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Quando comprar uma franquia barata ou novata vira um pesadelo

Natalia Gómez

Colaboração para o UOL, em Maringá (PR)

27/04/2018 04h00

Uma franquia barata pode parecer uma tábua de salvação para quem perdeu o emprego e não tem dinheiro ou conhecimento para abrir um negócio independente. Não é à toa que o número de opções de franquias baratas disponíveis no mercado cresce a cada ano.

No entanto, é preciso saber escolher com cautela, pois existem negócios que viram franquias antes de estarem preparados para isso. Nesses casos, o que parece ser a solução para os problemas pode virar uma grande dor de cabeça para o franqueado, e muitos são aqueles que se arrependem do negócio logo depois de assinar o contrato.

Um exemplo é a rede de franquias de produtos de limpeza Ecoville, de Joinville (SC), que vive atualmente um desentendimento judicial com um grupo de franqueados. Eles alegam prejuízo por causa da qualidade dos produtos e discrepância entre os investimentos reais e os previstos. A empresa nega irregularidades e diz que as dificuldades são comuns a qualquer negócio (leia mais sobre problemas na franquia clicando aqui).

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Falta de estrutura de apoio por parte do franqueador, contratos que não refletem a realidade e marcas frágeis são apenas alguns dos problemas destacados por especialistas em franquias consultados pelo UOL.

Esse tipo de franquia acaba fechando, enquanto grande parte de seus franqueados terminam sem condições de recorrer à Justiça porque já investiram toda a poupança da família no novo negócio e não podem pagar os custos de um processo.

Pagar para ser um vendedor não é bom negócio

Um risco comum que se corre ao comprar franquias baratas é o franqueado se tornar, na prática, um vendedor dos produtos da franqueadora, e ainda pagar taxas elevadas para isso.

Segundo o consultor do Sebrae associado à ABF  Erlon  Labatut, da consultoria Franqueador.com, de Curitiba, é muito comum ver franquias que enxergam os franqueados como vendedores, mas ele avalia que pagar para ser vendedor não é um bom negócio.

“Nesses casos seria mais interessante a pessoa fazer um curso e trabalhar de forma independente do que comprar a franquia”, afirma Labatut.

Muitas vendem licença só para pegar a taxa de franquia

A desilusão acontece principalmente quando o franqueado compra uma franquia que tem pouca ou nenhuma experiência de atuação no mercado, e por isso não tem o conhecimento nem o marketing que justificariam o valor pago pela franquia.

“Quando o empreendedor compra uma franquia assim, o arrependimento vem bem rápido, em menos de dois meses”, conta Labatut, que atende o público no Sebrae uma vez por mês.

Embora existam inúmeros casos de negócios sérios e bem-sucedidos, os especialistas destacam que as franquias não lucrativas têm como estratégia lucrar com a venda da marca sem oferecer a contrapartida necessária.

“Elas fazem uma venda rápida de muitas unidades para tomar a taxa e depois veem o que acontece”, afirma o consultor e proprietário da Rizzo Franchise, Marcus Rizzo.

Em 3 anos, dispara número de microfranquias

Nos últimos anos, houve uma enxurrada de novas franquias no mercado, e as microfranquias ganharam espaço. Entre 2013 e 2016, segundo os dados mais recentes da Associação Brasileira de Franchising (ABF), a quantidade de microfranquias aumentou 45% no país, passando de 384 para 557 redes que operam nesse modelo.

A entidade considera que se enquadram nesta categoria as franquias com investimento inicial total de até R$ 90 mil, mas na média o investimento é de R$ 45 mil, considerando as empresas associadas à ABF.

No entanto, nem todas as empresas que partiram para a venda de franquias têm a estrutura necessária. “Existem empresas que não têm nem seis meses de operação e estão vendendo franquia. Como podem multiplicar um negócio se ainda não foi comprovado o seu sucesso?”, questiona o advogado especializado em franquias Flávio Menezes, do escritório Menezes e Advogados, de São Paulo.

Ele diz que a lei brasileira não determina um tempo de atuação mínimo para uma empresa virar franquia, o que leva à venda de franquias sem o conhecimento de negócio, com operações mais enxutas e equipes menores do que seria necessário.

Informações falsas nos relatórios de negócio

Outro problema citado pelos especialistas é que o contrato mais importante no sistema de franquia, chamado de Circular de Oferta de Franquia (COF), nem sempre traduz a realidade do negócio.

“É possível encontrar mentiras grotescas na COF. Projeções, número de unidades, omissão de unidades, informar nomes e endereços que não existem”, declara o proprietário da Rizzo Franchise.

Segundo ele, a única forma de se certificar das informações é verificar os dados, entrando em contato com franqueados e ex-franqueados da rede. “Uma franquia é como um casamento, e existe um lado emocional. Muitas vezes as pessoas estão propensas a serem enganadas”, afirma Rizzo.

Para ele, o ideal é fazer análises comparativas com outras franquias do mesmo setor e nunca fechar o negócio por impulso.

Investigue os dados antes de comprar a franquia

Segundo Menezes, o principal instrumento de proteção do investidor na lei de franquias diz respeito à obrigatoriedade da COF, que contém as informações pré-venda da franquia.

No entanto, ele afirma que em parte das empresas essas informações são “discutíveis” e não têm a mesma credibilidade vista em outros mercados, como o norte-americano, onde o modelo de franquias é bem desenvolvido.

Outro problema é que a lei não determina como deve ser a relação entre franqueado e franqueador nem qual tipo de suporte deve ser oferecido.

“Se o franqueador cumprir o que falar na COF, ele pode fazer o que quiser”, diz. “Essa forma de vender franquias no Brasil eu equiparo à captação de poupança popular. Quem deve poder fazer isso são as instituições financeiras, fiscalizadas pelo Banco Central”, compara.

Para reduzir essa assimetria entre franqueadores e franqueados, os especialistas são unânimes ao defender uma avaliação detalhada da COF, com direito a verificar as informações com os outros franqueados e ex-franqueados da empresa.

Segundo Rizzo, a falta de cuidado das pessoas na hora de comprar a franquia é generalizada e a recomendação é uma só: investigar antes de investir.

Como se proteger

Para evitar arrependimentos, a ABF orienta que os aspirantes a franqueados analisem a COF com cautela e verifiquem as promessas da franqueadora com outros franqueados. “Tem que checar e telefonar para a lista dos franqueados que já saíram da rede”, afirma Adriana Auriemo, diretora de microfranquias da ABF.

Ela orienta também a verificar o tempo de existência da franquia e a averiguar se a marca é associada à ABF. Existem 3.000 marcas de franquias no Brasil atualmente, sendo que mil são associadas da entidade. Outro filtro que pode ser usado pelos empreendedores é o selo de excelência da ABF, que chancela cerca de 200 empresas por ano.

Boas opções não faltam, garante a ABF. “As microfranquias são algo positivo se a pessoa souber escolher bem”, declara Adriana.

Cabe ao investidor manter a cabeça fria na hora de escolher e não ter receio ao investigar as informações dadas pelo franqueador na hora da venda. Dessa forma, a franquia pode ser um negócio de longo prazo, e não apenas uma grande frustração.

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