aula ele nos deu um show especial. Pediu para ir à tribuna e usar o microfone. Que espetáculo! Assim que ficou de frente para a plateia ele disse: Sei que se eu viesse à frente e não contasse uma piada seria uma frustração...para mim. O público reagiu com estrondosa gargalhada.

Comediante participa de aula; ouça

  • "Como falar corretamente e sem inibições" - Faixa 5

Veja que sacada genial. O fato de ser um humorista consagrado o autorizava a pensar que os ouvintes gostariam de ouvir uma piada contada por ele, mas daí a revelar esse fato fez com que parecesse prepotente e provocasse certo desconforto nas pessoas. Entretanto, depois de uma pausa medida com perfeição, completou dizendo que a frustração seria dele próprio, apanhou o público no contrapé e transformou a mensagem em um momento de humor incomparável.

Ao reescrever meu livro “Como falar corretamente e sem inibições” pedi sua autorização para incluir no CD de áudio que acompanha a obra as histórias, imitações e piadas que contou naquela aula. Assim que o livro ficou pronto enviei um exemplar a ele. Telefonei para saber se ele havia recebido e se gostara do resultado. Adorou. Foi a última vez que conversamos.

Nos últimos dias tenho ouvido no meu carro com frequência esse CD. Já ouvi suas histórias dezenas de vezes, mas sempre caio na gargalhada quando as ouço, como se fossem inéditas e eu as estivesse ouvindo pela primeira vez. Tenho certeza de que por um bom tempo continuarei ouvindo esse CD. Para mim será difícil acreditar que nunca mais nos encontraremos.

Tchau Zé. Foi um enorme prazer conhecê-lo e ter convivido com você. Enquanto eu estiver por aqui serei sempre um divulgador do seu nome e da sua obra. Se depender de mim as novas gerações irão aprender e se divertirão muito com você. Seu legado artístico jamais desaparecerá.

As histórias, imitações e piadas contadas por Zé Vasconcelos naquela visita memorável que fez a minha escola poderão ser ouvidas no CD de áudio que acompanha 111ª edição do livro “Como falar corretamente e sem inibições”, publicado pela Editora Saraiva.