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Estrangeiros retiram R$ 4,8 bi da Bolsa; veja os efeitos nos investimentos

Juliana Portugal

Colaboração para o UOL, em São Paulo

08/10/2021 04h00

Em setembro, a Bolsa brasileira viu os investidores estrangeiros retirarem R$ 4,8 bilhões. A quantia supera o que tinha sido até então a maior saída deste ano, em março, quando eles sacaram R$ 4,6 bilhões. No ano, por enquanto, o saldo ainda é positivo: eles investiram em torno de 72 bilhões na Bolsa até o final de setembro.

A instabilidade interna, com riscos políticos e fiscais, tem deixado os investidores receosos, segundos especialistas. Entenda abaixo os motivos da saída de recursos estrangeiros da Bolsa e como isso afeta os investimentos aqui no Brasil.

Por que os estrangeiros estão deixando o Brasil?

"Grande parte dos investidores está enxergando um risco fiscal e político muito elevado no nosso país. Por mais que o prêmio [juros pagos pelos investimentos] esteja atrativo, as falas do presidente Jair Bolsonaro nas manifestações de 7 de setembro acabaram impulsionando os investidores, que estão com medo", afirma o sócio e assessor de renda variável da Acqua-Vero Investimentos, Gustavo Gomes.

O sócio-fundador da Quattro Investimentos, Rafael Amaral, acrescenta ainda mais dois motivos nessa lista.

"Temos a alta dos juros e da inflação que também começam a pesar e a tirar as perspectivas de crescimento da economia. Além disso, há a [possibilidade de] nova taxação sobre os dividendos pagos pelas empresas", afirma.

O especialista se refere à reforma do Imposto de Renda, cujo texto aprovado pela Câmara dos Deputados prevê taxação de 15% nos dividendos distribuídos pelas empresas. A proposta ainda será votada pelo Senado.

Proximidade de ano eleitoral afasta estrangeiros

De acordo com Amaral, a saída dos estrangeiros é bastante comum em cenários de mais instabilidade.

"Sob o ponto de vista econômico, historicamente temos uma taxa de juros muito instável, que sobe e desce a todo momento, e isso muda bastante os rumos das aplicações estrangeiras por aqui", diz.

Amaral ainda destaca as mudanças políticas, especialmente em anos de eleição. Segundo dados da B3, nos últimos cinco anos, a maior saída de recursos estrangeiros foi notada em 2018, ano de eleições presidenciais. Foram retirados R$ 5,6 bilhões naquele ano. Em 2019, os estrangeiros seguiram o mesmo ritmo, com um pouco menos de intensidade, e retiraram R$ 4,6 bilhões da Bolsa.

Como isso afeta investimentos por aqui?

"A boa notícia é que, hoje, a Bolsa é menos dependente do fluxo internacional. Temos seis vezes mais CPFs na Bolsa do que em 2015, e o fluxo dos fundos multimercado e de ações locais também ajudam", afirma o sócio-fundador da iHub Investimentos, Paulo Cunha.

Apesar dessa menor dependência, o capital externo ainda manda no jogo, pois tem o poder de influenciar as compras locais também.

Amaral destaca que o investidor brasileiro pode esperar mais volatilidade e precisa calibrar os prazos de suas aplicações.

"Os investidores brasileiros acabam tendo que esperar mais tempo para ver seus ativos rendendo de forma positiva [nesse cenário]", afirma.

Outro fator de atenção para o investidor brasileiro é a possível alteração no preço das ações.

"Onde tem fuga de capital, tem a 'venda' de algum ativo ou alguma ação. E se esse movimento de venda constante e frenética afeta o preço dos papéis negativamente na Bolsa", diz Amaral.

Em outras palavras, segundo o especialista, a Bolsa está barata. "Por conta da imprevisibilidade política e econômica e a falta de capital estrangeiro na Bolsa, as ações têm mais dificuldade de aumentar."

Que empresas são mais afetadas?

A saída dos investidores estrangeiros também afeta negativamente parte das empresas listadas.

"Isso vale inclusive para as 'blue chips', que tendem a ser mais seguras. As estatais também costumam se depreciar mais do que a média, quando o risco político aumenta", diz Amaral.

Blue chips são empresas com ações muito negociadas na Bolsa de Valores. Em termos simples, são as companhias mais populares da Bolsa, como Petrobras, Vale e Magazine Luiza.

Quem também sente essa movimentação, de acordo com Amaral, são as companhias menores, as chamadas "small caps", pois necessitam de maior liquidez e novos investidores para desenvolver seus negócios.

"Uma das alternativas é procurar empresas 'dolarizadas', exportadoras. Empresas do setor de commodities têm essa característica e tendem a ter menos problemas em relação às demais", diz Amaral.

Os estrangeiros vão voltar?

Para Cunha, da iHub, é difícil prever se esses investidores voltarão para a Bolsa brasileira.

"Inicialmente precisaríamos de um alinhamento macro-internacional, com diminuição de uma eventual crise na China", diz.

Segundo Cunha, uma expectativa de subida de juros globais de forma mais paulatina e inflação controlada contribuiriam para a situação brasileira.

"Seria preciso também clareza na política monetária local e uma definição das eleições de 22 com sinalização de que o eleito seguiria com os ajustes fiscais e reformas", afirma.

Em relatório, Fernando Ferreira, estrategista-chefe da XP, e Jennie Li, estrategista de ações da empresa, afirmaram que o retorno desses investidores para a Bolsa brasileira acontecerá quando houver "melhor resolução sobre a trajetória fiscal e política do país; continuação da recuperação econômica; cenário positivo para as commodities e os mercados emergentes, e avanço crescente das iniciativas ESG pelas empresas brasileiras".

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