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Entre Lula e Bolsonaro, mercado prefere 3ª via, diz sócio da Empiricus

Felipe Miranda, da Empiricus - Divulgação
Felipe Miranda, da Empiricus Imagem: Divulgação

Camila Mendonça

Do UOL, em São Paulo

19/06/2021 04h00

A casa de análises Empiricus voltou aos holofotes nas últimas semanas, com a notícia de que o BTG havia comprado o Grupo Universa, dono da empresa. Para Felipe Miranda, estrategista-chefe e um dos fundadores da Empiricus, o negócio fortalece a estratégia da casa.

Conhecida por seu marketing agressivo, a Empiricus foi uma das primeiras casas de análise independentes do país e, ao longo dos anos, foi recebida com muita desconfiança por boa parte dos investidores.

Foi em 2014, quando Miranda escreveu a carta "O fim do Brasil", que a empresa ganhou notoriedade. O PT, partido da então presidente Dilma Rousseff, entrou na Justiça, alegando "terrorismo econômico".

Nesta entrevista exclusiva ao UOL, ele fala sobre próximos passos do negócio, dá dicas para quem está começando, e diz que entre Lula e Bolsonaro, o mercado agora escolheria uma terceira via. Confira abaixo.

UOL - O que muda no negócio com a entrada do BTG?

Felipe Miranda - Tem uma coisa já definida que é a total independência editorial de precificação de produtos na Empiricus e na Vitreo. Agora, se a gente quiser dinheiro emprestado para campanha, ter mais tecnologia, melhorar experiência do usuário, baixar os preços —tudo isso agora temos capital para fazer.

Podemos explorar milhares de coisas conjuntamente, como dar conteúdo para os clientes do BTG+, dar assinaturas, colocar produtos da Vitreo lá, dar uma linha de receita para os autônomos do BTG.

A Bolsa está em um dos seus melhores momentos, enquanto o Brasil tem desemprego alto, inflação crescente, os mais pobres dependendo do auxílio emergencial. Por que o mercado está descolado da economia real?

Não acho que o mercado se descole da economia real. O mercado, na verdade, antecipa os movimentos da economia real. As ações convergem para o lucro das empresas.

O Brasil estava muito defasado em relação ao resto do mundo. As Bolsas passaram por um rali [evolução] gigantesco, de 2009 a 2020, que basicamente a gente não pegou ou pegou muito menos.

Agora, você tem dois elementos. Há muito dinheiro no mundo, com juros ainda baixos —embora estejam subindo em alguns países.

Há um mercado antecipando o crescimento da economia. Apesar de tudo isso que você falou, o crescimento da economia, tanto lá fora como aqui, é forte.

Se você voltar em janeiro de 2020, a Bolsa estava em 120 mil pontos e alguma coisa. Se você joga a inflação nessa história, ela não andou nada, está no mesmo nível de 2020, está há um ano e meio parada. Parece que no primeiro momento ela está descolada, mas não está.

Então a Bolsa pode subir mais e entregar um resultado real?

No meu primeiro texto de 2021, eu achava que o Ibovespa ia superar 150 mil pontos ainda neste ano, e acho que vai mesmo. Temos Petrobras e Vale ainda muito baratas, e que pesam para caramba no índice.

Vale está superbarata; bancos que pesam no índice estão andando com a taxa de juros; shoppings tiveram o melhor Dia dos Namorados de muito tempo; fluxo de rodovias, varejo de moda e lançamentos imobiliários bombando.

As coisas estão acontecendo. Aos trancos e barrancos, deve sair [privatização da] Eletrobras. Não é como gostaríamos e o ideal, mas o ideal está no mundo das ideias. Reforma administrativa tem chances de andar. O cenário é muito positivo.

O que poderia fazer o mercado recuar?

É muito difícil, porque normalmente os maiores riscos são sempre os escondidos. A casca de banana que você está vendo ali, provavelmente você não vai escorregar nela.

Os maiores riscos são os não mapeáveis, aqueles que você nem sabe que não sabe. Dos riscos mapeáveis, para mim, há dois no horizonte.

Há o processo ligado ao banco central americano [o Fed] de subir a taxa de juros dos EUA ou fazer esse afundamento da compra de ativos de forma mais rápida do que se esperava.

Tem uma eventual mutação do vírus que venha a não estar contemplada nas vacinas, e isso é um grande risco também. Até agora, as vacinas têm sido efetivas contra as variantes do vírus, mas tem de ficar monitorando.

