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Regra pode mudar para deixar investimentos de milionários mais acessíveis

CVM quer mudar regras para mais pessoas poderem ser classificadas como investidor qualificado - Siriwat Nakha/EyeEm/Getty Images
CVM quer mudar regras para mais pessoas poderem ser classificadas como investidor qualificado Imagem: Siriwat Nakha/EyeEm/Getty Images

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

05/08/2021 04h00

Alguns investimentos no mercado brasileiro são proibidos para o pequeno investidor. São produtos disponíveis apenas para o chamado investidor qualificado, aquele que tem mais de R$ 1 milhão livres para investir. Mas agora a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), órgão do governo que regulamenta e fiscaliza o mercado de capitais, quer mudar as regras para que mais gente possa entrar nesse grupo especial.

Veja abaixo as regras que definem o que é um investidor qualificado, por que essas regras existem, quais as mudanças que podem ser feitas, e mais as vantagens e os riscos que podem surgir para quem entra nesse grupo.

O que é investidor qualificado?

Investidor qualificado é um aplicador que tem pelo menos R$ 1 milhão de patrimônio financeiro disponível para investir. Esse limite é estabelecido pelo capital realmente livre para aplicação. Se uma pessoa tem um imóvel que vale R$ 1 milhão mas reside nele, por exemplo, esse valor não vale para efeito de classificação.

Por que existe esse tipo de classificação?

No Brasil e também em outros mercados, como nos Estados Unidos, existe a classificação de investidor qualificado. O objetivo dessa classificação é proteger o pequeno aplicador de investimentos que apresentam valores ou riscos elevados, ou que sejam mais complexos.

No entendimento dos órgãos reguladores, pessoas com maior patrimônio podem assumir mais riscos porque têm mais capital para cobrir perdas, podem contratar serviços especializados de consultoria financeira para fazer as escolhas e ainda têm acesso a apoio jurídico em casos de perdas.

Por que a CVM quer mudar as regras?

Desenvolvimento do mercado: o atual regulamento que define a figura do investidor qualificado é de julho de 2015 (Instrução 554), que estabeleceu o valor de R$ 1 milhão para essa categoria. Na visão da CVM, desde então, o mercado brasileiro vem se desenvolvendo tanto em relação às empresas e profissionais que vendem os produtos como no lado dos aplicadores que precisam investir.

Esse debate vem sendo discutido desde 2019 com o mercado, que tem sinalizado espaço para maior flexibilização das regras de investimentos. Até pelo desenvolvimento do próprio mercado de capitais no Brasil, que possibilita a circulação de mais informações e maior diversidade de produtos para que aplicadores possam tomar decisões em relação ao perfil de risco.
Bruno Luna, chefe da Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos da CVM

Veja abaixo alguns números que mostram essa evolução

  • Fundos de investimento: eram 15 mil em 2016; hoje são 24,5 mil
  • Administradores de investimentos: eram 3,4 mil em 2016; hoje são 3,9 mil
  • Analistas: eram 624 em 2016; hoje são 989
  • Agentes autônomos de investimentos: eram 6,1 mil em 2016; hoje são 16 mil
  • Investidores pessoas físicas na Bolsa: eram 600 mil em 2016; hoje são 3,5 milhões

Juros baixos: com os juros em patamares mínimos históricos, o aplicador precisa ter acesso a uma maior diversidade de investimentos com maior potencial de retorno para garantir a renda no futuro.

O investidor precisa ter acesso a mais produtos com maior potencial de retorno porque estamos em um ambiente em que os produtos tradicionais estão com um potencial de rendimento mais baixo.
Luiz Henrique Carvalho, gerente de Representação de Distribuição da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais)

Quais regras podem mudar para definir investidor qualificado?

A CVM divulgou um estudo na segunda semana de julho em que apresenta algumas mudanças que poderiam ser feitas.

