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Largou faculdade e fatura R$ 26 mil por frete como caminhoneira nos EUA

Claudia Varella

Colaboração para o UOL, em São Paulo

19/01/2018 04h00

Já pensou em pegar um carro e sair dirigindo por estradas brasileiras? E se o veículo fosse um caminhão ou uma carreta? E se tudo isso acontecesse nos Estados Unidos, e a trabalho? A mineira Patrícia Romeiro, 41, deixou a faculdade no Brasil e foi morar nos EUA, onde vive há 22 anos, 16 deles como caminhoneira. 

Patrícia foi parar na estrada por influência do irmão. Hoje, é dona do próprio negócio (a transportadora P & P Trucking Inc.), faz fretes na costa leste do país e chega a faturar até US$ 8.000 (R$ 25,7 mil) por viagem. Ainda assim, diz que tem medo de passar em pontes, por causa da grandiosidade das obras. "Mas passo em várias todos os dias, com medo mesmo."

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"Já ouviu falar na Chesapeake Bay Bridge-Tunnel? Passa debaixo do mar. Lá dá medo passar à noite", relata. A ponte fica no Estado de Virgínia e tem 37 quilômetros de extensão, incluindo dois túneis sob o mar, de 1.600 metros cada.

Ela diz já ter conhecido 41 Estados norte-americanos. Seu hobby na estrada é fotografar os lugares por onde passa. Atualmente, trabalha entre Massachusetts e os Estados da Flórida e do Texas. Percorre 715 milhas (1.150 quilômetros) por dia, em média. Ela faz o transporte de carga fria: leva peixe congelado, e volta com frutas e verduras.

Ter empresa é trabalhar para si próprio. Não tem coisa melhor para dirigir aqui. Não vejo problema por ser mulher na estrada. Tem que amar o que faz.

Patrícia Romeiro, caminhoneira nos EUA

Fez faxina e lavou pratos

Em 1996, aos 19 anos, Patrícia largou a faculdade de ciências contábeis, saiu de sua terra natal, Engenheiro Caldas (MG), e foi para a cidade de New London (Estado de Connecticut), nos EUA.

"Assim que cheguei fui fazer limpeza no supermercado Stop & Shop à noite com meu irmão Eduardo, que era gerente de limpeza. Depois de um ano, fomos trabalhar no restaurante Charley’s Eating & Drinking Saloon. Ele cozinhava e eu lavava pratos."

Eduardo, 48, saiu da empresa para trabalhar como caminhoneiro. Patrícia continuou a lavar pratos e aprendeu a cozinhar. No final de 2000, mudou-se para a cidade de Framingham (Estado de Massachusetts) e foi subchefe de cozinha por um ano. 

Patrícia tirou sua carteira de motorista em 2002, com habilitação para dirigir caminhões e carretas, entre outros veículos. Foi contratada por uma empresa local como motorista. "Dirigia uma carreta-caçamba, puxando areia", diz ela. Ficou até 2006.

Por influência do irmão, Eduardo, foi para a estrada trabalhar com fretes para a Califórnia --de Massachusetts até a Califórnia são 3.300 milhas (5.310 quilômetros).

Ele me colocou no seu caminhão e disse assim: 'Vamos ver se você dá conta'. E é claro que eu dei. Fui aos trancos e barrancos, mas fui.

Patrícia Romeiro

Um ano depois, comprou seu primeiro caminhão: um Freightliner 2007. Hoje, tem um Freightliner Classic 2004, equipado com duas camas, geladeira e micro-ondas. 

Patrícia entrou nos EUA com visto de turista, ficou ilegal por um tempo, até se casar com um norte-americano e obter o Green Card (visto de residência permanente nos EUA). Ficou casada por nove anos. Hoje, é cidadã americana e tem um filho de 17 anos.

Jornada estressante

De acordo com os dados mais recentes da American Trucking Association (ATA), há 7,4 milhões empregos relacionados ao transporte rodoviário nos EUA, excluindo os trabalhadores por conta própria. Cerca de 3,5 milhões de pessoas são motoristas de caminhão, mas não há informação sobre o número de mulheres dirigindo.

Para começar o próprio negócio, Patrícia investiu US$ 40 mil (cerca de R$ 128 mil), entre compra da carreta, seguro, registros, documentação e taxas.

O preço de um frete nos EUA, segundo Patrícia, varia muito e depende do trajeto, da época do ano e da carga a ser transportada, por exemplo. Por uma viagem de ida e volta de Massachusetts até o Texas, por exemplo, ela fatura US$ 8.000 (R$ 25,7 mil), em média, sem descontar as despesas e o combustível. Ela não revela quantos fretes faz por mês, nem o faturamento e o lucro médio.

Ela diz, no entanto, a jornada de um caminhoneiro nos EUA é bem estressante, por causa da "regra das 14 horas": um caminhoneiro pode dirigir por até 11 horas e ficar três horas parado (para abastecer ou pequenas paradas), totalizando 14 horas. Depois, precisa fazer uma pausa obrigatória de dez horas.

"Se você fica preso no trânsito dos grandes centros urbanos ou descarregando por muito tempo numa empresa, por exemplo, suas horas estão indo embora. Se atingir o limite permitido, você tem que ficar parado onde está. Ficamos o tempo todo vigiando o relógio", relata. Desde dezembro de 2017, o controle das horas trabalhadas tem sido maior.

Patrícia diz que não tem medo de ser substituída pelos caminhões autônomos, que não têm motorista. "O que adianta um caminhão ir sozinho, se precisa do motorista para abastecer, para passar em balanças? Enfim, acho impossível."

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