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Casal deve indenizar menina de 12 anos levada de MG para PE para ser babá

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

27/06/2019 13h00Atualizada em 28/06/2019 08h08

A Justiça do Trabalho de Minas Gerais reconheceu vínculo empregatício e condenou um casal a indenizar uma menina que, aos 12 anos, foi levada da casa dos pais em Araçuaí, no norte de Minas Gerais, para morar com os réus em Salgueiro (PE), a 1.200 km de distância. Durante quase quatro anos, a menina foi babá das duas filhas do casal --na época com 1 e 7 anos. Ainda cabe recurso da decisão.

Na época, a menina, de nome protegido pela Justiça, estudava pela manhã em uma escola pública e, durante a tarde, cuidava das filhas do casal. Esta rotina durou de janeiro de 2011 a dezembro de 2014.

No depoimento, a menina afirmou que a explicação inicial foi de que participaria de uma viagem de férias, mas depois entendeu que o objetivo era que ela cuidasse das filhas do casal.

O UOL procurou pelo advogado do casal, mas não conseguiu contato. No processo, o casal negou que houvesse prestação de serviços e afirmou que a menina era tratada como filha.

Segundo eles, a menina foi para Salgueiro (PE) brincar com suas filhas e acabou passando mais tempo porque eles tinham uma condição de vida melhor do que os pais da adolescente. O casal lhes dava moradia e comida "já que [a adolescente] era muito pobre e tinha vários irmãos vivendo em estado de extrema miséria", justificou a defesa.

Juiz definiu indenização de R$ 10 mil

O juiz Antônio Carlos Rodrigues Filho, da 8ª Turma do TRT-MG (Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais) não acreditou na versão da amizade e usou a distância entre as duas cidades como principal argumento. "Nenhuma pessoa estranha, com 12/13 anos, deslocaria-se 1.197 km para somente brincar com crianças de 7 anos de idade", afirmou Rodrigues Filho, na decisão. "Até mesmo parentes teriam dificuldades em aceitar tal proposta."

Ele considerou que houve um vínculo empregatício evidente entre o casal e a menina e considerou a conduta "um gravíssimo ato ilícito". Na decisão, estabeleceu uma indenização de R$ 10 mil por danos morais como forma de reparação, além do pagamento de verbas correlatas pelo período de serviços prestados, com base no salário mínimo, e parcelas relativas à rescisão indireta do contrato.

"Observa-se que, coincidentemente, nenhuma das testemunhas consegue lembrar do nome da pessoa que dizem ter trabalho naquela residência, como doméstica, enquanto a autora [a adolescente] e as testemunhas lá residiam", argumentou o magistrado.

Os réus também declararam que a adolescente era tratada como filha. Para o juiz, este argumento também não era válido porque a menina estudava em escola pública e as filhas, em colégio particular.

"Não está em questão a forma com que os reclamados alegam que a reclamante [a adolescente] era tratada (com amor e cordialidade). Estão presentes os requisitos caracterizadores do dano moral diante da gravidade de sujeitar-se uma menina de 12 anos a sair de sua casa e morar com desconhecidos, com o intuito de servir de babá de seus filhos, comprometendo e prejudicando a sua formação e valores", decretou.

Proibido, trabalho infantil doméstico é comum

O trabalho infantil doméstico consta da lista das Piores Formas de Trabalho Infantil, de acordo com o Decreto 6.481/2008. No entanto, segundo Rodrigues Filho, a prática infelizmente é bastante comum no Brasil.

"O trabalho infantil doméstico é fortemente enraizado nas práticas sociais brasileiras e se confunde com solidariedade e relacionamento familiar em lares", declarou o magistrado.

"A falta de escolaridade das mães colabora para a existência de trabalho infantil porquanto uma mãe prefere entregar sua filha para trabalhar em casa de terceiros a vê-la passar por necessidades", concluiu Rodrigues Filho. "Infelizmente, é a dura realidade."

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