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Reinaldo Polito

Com protestos, qual a melhor tática oratória do governo: falar ou calar?

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Imagem: AP

18/08/2015 06h00

O Brasil acaba de participar, nesse 16 de agosto, de mais uma manifestação contra o governo e contra a corrupção quase generalizada que se espalhou pelo país. O povo foi às ruas empunhando bandeiras, faixas e proferindo gritos de ordem para expressar sua indignação.

Pelo menos em três situações neste ano o governo se sentiu muito pressionado. A primeira, com as manifestações ocorridas em março. A segunda em junho, com as delações feitas pelo empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC. E a terceira, com as manifestações desse domingo, em meio a um agravamento da crise econômica e política que vive o Brasil.

Como o governo reagiu

Em cada uma das situações, o governo reagiu de maneira distinta. Na primeira, em março, o resultado foi negativo. O secretário-geral da Presidência da República, Miguel Rossetto, acompanhado do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, atacou a atitude dos manifestantes e ouviu como eco para o seu pronunciamento um panelaço sem precedentes.

Na segunda, após a delação de Ricardo Pessoa, em junho, o governo foi mais cauteloso e não bateu de frente com a população. Edinho Silva, Ministro de Comunicação Social da Presidência, também ao lado do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, fez a defesa de maneira equilibrada e parece ter obtido melhor resultado que Rossetto.

Na terceira, diante das manifestações desse domingo, o governo preferiu se calar no dia do evento. Apenas Edinho Silva divulgou uma nota dizendo que “As manifestações deste domingo foram vistas dentro da normalidade democrática”. O governo não usou os meios de comunicação para fazer um pronunciamento geral no dia em que ocorreram as manifestações.

Já na segunda-feira, Edinho Silva fez um pronunciamento. Disse mais ou menos o que havia transmitido em sua nota no domingo: que as manifestações ocorreram dentro da normalidade democrática. Provavelmente como percebeu que não houve reação negativa a esse tipo de mensagem, resolveu dar ênfase a ela.

Também usou um tom otimista que não foi de encontro ao pensamento dos manifestantes. Disse que “é um momento difícil da vida brasileira, que temos de trabalhar para que a gente possa desfazer esse ambiente de intolerância, porque o Brasil sempre foi, historicamente, um país com diversidade religiosa, cultural, regional e política”.

Palavras que na verdade se juntam ao silêncio adotado na estratégia no domingo.

Qual a melhor estratégia oratória

Afinal, como aquele que está sendo atacado deve se comportar em situações de crise como essas? Há correntes que defendem as iniciativas mais distintas.  Vamos analisar algumas delas para que possamos tirar nossas próprias conclusões. Também devemos levar em conta as circunstâncias que cercam o contexto da situação enfrentada.

Alguns defendem o procedimento adotado pelo ministro Miguel Rossetto em seu pronunciamento. Pregam que a melhor atitude é atacar cada um dos argumentos contrários. Alegam que só neutralizando cada ponto defendido pelo oponente será possível fortalecer a causa que defendem.

Outros adotam o comportamento escolhido por Edinho Silva. Dizem que, ao concordar de maneira geral com alguns dos argumentos mais relevantes do adversário, será possível demonstrar que existem pontos comuns de pensamento e estabelecer certa identidade com a parte contrária. Ao supor que a maneira de pensar é semelhante, talvez baixem a guarda.

Há ainda aqueles que sugerem o silêncio como tática de defesa.  O próprio Vieira, no “Sermão do Demônio Mudo”, pregado em 1651 no Convento das Odivelas, religiosas do Patriarca S. Bernardo, diz que, em certas circunstâncias, é mais perigoso o silêncio do que a palavras. Vejamos algumas de suas ponderações sobre esse recurso.

“Vigiai, e estai alerta, diz o apóstolo S. Pedro, porque o demônio, vosso inimigo, como leão bramindo, cerca e anda buscando a quem tragar. Necessária e temerosa advertência é esta; mas muito mais necessária e muito mais temerosa a de que hoje nos avisa o Evangelho. Por quê? Porque o demônio, de que nos manda acautelar S. Pedro, é demônio com bramidos”.

E faz Vieira o contraponto. “E o demônio de que fala o Evangelho, é demônio mudo. Se o demônio vem bramindo, os mesmos bramidos dão rebate do perigo, e ninguém haverá tão descuidado, ainda que esteja dormindo, que não esperte assombrado, e se acautele; porém, se o demônio vem mudo, debaixo do mesmo silêncio, em que se esconde o perigo, descansa, e adormece o cuidado”.

Para reforçar sua tese, Vieira enfatiza. “O demônio é sempre inimigo; mas quando vem bramindo, vem como inimigo declarado; quando vem mudo, vem como inimigo oculto; e muito mais para temer é o inimigo oculto, e dissimulado, que descoberto”.

E para que não paire dúvidas, completa. “Quando o exército contrário com as bandeiras estendidas ao som de caixas e trombetas se vem avançando aos muros, não são necessárias vigias; mas quando de noite vem marchando à surda com todos os instrumentos bélicos em silêncio, então é necessário que as sentinelas estejam com os olhos muito abertos”.

Os fatos e as iniciativas estão aí para refletirmos. Valeu mais o bramido do governo na primeira manifestação? A fala ponderada na defesa contra as delações? O silêncio adotado nas manifestações do domingo? Ou nenhuma das três iniciativas conseguiria fazer a defesa do governo?

SUPERDICAS DA SEMANA

- Avalie qual a melhor estratégia de defesa, de acordo com a circunstância
- Por pior que seja a crise, sempre poderá haver saída
- Há situações em que o silêncio pode mais do que as palavras
- Situações diferentes exigem atitudes distintas

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse assunto: "Assim é que se fala", "Como falar corretamente e sem inibições”, "Oratória para advogados e estudantes de direito", “Superdicas para falar bem”, “Conquistar e influenciar para se dar bem com as pessoas” e "As melhores decisões não seguem a maioria", publicados pela Editora Saraiva.

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