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Quem ganha e quem perde com a queda do preço do petróleo?

Tim Bowler

Repórter de Negócios da BBC News

17/10/2014 20h00

O momento de queda no preço do petróleo leva alguns exportadores do produto a se prepararem para uma significativa queda de receitas. Ao mesmo tempo, países importadores da commodity podem se beneficiar, já que o preço tende a cair para seus consumidores.

Os exemplos ilustram vencedores e perdedores da atual redução no preço do petróleo, que até recentemente se mantinha estável a cerca de US$ 110/barril.

Uma fraca demanda, somada a mudanças significativas na produção energética dos EUA, tem forçado o preço do Brent (referência do mercado) a cair 30% desde junho, chegando a US$ 83/barril.

Nesta sexta, o preço teve leve alta, mas está no patamar dos US$ 86.

Nesse cenário, quem mais se beneficia e quem é prejudicado?

Venezuela: Inflação e escassez

A Venezuela é um dos maiores exportadores de petróleo do mundo, mas enfrentava dificuldades antes mesmo da atual queda de preços. Críticos atribuem esses problemas à má gestão dos recursos.

Na semana passada, o chanceler do país, Rafael Ramírez, pediu uma reunião emergencial da Opec (organização de países exportadores de petróleo) para elevar o preço acima dos US$ 100/barril. Alguns acreditam, porém, que a Venezuela precisaria de preços a US$ 120/barril para seguir financiando os elevados custos de seus programas sociais.

O país já vive inflação galopante (ao redor de 50%), estimulada pelo controle cambial exercido pelo governo, o qual criou um forte mercado negro e provocou a escassez de diversos produtos em supermercados.

O presidente Nicolás Maduro insiste, porém, que a queda de preços não prejudicará a economia venezuelana.

"O preço vai chegar a seu piso e subir de novo. A Venezuela seguirá com seus projetos sociais", declarou.

Rússia: 'Tensionado, mas equilibrado'

Fortemente dependente da exportação de petróleo e gás, a Rússia perde cerca de US$ 2 bilhões em receita para cada redução de US$ 1 no preço do barril. A atual queda deve fazer com que os lucros com a venda da commodity cheguem ao nível mais baixo desde dezembro de 2010, disse um conselheiro da Chancelaria russa à Bloomberg.

Nesta semana, o presidente Vladimir Putin disse que o país poderá ter que cortar gastos, agregando que o orçamento russo está "tensionado mas equilibrado e totalmente realista".

No início do mês, o FMI reduziu sua perspectiva de crescimento para a Rússia de 1% a 0,5%. E o banco estatal Sberbank defende que o preço do petróleo precisa estar acima dos US$ 104 para que haja equilíbrio orçamentário.

O rublo russo caiu fortemente neste ano, atrelado ao petróleo e estimulado pelo conflito com a Ucrânia e pelas sanções impostas pelo Ocidente na Rússia.

Arábia Saudita: Preço x fatia de mercado

A Arábia Saudita, maior exportadora de petróleo do mundo e mais influente membro da Opec, poderia promover a retomada dos preços se cortasse sua própria produção - de forma a reduzir a oferta de petróleo disponível no mercado. Mas, até agora, o país não deu sinais de que fará isso.

Por enquanto, o governo saudita indica que "está feliz em deixar os preços caírem um pouco mais", avalia Jason Bordoff, do Centro de Políticas Energéticas Globais da Universidade Columbia.

Pode haver duas razões para isso: tentar impor algum tipo de disciplina entre outros países da Opec ou, talvez, pressionar a competitividade da crescente indústria americana de gás e de xisto.

Apesar de um aumento de preços beneficiar a Arábia Saudita, o país tem uma reserva monetária estimada em US$ 700 bilhões - ou seja, consegue sustentar-se com preços menores por algum tempo.