Tem um risco menor, que é o recrudescimento das relações entre Taiwan e China, que poderia impactar commodities e afetar o Brasil, mas é um risco menor.

Aqui dentro são os riscos de sempre: um governo que não tem convicção nenhuma. De repente acorda e diz que o Bolsa Família não será mais de R$ 250, mas de R$ 300.

É um impacto pequeno, mas você vai somando e, de repente, o teto de gastos foi embora. Então, esse abandono, essa deterioração do rigor fiscal brasileiro é sempre um risco também.

O eventual esgarçamento das relações com o Congresso que inviabilize reformas também é outro risco.

Um processo inflacionário leve o Copom a subir os juros a 7%, 8% tiraria um pouco da atratividade da Bolsa e do crescimento econômico. E claro esse processo eleitoral, que é sempre um risco de radicalismo de parte a parte.

A Selic subiu a 4,25% ao ano e, mais uma vez, o BC sinalizou mais aumentos nas próximas reuniões. O que muda para o pequeno investidor?

No mercado, esse aumento para 6,5%, 7% ao ano já está precificado, e ninguém vai se assustar. É muito mais importante um Banco Central comprometido com o sistema de metas de inflação.

Seria pior se ele não subisse [os juros], porque seria uma perda de credibilidade. Esse é o equilíbrio macro que interessa ao mercado. Então, está tranquilo, não tem mais surpresa.

Para o pequeno investidor, é uma decisão dele. Talvez o investidor olhe para 7% ao ano, sem fazer nada, e trava um prefixado [investe em renda fixa], mas não me parece ser o caso.

Juros de 7% ao ano para um cara que estava acostumado a 1% ao mês, vendo a Bolsa superar recorde histórico? Alguma migração para a renda fixa talvez você tenha, mas no agregado, essa migração continua em uma intensidade menor.

Para quem está começando a investir agora, o que não pode faltar na carteira?

Diversificação. Não ache que tem uma coisa que vai salvar. Não vai. Uma coisa pode te levar à ruína, mas não vai te levar ao sucesso.

Então, portfólio diversificado, bem montado, com um pouco de Bolsa, um pouco de juros, um pouco de moeda forte, e muita paciência.

Em um cenário eleitoral Luiz Inácio Lula da Silva (PT) x Jair Bolsonaro (sem partido) em 2022, com quem o mercado fica?

Precisaria esperar, na verdade. Talvez o mercado se torne quase indiferente, porque o mercado é apolítico. O interesse do mercado é no lucro crescente das empresas. Não há outra preferência além dessa.

Objetivamente, Lula 1 [primeiro mandato, de 2003 a 2006] foi um espetáculo de desenvolvimento da Bolsa. Se for um Lula sem revanchismo, um Lula Mandela, um Lula ligado ao [Henrique] Meirelles ou ao Marcos Lisboa na Fazenda, com uma natureza que se comprometa com uma postura ortodoxa, pode ser um Lula bem recebido, falando como financista.

Como brasileiro, eu acharia um desastre ético gigantesco o Lula voltar a ser presidente.

Por outro lado, o mercado pode se reconciliar com Lula, se ele vier com uma pauta ortodoxa, como foi o Lula 1, com aquele esquadrão que ele montou.

O Bolsonaro é a continuidade, o que não tem muito problema. Bolsa está aí, com recorde com o Bolsonaro.

Agora eu acho que se pudesse escolher, o mercado optaria por uma terceira via. Mas parece que estamos condenados a essa polarização pelo menos até agora.

Em 2014, você escreveu que seria "O fim do Brasil", e que o país passaria por muitas adversidades. Qual é sua tese para o Brasil hoje?

O Brasil está um pouco condenado a uma certa mediocridade. Quando você vê uma eleição representada por Bolsonaro e Lula, a não ser que aconteça uma grande novidade, é um pouco a representação do que é o Brasil.

Por outro lado, é um Brasil que avança. De algum modo, somos hoje melhor do que éramos há 20 anos.

Do ponto de vista de ativos financeiros, estou otimista, porque é um cenário que reúne crescimento econômico global muito forte, preço de commodities alto, e o Brasil é sensível a isso.

Os indicadores recentes superando as expectativas de todo mundo. A relação dívida/PIB que ia superar 110%, agora convergindo para 83%.

O Brasil está precificado como muito ruim. Ninguém quer saber do Brasil no mundo. O Brasil não é nem o Cristo decolando, nem o Cristo indo para baixo, é o Cristo parado, e ele vai continuar lá. Na verdade, talvez essa seja a grande tese: as duas capas da The Economist estão erradas.

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