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Catar cogita restringir acesso de imigrantes a centros comerciais

25/11/2015 18h08

Doha, 25 Nov 2015 (AFP) - Uma lei polêmica ameaça dezenas de milhares de trabalhadores migrantes presentes no Catar, muitos deles nas obras da Copa do Mundo de 2022, de ter acesso aos principais shoppings do país.

A grande maioria desses migrantes são solteiros, ou deixaram as famílias nos seus países de origem, na Ásia.

Muitos deles criaram o hábito de aproveitar o único dia de folga para passar tempo nos centros comerciais, que fazem parte dos poucos locais públicos com ar condicionado no Catar, que chega a registrar temperaturas de até 50 graus no verão.

Esses trabalhadores podem perder essa possibilidade de diversão caso o Conselho Municipal Central (CMC) consiga a instaurar o "dia pela família" nos oito maiores shoppings do país, uma ideia considerada "segregacionista por organizações de defesa dos direitos humanos.

A medida será debatida no dia 1º de dezembro pelo CMC. Se for aprovada, apenas as famílias serão autorizadas a entrar nos centros comerciais em questão durante um dia do fim de semana, na sexta-feira ou no sábado.

'Exigência essencial'Nasser ben Ibrahim Al-Mohannadi, membro do CMC que defende a medida, alega que a presença de migrante intimida os catarianos de origem, principalmente as mulheres.

"O Catar tem uma sociedade baseada na família, e as famílias têm direito de ter um dia somente para elas", justifica o político à AFP. "Os shoppings não são apenas locais de comércio. São também locais de diversão e reunião para as famílias", enfatiza.

Mohannadi relata que muitos catarianos da cidade da Al-Khor, a 50 quilômetros ao norte da capital Doha, se queixam do "número importante" de migrantes nos centros comerciais.

O 'dia pela família' já existiu no passado, mas foi abandonado por não ser aplicado pelos shoppings.

Cheikha Al-Jufairi, uma das duas mulheres do CMC, que tem 29 membros, também é a favor da medida.

"É uma exigência essencial, porque as famílias sofrem por não poder entrar nos shoppings durante o fim de semana por causa do enorme número de trabalhadores", argumenta.

Al-Jufairi nega qualquer discriminação, ao alegar que a medida seria aplicada para pessoas de todas as nacionalidades, inclusive os solteiros catarianos.

O CMC, porém, não tem o poder de impor a restrição de entrada nos shoppings, por isso solicitou a intervenção do ministério da Economia e do Comércio, que enviará um representante para participar da reunião do dia 1º de dezembro.

'Cidadãos de segunda classe'Cerca de 1,8 milhão de estrangeiros trabalham no Catar, formando cerca de 90% da população total do país árabe.

Para George, ganês que costuma passar o dia de folga no City Central Mall de Doha, o projeto é "uma péssima notícia".

"A sexta-feira é o dia em que faço minhas compras", lamenta o trabalhador, cuja esposa e os dois filhos permaneceram no seu país."Somos tratados como cidadãos de segunda classe", resume o ganês.

"Isso parece ser discriminação furtiva", denuncia Nicholas McGeehan, pesquisador da Human Rights Watch, ONG que já apontou graves problemas nas condições de trabalho nas obras da Copa-2022.

O argumento das famílias não convence McGeehan, que fala em "segregação".

"Eles já estão sendo alvo de tantas críticas sobre direitos trabalhistas, porque adicionar a isso discriminação racial", questiona o pesquisador.

O 'dia pelas famílias' não é a única medida polêmica que diz respeito a trabalhadores migrantes.

O ministério do Planejamento Urbano publicou um mapa que aponta locais designados como "zonas proibidas", destinados à construção de alojamentos para migrantes.