"Em termos de produção e precificação do petróleo pelos produtores do Oriente Médio, eles começam a reconhecer o desafio (representado pela) produção americana", diz Robin Mills, da consultoria energética Manaar. "Eles têm de precificar seu petróleo corretamente e, às vezes, com descontos consideráveis para conseguir entrar no mercado americano."

Se a baixa no preço levar à falência de algumas produtoras, talvez a Arábia Saudita se veja forçada a defender a retomada do mercado no longo prazo.

Opec: Nem todos são iguais

Alguns países produtores do golfo Pérsico, como Emirados Árabes Unidos e Kuait, também acumularam reservas consideráveis de moeda estrangeira que lhes dão fôlego em momentos de queda de preço.

Mas outros, como Irã, Iraque e Nigéria, com grandes demandas orçamentárias domésticas - por conta de sua grande população relativamente ao tamanho de suas reservas -, têm margem de manobra menor.

Na Síria e no Iraque, combatentes do grupo autodenominado "Estado Islâmico" tomaram o controle de poços de petróleo. Mas, segundo a Agência Internacional de Energia, os ataques aéreos contra o grupo reduziram a produção de petróleo ali.

Estados Unidos: o avanço do xisto

O país tem vivenciado uma forte produção energética, puxada pelo crescimento da polêmica exploração de gás e petróleo de xisto - e isso tem forçado a baixa dos preços no mercado mundial.

Além disso, o petróleo de xisto é mais barato, ou seja, a guerra de preços tende a ser vencida pelos EUA no longo prazo.

"O xisto basicamente alterou o elo entre as turbulências geopolíticas no Oriente Médio e os preços do petróleo", explica Seth Kleinman, chefe de estratégia energética no banco Citi.

Europa e Ásia: impactos econômicos

Com crescimento e inflação baixos em vários países europeus, além de temores de inflação, a queda nos preços será bem-vinda por vários deles.

Algumas estimativas indicam que uma queda de 10% no preço do petróleo levaria a 0,1% de aumento na produção econômica. Mas mercados financeiros têm sentido os efeitos da queda dos preços das ações de empresas energéticas.

A China, que deve se tornar o maior importador de petróleo, tende a se beneficiar dos preços mais baixos. Mas isso não deve ser o bastante para compensar os efeitos da desaceleração econômica do país.

O Japão importa praticamente todo o petróleo que consome. Mas preços mais baixos têm prós e contras: uma alta forçaria mais inflação, algo crucial no plano do governo para conter a deflação em curso atualmente.

Petrobras: perda de um lado, ganho do outro

Ainda não está claro qual será o impacto total da mudança no patamar de preços do petróleo no mercado internacional para a Petrobras.

Por um lado, a queda beneficia a empresa uma vez que zera o subsídio implícito na importação e venda de combustível no mercado interno, fazendo com que deixe de ter prejuízo nessa operação. Segundo um estudo do Credit Suisse, por exemplo, a gasolina vendida pela estatal no mercado doméstico já estaria 1% mais cara que a média dos preços no mercado externo. Em setembro, era quase 25% mais barata.

"Havia defasagem e agora não há defasagem. Agora é em benefício da Petrobras. O preço da gasolina está mais alto (no mercado interno), então a Petrobras está ganhando com isso", disse recentemente o ministro da Fazenda Guido Mantega, acrescentando que isso não significa que a estatal não aumentará os preços do combustível para o mercado doméstico. "Isso é uma decisão da empresa."

Por outro lado, a mudança pode prejudicar tanto a receita com exportações da Petrobras quanto os planos de investimento da estatal no pré-sal. Isso porque os custos para se extrair petróleo das reservas do pré-sal são mais altos do que os de reservas tradicionais. Se os preços do produto final caírem demais, pode não valer a pena explorar alguns poços. Pelo Plano de Negócios da Petrobrás para os próximos quatro anos a cotação prevista para o petróleo tipo Brent é de US$ 105 neste ano e US$ 100 até 2017. Hoje a cotação está na faixa dos US$ 86.