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Banco do Brics tem potencial de virar o jogo, diz economista dos EUA

Alessandra Corrêa

De Nova York para a BBC Brasil

17/07/2014 15h28

A criação de um banco de desenvolvimento pelo Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) "tem o potencial de virar o jogo" no cenário financeiro internacional, disse à BBC Brasil o economista Mark Weisbrot, codiretor do Center for Economic and Policy Research, com sede em Washington.

Com capital inicial de US$ 50 bilhões para financiar obras de infraestrutura em países pobres e emergentes, o Novo Banco de Desenvolvimento do Brics vem sendo encarado como uma alternativa ao Banco Mundial e ao FMI (Fundo Monetário Internacional).

Para Weisbrot, o novo banco deverá reduzir a influência internacional dos Estados Unidos e da União Europeia.

"Já estava mais do que na hora de o mundo ter um banco como esse", afirma.

"Setenta anos é muito tempo para ter todas as instituições internacionais com alguma capacidade de decisão em questões econômicas sendo controladas pelos EUA e um punhado de aliados ricos", diz, referindo-se à Conferência de Bretton Woods, em 1944, que levou à criação do FMI e do Banco Mundial.

"O banco do Brics tem o potencial de virar o jogo."

O tratado que formaliza a criação do banco foi assinado nesta terça-feira pelos líderes dos cinco países-membros do Brics, durante o 6º Fórum dos Brics, em Fortaleza.

Os membros do Brics, assim como outros países emergentes, reivindicam há anos reformas que lhes garantam mais voz e mais poder de decisão no FMI e no Banco Mundial.

O argumento é o de que a estrutura atual das duas instituições, tradicionalmente dominadas pelos Estados Unidos e por países europeus, é ultrapassada e ainda reflete a ordem mundial do pós-guerra.

Reservas

Weisbrot ressalta a importância do fundo de US$ 100 bilhões que também foi anunciado pelos Brics.

Batizado de Arranjo Contingente de Reservas, esse fundo poderá ser acionado para socorrer países-membros do grupo que passem por risco de calote.

"Se for bem-sucedido, vai fazer enorme diferença. Talvez até os países europeus busquem ajuda", afirma.

Segundo Weisbrot, para se ter uma ideia do impacto do novo banco na geopolítica financeira, basta observar o que ocorreu nos últimos 15 anos, quando o FMI perdeu influência em vários países de renda média após a crise financeira asiática.

"Olhe para a América Latina, veja como cresceu mais rápido na última década do que nas duas décadas anteriores. É claro que não foi somente por causa do (menor poder do) FMI, mas em grande parte, sim."

A expectativa é de que o novo banco comece a operar em 2016. Sua criação precisa ser aprovada pelos Congressos dos cinco países.

A sede será em Xangai, na China. A presidência será rotativa, com o primeiro mandato, de cinco anos, a cargo da Índia.

Temores

O capital inicial de US$ 50 bilhões será dividido igualmente entre os cinco países.

No caso do fundo de US$ 100 bilhões, a maior parte do montante virá da China (US$ 41 bilhões). Brasil, Rússia e Índia contribuirão cada um com US$ 18 bilhões, e a África do Sul entrará com US$ 5 bilhões.

O anúncio provocou temores de que, do mesmo modo que o Banco Mundial e o FMI são muitas vezes criticados por serem instrumentos da hegemonia americana, o novo banco possa se transformar em ferramenta para servir aos interesses chineses.

Weisbrot, no entanto, diz achar pouco provável que isso ocorra. Ele observa que os chineses "têm uma filosofia diferente" e lembra que não costumam vincular condições em seus empréstimos na África.

"A China não é um país neoliberal, o Estado é dono da maior parte do sistema financeiro e das grandes companhias, e não o contrário, quando as grandes companhias são donas do Estado", diz o economista americano.

"Isso não quer dizer que não vão defender seus interesses. Mas há uma diferença entre defender seus interesses e remodelar uma sociedade inteira à imagem que você deseja."

Outra preocupação em relação ao novo banco vem de ONGs, que dizem temer que a instituição financie projetos com impacto social ou ambiental negativo.

"É uma possibilidade", admite Weisbrot.

"Mas o que o Banco Mundial faz? Houve algumas reformas, é verdade, mas foram pequenas. Eles ainda financiam grandes projetos de combustíveis fósseis e todo tipo de coisa destrutiva ao meio ambiente", afirma.