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OCDE se transforma em especialista preferido dos governos

01/06/2015 17h52

Paris, 1 Jun 2015 (AFP) - A OCDE, uma organização liberal antes isolada pelo ostracismo, agora se torna um centro de especialistas imprescindível na Europa, assessorando de bancos suíços a um ministro grego.

"Quando comecei minha carreira (no ministério da Fazenda francês), em 1996, me enviaram para fazer uma visita à OCDE. Disseram: 'Espero que você não tenha que trabalhar nunca nessa organização de segunda'", contou à AFP Pascal Saint-Amans.

Contudo, ele voltou, em 2007, no momento de reestruturação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.

Se a OCDE, onde Pascal Saint-Amans conduz um dos grandes projetos, como o da luta contra fraude fiscal, decolou, foi graças a seu secretário geral desde 2005, o mexicano Ángel Gurría. Por unanimidade, os 34 Estados-membros acabam de lhe confiar um terceiro mandato até 2021.

O dinâmico mexicano presidirá nos dias 2 e 3 de junho o fórum da OCDE, encontro anual da organização que se transformou em um desfile de personalidades.

Nada a ver com a OCDE que Gurría encontrou em sua chegada, uma instituição consultiva decadente, nascida do plano Marshall para a reconstrução da Europa após 1945 e depois muito associada ao bloco ocidental.

Para lhe devolver o brilho, Gurría recorreu à sua agenda de contatos. O ministro da Economia mexicano entre janeiro de 1998 e dezembro de 2000, consagrou-se pela hábil renegociação da dívida do país, com o apoio de Washington, que nada mais é do que o principal contribuinte financeiro da OCDE.

Quando a crise de 2008 estourou, se impôs nos debates do G20, grupo das grandes potências econômicas, que buscou coordenar uma resposta ao cataclismo econômico.

Jovial, poliglota e perspicaz, Gurría percorre o mundo com seus relatórios debaixo do braço.



Um refúgio para a Grécia

A OCDE avalia os sistemas escolares (Pisa), faz estudos sobre o consumo de álcool dos jovens, elabora listas negras dos paraísos fiscais, estuda as desigualdades e faz previsões de crescimento.

"Atualmente, a OCDE é mais pertinente, tem maior impacto, quem sabe porque identificamos melhor o que interessa aos nossos membros", disse Gurría à AFP.

"Não somos um 'think tank', somos um 'do tank', o que significa que os estudos que fazemos se destinam a servir às políticas públicas e não a seminários ou discussões políticas", ressalta.

Os governos escutam as recomendações do secretário-geral.

No final do verão de 2014, quando atmosfera era irrespirável em Atenas, a Grécia e seus credores se refugiaram na OCDE para negociar.

Em fevereiro de 2015, quando o Syriza chegou ao poder, consultou a OCDE. O primeiro-ministro Alexis Tsipras se sente "confortável" com essa instituição, apesar de ela defender a flexibilidade do mercado de trabalho, o controle do gasto público e a competitividade.

"A organização não se transformou em um antro de trotskistas", ri Pascal Saint-Amans. "Os fundamentos continuam sendo liberais, mas hoje são levados em conta assuntos como justiça fiscal e desigualdades".

Para cobrir todos esses assuntos, a instituição, que em 2014 teve um orçamento de 357 milhões de euros, contratou escritória de consultoria privado.

Propõe missões curtas e bem remuneradas: até 6.800 euros por mês para um "analista de políticas energéticas" com experiência mínima de 3 anos. A OCDE, que defende a justiça fiscal, se beneficia, como outras organizações internacionais, de isenção fiscal.

Para compensar, a organização não esconde suas remunerações e revela o salário do chefe: um pouco mais de 200.000 euros de salário base em 2014.

Este "clube de países ricos" se abre também, lentamente, às potências médias e aos países emergentes.

Estônia, Chile, Israel e Eslovênia se juntaram à instituição enquanto Colômbia e Costa Rica se preparam para fazê-lo. Brasil, China e Índia estão sendo consultados.



Viés em favor dos ricos

No entanto, "o mundo segundo a OCDE" nem sempre convence.

Os testes Pisa, realizados regularmente sobre as competências escolares dos jovens de diversos países, são polêmicos. No ano passado, universitários do mundo todo publicaram no jornal britânico The Guardian um artigo de opinião contra esses exames, considerados utilitaristas e muito quantitativos.

"Não entendemos como (a OCDE) se transformou em árbitro dos fins e dos meios da educação no mundo, em vez da ONU ou da Unicef", lamentaram.

O mesmo tipo de crítica é feita sobre o papel desempenhado pela OCDE nas negociações contra a fraude e a otimização fiscal.

"O processo tem um viés a favor dos países ricos", disse à AFP Manon Aubry, da ONG Oxfam France. "Os países em desenvolvimento não estão envolvidos nas negociações. E já se sabe que quando um não se senta à mesa, acaba no prato".