  • Redução do valor mínimo a investir: o valor mínimo de patrimônio financeiro que a pessoa precisaria ter para ser considerada investidora qualificada cairia de R$ 1 milhão para aproximadamente 600 salários-mínimos, ou algo ao redor de R$ 600 mil.
  • Considerar a renda: uma pessoa com uma renda mensal equivalente a 15 salários-mínimos poderia ter condições de ser um investidor qualificado, mesmo que não tenha ainda acumulado mais de R$ 1 milhão. Esse critério busca ajudar jovens investidores, que ainda não têm um patrimônio formado, mas estão numa fase da carreira de crescimento e com boa renda, e que podem assumir mais riscos.

Quantas pessoas podem ser beneficiadas?

Nem o órgão regulador CVM nem a entidade das instituições financeiras Anbima têm estimativas da quantidade de brasileiros que hoje têm o selo de investidor qualificado. Por isso também, essas fontes não conseguem apontar quantas pessoas a mais poderiam entrar nesse grupo com as novas regras.

Mas profissionais de mercado apontam que haverá mais investidores capazes de colocar o dinheiro em produtos hoje exclusivos apenas para quem tem mais de R$ 1 milhão.

Vivemos em ambiente de juros muito baixos, e a classificação de investidor qualificado hoje preserva boas oportunidades para grandes investidores. A gente tem feito um esforço grande de investir muito em educação financeira. E até como resultado desse desenvolvimento do mercado, o tempo inteiro a gente tem cliente querendo investir em um produto exclusivo para investidor qualificado e que fica frustrado quando não pode. Isso acaba criando um atrito entre o cliente e a instituição.
Marcelo Flora, sócio-responsável pelo BTG Pactual Digital

Exemplos de produtos

Um exemplo desse tipo de produto citado pelo executivo do BTG Pactual Digital é o BTGP Mobius Emerging Markets Investimento no Exterior Fi Multimercado, que aplica pelo menos 95% do patrimônio líquido em quotas do Mobius Sicav, fundo da gestora global criada pelo mega investidor Mark Mobius. Esse produto acumula ganhos de 39% em 12 meses.

Também na plataforma de investimentos XP, a lista de produtos hoje acessíveis apenas ao investir qualificado possui diversos fundos que aplicam em ativos no exterior.

Caso do Hashdex 40 Nasdaq Crypto Index FIC FIM, que investe no mercado de criptoativos, tendo até 40% do patrimônio aplicado em cotas de fundos de investimentos offshore (exterior) que buscam replicar o índice Hashdex Digital Assets Index (HDAI), da Bolsa norte-americana Nasdaq. Esse fundo acumula ganho de 77% em 12 meses.

Mesmo que a Selic esteja subindo um pouco hoje, os juros no Brasil ainda estão muito baixos. Nesse ambiente é importante que mais investidores possam acessar novas fontes de retorno também no exterior. Isso melhora a relação risco e retorno da carteira porque o aplicador consegue diversificação em produtos que não dependem apenas do Brasil.
Fabiano Cintra, especialista em fundos da XP Inc

Riscos também são maiores

O investidor qualificado pode acessar produtos que hoje dão maior potencial de retorno, mas também podem oferecer maior risco e volatilidade.

A plataforma de investimentos Vitreo é um exemplo dentre instituições financeiras que trabalham com produtos de investimentos hoje só acessíveis ao investidor qualificado. São mais de cem opções.

Temos uma lista de fundos que são muito bons e que o público em geral não pode comprar. O investidor qualificado tem mais acesso a produtos, como, por exemplo, fundos de investimento no exterior.
George Wachsmann, chefe de gestão da Vitreo

Entre esses produtos, há o fundo Canabidiol, que investe em empresas internacionais do setor de cannabis. A aplicação inicial é de apenas R$ 100,00, mas esse produto só está disponível para investidor qualificado. O fundo acumula em 12 meses uma rentabilidade de 75%. Mas no período dos últimos 30 dias, esse produto teve queda de 6,8%. O resgate é em 30 dias a partir do pedido.

Quando nosso mercado não oferece mais rendimentos de 20% ao ano sem riscos, como era no passado, é importante haver mais opções para o investidor que busca retorno no longo prazo. Mas esse processo precisa ser feito com cuidado com o conhecimento que os investidores terão dos riscos e com a transparência da remuneração de toda a cadeia dos investimentos.
Valter Police, planejador fiduciário da Fiduc

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