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Especialistas comparam a especulação de criptomoedas como vício em jogos

Criptomoedas, como bitcoin e ethereum, são conhecidas por sua volatilidade - Dmitry Demidko/ Unsplash
Criptomoedas, como bitcoin e ethereum, são conhecidas por sua volatilidade Imagem: Dmitry Demidko/ Unsplash

Da AFP

04/11/2021 10h48Atualizada em 04/11/2021 10h48

Matt Danzico entendeu que tinha um problema sério, quando começou a ver logotipos de criptomoedas nas embalagens de produtos de supermercado. Durante a pandemia, ele se viu arrastado pelo furor das moedas digitais, o que, rapidamente, transformou-se em uma obsessão.

"Passava noites acordado, me revirando na cama, tentando tirar os gráficos da minha cabeça", contou este designer e jornalista visual radicado em Barcelona. "Pensei que estivesse enlouquecendo", desabafou.

Criptomoedas, como bitcoin e ethereum, são conhecidas por sua volatilidade, e Danzico, de 39 anos, viu "dinheiro de anos" sendo "ganho e perdido em um curto período de tempo". Ele perdeu muito dinheiro, mas não revela o montante.

Suas emoções reproduziram esta mesma montanha-russa, um quadro agravado pelo fato de ele estar especulando em meio ao confinamento trazido pela covid-19. Sua mulher percebeu que ele estava ficando cada vez mais ansioso e irritado.

Com o crescimento das criptomoedas, Danzico teme que experiências ainda mais graves do que a sua estejam ocorrendo ao redor do mundo.

"Estamos falando sobre dezenas de milhões de pessoas que operam com criptomoedas", afirmou.

"Se uma pequena fração dessas pessoas ficar dependente, será um enorme potencial para crises mentais em uma escala que não acredito que o mundo já tenha visto", alerta.

O lado obscuro das 'cripto' no Twitter

Segundo Danzico, basta acompanhar o Twitter, onde se reúnem os "criptoentusiastas", para entender as potenciais consequências da instabilidade crônica das moedas digitais para a saúde mental.

Tuítes de "pessoas que discutem sua depressão profunda, pensamentos extremos de isolamento e de suicídio" costumam acompanhar a desvalorização das moedas virtuais.

Em setembro, viralizou a história de um tcheco e de sua tentativa desastrosa de enriquecer com criptomoedas, que se endividava cada vez mais para recuperar suas perdas. Deprimido e sem casa para morar, sentiu-se envergonhado demais para pedir ajuda.

"Quando liguei para minha mãe, disse a ela que estava bem, que tinha um bom emprego, um lugar para dormir etc., na verdade, eu estava passando fome", relatou um usuário chamado Jirka, que agora tenta reconstruir sua vida.

Preocupado com sua própria experiência e com outras contadas on-line, Danzico começou a pesquisar sobre a dependência em criptomoeda e publicou suas descobertas no site de notícias especializado Cointelegraph.

Ele encontrou apenas um estudo de pequena escala sobre criptodependência na Turquia, e alguns poucos terapeutas oferecendo ajuda, da Tailândia aos Estados Unidos.

Os especialistas veem o fenômeno como uma forma de dependência em jogo e indicam semelhanças com os operadores de Wall Street, cujos investimentos podem ficar fora de controle.

A clínica Castle Craig, um centro de reabilitação na Escócia, descreve a dependência em criptomoeda como uma "epidemia moderna". O problema é mais frequente entre os homens, observou a clínica em seu site, mas "isso pode ser porque as mulheres operam menos em criptomoedas do que os homens".

Para Danzico, a "alarmante" falta de ajuda psicológica especializada se dá porque as pessoas ainda não se deram conta do quanto a especulação com criptomoedas se generalizou.

Em julho, a plataforma Crypto.com estimou que 221 milhões de pessoas estavam operando no mundo todo. O número dobrou em seis meses, quando milhões começaram a se envolver nessa atividade, durante os períodos de confinamento da pandemia.