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Reinaldo Polito

Como Dilma e Aécio devem se comportar no debate

Reinaldo Canato/UOL
Imagem: Reinaldo Canato/UOL

19/10/2014 13h20

Dilma e Aécio têm participado de tantos debates que já não há muita novidade nas acusações, argumentos e refutações tanto de um lado quanto de outro. Provavelmente não haverá surpresa. Os temas não serão muito diferentes dos que já debateram e daqueles que os portais, jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão revelaram nos últimos dias.

Cada candidato, entretanto, a partir de pesquisas qualitativas sabe quais os temas que lhes foram favoráveis e onde está seu calcanhar de Aquiles. Com certeza já se reuniram com seus assessores e marqueteiros para discutir quais as melhores estratégias para atacar o adversário e como agir para se defender. 

Nessa reta de chegada, com os eleitores praticamente divididos metade para cada lado, um erro ou pequeno deslize pode ser fatal para a eleição do candidato. Um argumento equivocado, uma resposta enviesada, um tom agressivo fora do limite aceitável podem fazer com que percam os eleitores, especialmente os indecisos.

Por causa da audição seletiva, os eleitores dificilmente deixam de votar em um candidato que escolheram para votar em outro. Quem já tomou a decisão do voto, em um debate só terá ouvidos para assimilar o que beneficia seu candidato e que seja contra o adversário. Estamos naquele momento em que a emoção fala mais alto que a razão.

Somente um fato muito relevante, tão fora do contexto conhecido poderia provocar essa migração de votos. A luta dos candidatos no momento parece ser principalmente para convencer os eleitores indecisos, ou os que estavam dispostos a votar em branco ou anular o voto. No máximo conquistar aqueles que se decidiram, mas ainda não estão totalmente convencidos.

Assim sendo, como os argumentos, as objeções e as refutações são largamente conhecidos, a atitude do candidato poderá fazer toda a diferença. A maneira de usar a pausa, o jeito de olhar para a câmera, a amplitude do gesto, o tom da voz, a contundência da acusação, a firmeza da defesa poderão levar ou não à vitória nessas eleições.

Dilma precisa corrigir dois problemas sérios: parar de fazer cara de brava ou de enfastiada enquanto espera para perguntar ou responder. Ter paciência para pensar antes e falar depois. No último debate ela incorreu nesse erro de tentar arquitetar o pensamento a partir das palavras que pronunciava.

Não será de uma hora para outra que ela vai conseguir corrigir o defeito de truncar as frases com pausas indevidas. Esse aperfeiçoamento leva tempo e, por isso, deve ser uma preocupação para eventuais futuras campanhas. Agora tem de dar um jeitinho, melhorar um pouco e se virar assim mesmo.

Aécio ainda continua a fugir da câmera com os olhos e não fazer pausas expressivas no final do pensamento. Melhorou um pouco nesse segundo aspecto, mas ainda há muito que aperfeiçoar. Deve evitar os gestos se perceber que as mãos estão trêmulas e cortar o sorriso sarcástico antes de dar a resposta.

O risco do sorriso é muito grande. Qualquer exagero pode passar a ideia de deboche. Nesse caso, se por um lado agrada àqueles que desejam votar nele, por outro pode afastar os eleitores indecisos que efetivamente precisam ser conquistados.

Os dois se valem de um recurso que funciona como armadilha para o oponente. Junto com a pergunta ou acusação principal incluem mais uma ou duas questões secundárias, mas de forte impacto para enfraquecer a argumentação e até a imagem do adversário.

Ao responder a pergunta ou se defender da acusação, o candidato, até por falta de tempo, pode deixar de considerar os temas secundários. Na cabeça do telespectador o candidato não respondeu àquela questão não pelo tempo escasso, mas sim por falta de conhecimento ou por não ter como se defender.

Como o tempo para resposta é curto valeria a pena logo no início tocar rapidamente nesses temas secundários para não dar a ideia de que está fugindo das questões, quase sempre será suficiente negar as acusações. Depois, com mais calma, poderá se dedicar às perguntas ou acusações principais. Se achar que a resposta aos temas secundários não foi suficiente, será possível aproveitar a réplica ou a tréplica para complementar.

Embora quase todo mundo diga que não gosta de agressividade e que gostaria de ver a discussão de temas elevados e propositivos, no fundo a maioria quer mesmo é presenciar uma boa briga. Basta ver o aumento da audiência nesses embates mais contundentes. Muita gente ficou até tarde da noite para ver como os contendores se comportariam nessa espécie de ringue.

Tanto Aécio quanto Dilma são bons de briga. Não fogem do combate. Aí talvez resida o perigo. Se exagerarem no tom do ataque ou das acusações, poderão fazer o papel de algozes e perder a solidariedade dos telespectadores. Por outro lado, se fraquejarem no confronto, poderão passar a ideia de que são culpados ou inseguros.

Essa é a beleza dessa disputa política que está mobilizando a população brasileira como há muito não acontecia. Vejo pessoas discutindo política como nos velhos tempos de Jânio e Adhemar, ou de Getúlio e Carlos Lacerda. Não me lembrava mais de ver pessoas discutindo política e não futebol nas reuniões familiares e nas conversas na mesa de bar.

O poder de comunicação dos atuais candidatos não se compara com o dos políticos do passado, mas está levando os brasileiros de volta à discussão política. Tomara que continuemos assim, pois o nosso país só encontrará o rumo se a população resolver participar, cobrar e fiscalizar seus representantes.

Serviço: o debate entre os candidatos à Presidência foi transmitido pela TV Record no domingo (19)