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Reinaldo Polito

Como a comunicação do governo tenta transformar um tsunami numa marolinha

Os ministros José Eduardo Cardozo, da Justiça (esq), e Edinho Silva (Comunicação) - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Os ministros José Eduardo Cardozo, da Justiça (esq), e Edinho Silva (Comunicação) Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

29/06/2015 13h34

Depois da tormenta provocada pelo vazamento na imprensa de algumas informações da delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, que bateram às portas da presidente, alguém precisava dar a cara pra bater. Foram escalados para o "paredón" no sábado (27) Edinho Silva, ministro de Comunicação Social da Presidência, que atuou como tesoureiro na campanha de Dilma, e o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

A última experiência havia sido catastrófica. Logo após as manifestações de 15 de março, José Eduardo Cardozo esteve ao lado do Secretário-Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto, para falar em nome do Palácio do Planalto. Na tentativa de defender a imagem do governo e minimizar o impacto da assustadora participação popular, meteram os pés pelas mãos e como eco para suas palavras ouviram um sonoro panelaço.

Só para lembrar. Assim que Cardozo e Rossetto compararam as manifestações do dia 15 com o pequeno movimento patrocinado pelo partido do governo dois dias antes, levantaram ainda mais a resistência da população. Mesmo dizendo que as manifestações eram legítimas e próprias da democracia, terminavam fazendo algum tipo de crítica, direta ou velada.

Concordavam de forma superficial com as opiniões adversas para em seguida insinuar que os manifestantes não eram os eleitores de Dilma. Sem esconder a tática, enfatizavam que a participação popular devia ser respeitada, mas que não se podia admitir o golpismo ou terceiro turno. Estratégia amadorística que não convenceu.

Desta vez Cardozo se limitou a fazer a apresentação de Edinho e dar uma ou outra informação complementar, especialmente no final, numa espécie de conversa com os jornalistas. O caldeirão fumegante foi reservado mesmo para Edinho Silva. O ministro, embora estivesse tenso, demonstrou equilíbrio emocional e foi competente na arte de falar.

Não nos importa aqui julgar quem tem ou não razão. O que interessa mesmo nesta coluna é avaliar as técnicas de comunicação utilizadas pelo ministro num momento em que o governo se sente acuado e precisando neutralizar acusações tão contundentes. Não é uma situação confortável. Exige habilidade oratória, rapidez de raciocínio e ação eficiente.

Logo no início da sua apresentação, antes mesmo de responder à primeira pergunta dos jornalistas, Edinho Silva fez um rápido comentário sobre sua trajetória na vida pública, especialmente a respeito da sua participação como tesoureiro na campanha presidencial de Dilma Rousseff.  A intenção foi clara, reforçar sua credibilidade para que as repostas à imprensa encontrassem mais benevolência.

Desde o princípio, Edinho Silva deixou claro qual seria sua estratégia e quais os objetivos que pretendia com seu pronunciamento. Político experiente, Edinho sabe que para demonstrar sinceridade, nas situações em que alguém é atacado injustamente precisa reagir com indignação. Foi o que fez, tanto na elaboração das frases quanto nos aspectos mais estéticos da comunicação, como voz e expressão corporal, especialmente o semblante.

Mesmo sabendo que responsabilidade não se delega, o ministro procurou isentar a presidente Dilma o tempo todo. Sempre que um repórter perguntava sobre a posição da presidente sobre as informações prestadas na delação de Ricardo Pessoa, Edinho mudava o foco e assumia a responsabilidade como sendo sua.

Dizia que Dilma havia dado a ele carta branca para que pudesse se defender: "A presidenta me concedeu total autonomia para que eu defenda a minha honra, para que eu tome todas as medidas necessárias em defesa da minha honra".

E quando perguntaram se a presidente pretendia explicar os R$ 7,5 milhões da campanha, a estratégia da mudança de foco se repetia: "Quem arrecadou para a campanha presidencial fui eu. Portanto, quem responde pelas doações da campanha da presidenta Dilma sou eu".

Outro ponto importante em seu pronunciamento foi o esforço para desqualificar as informações vazadas pela imprensa. Primeiro falou de como estranhou a forma seletiva como as informações foram divulgadas, tendo em vista que outras campanhas também receberam doações do delator.

Em seguida, e depois praticamente o tempo todo insistiu que as doações são públicas e foram legais. E que outros partidos e campanhas se beneficiaram do mesmo tipo de doação. Para que todo o processo de doação parecesse sempre respaldado na legalidade, disse que estão todas disponíveis no site do TSE.

Dentro do objetivo de se mostrar sempre indignado com a injustiça cometida contra ele (nunca contra a presidente), estava contratando advogado, e que além de requisitar cópia do depoimento de Ricardo Pessoa, fazia questão de ser ouvido pessoalmente no processo para dar todas as explicações.

Seu grande argumento, entretanto, foi o de contra-atacar procurando deixar uma porta aberta para não mirar apenas um alvo fixo. Afirmou que caso se confirmassem as mentiras divulgadas pela imprensa, tomaria todas as providências judiciais em defesa de sua honra.

Com essa iniciativa, faria que cessassem os benefícios de uma delação premiada que não expressa a verdade dos fatos. Ou seja, antes apuraria se as informações vazadas foram mesmo fornecidas pelo delator. Se não tivessem sido, lógico, a imprensa mentira. Se a imprensa divulgou dados fornecidos da maneira dita pelo delator, aí agiria contra ele. Uma boa porta aberta para evitar confronto direto.

Embora a situação atual talvez seja ainda mais grave que as experimentadas nas manifestações de 15 de março, o desempenho dos ministros do governo foi de longe muito melhor. Tanto que a maioria dos comentários dos jornalistas após o pronunciamento dos ministros se pautou não na veracidade da delação, mas sim na maneira como o governo reagiu diante do episódio.

Ou seja, pelo menos num primeiro momento, Edinho Silva conseguiu fazer com que a presidente Dilma chegasse aos Estados Unidos sem maiores sobressaltos. Pôs toda sua capacidade de comunicação para tentar transformar o grande tsunami numa simples marolinha. Os próximos dias dirão se conseguiu seu intento. Que a verdade prevaleça.

SUPERDICAS DA SEMANA

- Se for acusado sem provas, simplesmente negue sua participação nos fatos
- Se sua honra for atacada, não aceite calado. Mostre sua indignação
- Procure se defender transformando sua resposta em um ataque
- Se a verdade estiver do seu lado, será questão de tempo para que ela prevaleça 

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse assunto: "Superdicas para falar bem", "Assim é que se fala", “Conquistar e influenciar para se dar bem com as pessoas”, "Como falar corretamente e sem inibições" e “As melhores decisões não seguem a maioria”, publicados pela Editora Saraiva.

Veja a defesa de Dilma feita pelos ministros