IPCA
0,83 Mar.2024
Topo

João Branco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Por que a série 'Round 6' faz tanto sucesso?

Colunista do UOL

14/10/2021 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Alguns filmes, produtos, promoções e propagandas parecem ter um poder de atração que vai além do que conseguimos entender. A moda agora é chamar isso de "gatilho", mas a psicologia do consumo tenta explicar isso há décadas. De teorias rasas que defendem a utilização de cachorrinhos em anúncios até as mais complexas que envolvem os nossos instintos mais primitivos, todos querem saber como essa mágica acontece.

Você consegue entender por que a série Round 6, do Netflix, está fazendo tanto sucesso? Eu confesso: ainda não tinha assistido a nada em coreano até hoje. Mas quando vi que ela estava em primeiro lugar nos conteúdos mais assistidos do Brasil, me dei a chance de experimentar. A primeira lição aqui é que o gosto das outras pessoas influencia fortemente os nossos gostos. Os serviços de busca, os streamings e as redes sociais sabem muito bem que, no fundo, nós não decidimos nada sozinhos. Estamos sempre buscando confirmações sobre a popularidade das coisas antes de nos entregarmos. E assim, as coisas mais consumidas se tornam ainda mais consumidas.

Mas como eles conseguiram atingir uma posição de preferência tão rapidamente? E como foi que fizeram isso no mundo todo?

Queridos leitores, a aula de marketing de hoje faz referência ao mês das crianças e usa o momento para revelar um segredo implícito em muitas comunicações de sucesso: a arte de conectar com a sua criança interior.

Ao usar diversos elementos que remetem à nossa infância, "Round 6" ativa uma parte muito especial das nossas memórias. O uniforme escolar, as brincadeiras, as cores, até as formas simples. As musiquinhas e as competições. Tudo faz referência a coisas que nos são familiares e despertam emoções. Ao mesmo tempo, elas são apresentadas em um contexto novo, surpreendente e curioso. Ouso dizer que a trama da misteriosa disputa traz uma combinação que prende a atenção tanto do adulto atual como da criança que vive dentro de nós.

O fato de a série ter demorado 12 anos para sair do papel indica que nada disso é coincidência. Houve muito planejamento. E o que está por trás disso são as mesmas intenções que estão por trás de comunicações da Disney, McDonald's ou Coca-Cola. Uma das formas mais profundas de se conectar emocionalmente com um adulto é tocando no seu arquivo de sentimentos infantis.

Se você já assistiu à animação "Divertidamente", da Pixar, deve ter a mesma dúvida do que eu: afinal, esse desenho foi feito para crianças, adultos ou para as crianças que estão dentro dos adultos? E a festa do pijama do McDonald's no Big Brother? Ou a propaganda de Natal da Coca-Cola?

Já estamos crescidos, mas todos carregamos dentro de nós uma miniatura de poucos anos de idade que se diverte, é curiosa, quer atenção, segurança e liberdade. Alguém que, com o tempo, foi descobrindo que tem responsabilidades, rotinas, deveres, desafios e que a vida não é tão inocente quanto parecia. Mas alguém que tem saudade da explosão de cores, dos momentos leves, das primeiras descobertas e dos sorrisos simples. Crianças não precisam de muito para se encantarem. Nós também não. Desde que as nossas crianças interiores sejam alcançadas.

"Round 6" também nos ensina que usar esse artifício não significa infantilizar a sua comunicação. Convenhamos que essa série não é apropriada para menores. Mas se foi possível usar gangorras, bonecas, cantigas e biscoitos até para vender uma história sobre assassinatos, endividamento e poder, imagine o que não seria possível fazer com o seu produto?

criança interior - Felipe Tomazelli - Felipe Tomazelli
Imagem: Felipe Tomazelli

PUBLICIDADE
Errata: este conteúdo foi atualizado
Uma versão anterior deste texto informava incorretamente que Round 6 demorou 10 anos para ser gravada. Na verdade, o projeto ficou anos engavetado e demorou 12 anos para sair do papel. A informação foi corrigida.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL