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O que pode mudar na política econômica se Dilma vencer?

21/10/2014 08h03

Ruth Costas

Da BBC Brasil em São Paulo

"Governo novo, ideias novas", diz o lema da campanha do PT - e a presidente Dilma Rousseff já anunciou que a política econômica é uma das áreas em que devem ser feitos ajustes caso ela seja reeleita.

"Vai haver mudanças porque eu acho que o país se preparou para essas mudanças", disse a candidata ao jornal O Estado de S. Paulo.

A promessa é feita em meio a uma escalada de críticas à política econômica e em um ambiente de deterioração das relações do governo com setores empresariais.

Também é, em parte, uma resposta aos ataques da oposição, que tem explorado a desaceleração do crescimento e o fato de a inflação estar no teto da meta definido pelo Banco Central (BC) - de 4,5% com tolerância de 2 pontos percentuais para cima ou para baixo.

Analistas do mercado esperam um crescimento de apenas 0,27% este ano, e o governo também reduziu suas previsões de 1,8% para 0,9% no mês passado.

Mas, afinal, o que pode mudar na economia se o PT ganhar a votação do dia 26? Deve haver uma correção estrutural de rumos - ou apenas ajustes em uma ou outra área?

Mudança

Consultados pela BBC Brasil, tanto economistas críticos quanto alinhados ao governo disseram não apostar em um ajuste radical. E, até o momento, a única mudança confirmada parece dizer respeito à saída do titular da pasta da Fazenda.

Segundo a presidente, o atual ministro, Guido Mantega, não permanecerá no cargo por "razões pessoais". Mas há algum tempo Mantega vinha sendo alvo de críticas de um grupo cada vez maior de economistas, investidores e entidades empresariais - e a desaceleração da economia, em plena corrida eleitoral, aumentou a pressão por sua saída.

Acredita-se que dois outros nomes fortes da Fazenda também possam ser substituídos: o secretário do Tesouro, Arno Agustin, e o secretário de Política Econômica, Marcio Holland, que recentemente sugeriu que os brasileiros deveriam substituir o consumo de carnes por ovos e frango, o que colocou a presidente em uma saia justa.

"Jamais (daria esse conselho), porque acho que as pessoas têm direito de comer carne, ovo e frango", corrigiu Dilma.

Novo ministro

Entre os nomes cotados nas últimas semanas para substituir Mantega estão o ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda e atual professor da FGV, Nelson Barbosa, que deixou a pasta em 2013, após divergir sobre a condução da política econômica com o atual ministro.

Barbosa teria uma boa relação com a presidente e com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas tem negado que pretenda voltar ao governo.

Outro nome sobre o qual se tem especulado é Otaviano Canuto, secretário de Assuntos Institucionais do governo Lula e conselheiro senior e ex-vice presidente do Banco Mundial. Canuto, porém, disse à BBC Brasil não ter sido contactado sobre uma proposta nesse sentido.

"Soube disso (das especulações) pelos jornais. Enquanto funcionário do Banco Mundial, não comento questões políticas em qualquer de nossos países membros."

Há quem levante a possibilidade do atual ministro da Casa Civil, Aloísio Mercadante, assumir a Fazenda, já que ele é uma espécie de braço direito da presidente e costuma ser ouvido por ela em temas econômicos.

Outro que estaria sendo cotado é o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, que, apesar de ser associado à polêmica estratégia de criação de "campeões nacionais", tem bom trâmite entre empresários.

Em algum ponto também se chegou a especular sobre a substituição de Mantega pelo atual presidente do BC, Alexandre Tombini, embora hoje se considere mais provável que ele continue à frente da autoridade monetária.

"O ideal seria que a pasta fosse assumida por algum empresário ou alguém com bom trânsito entre setores empresarias para reforçar a interlocução nessa área", acredita Luiz Gonzaga Belluzzo, que foi conselheiro econômico de Lula e professor de Dilma.

"A presidente precisa de um anti-Armínio Fraga, alguém que não seja ligado ao mercado financeiro", completa, referindo-se ao ex-presidente do BC escolhido pelo candidato Aécio Neves para ser seu ministro da Fazenda caso seja eleito.

Políticas incertas

No caso dos rumos a serem tomados na condução da política econômica de um eventual segundo mandato de Dilma, as incertezas são ainda maiores.

A presidente chegou a falar vagamente em "diminuir alguns incentivos", mas sem dizer a que exatamente se referia.

Também prometeu uma "política duríssima para inflação", "como tivemos e teremos ainda mais", mas acrescentou que "não tem mágica para se fazer (nessa área)".

"Quero saber quais são as novas ideias de alguém para a inflação", disse.

Seja porque Dilma ainda não tem certeza sobre que ajustes devem ser feitos, seja porque não quer dar subsídios para ataques da oposição, o fato é que ela e sua campanha têm evitado falar em detalhes sobre as possíveis mudanças.

"Temos um cenário incomum, no qual é possível ter uma ideia mais clara sobre como pode ser a política econômica se a oposição ganhar do que se o governo ganhar", diz Carlos Melo, cientista político do Insper.

"Pesquisas de opinião mostraram que mais de 70% do eleitorado queria mudança, então o governo promete uma 'mudança com segurança', em oposição à 'mudança radical' da oposição - mas sem dizer o que isso quer dizer."

Para o economista André Biancarelli, da Unicamp, no caso de uma vitória de Dilma o ajuste deve ser feito apenas no modo como as políticas são implementadas, não em sua direção geral.

"O cenário do ano que vem deve ser o de uma política fiscal mais apertada, mas Dilma não vai poder fazer um ajuste duro e acho improvável qualquer mudança drástica no atual modelo econômico."

"Se eleita, a presidente deve tentar reconstruir os canais de diálogo com o setor privado para impulsionar os investimentos, que acabaram diminuindo também em função das incertezas eleitorais."

Belluzzo concorda. "Não dá para pensar em qualquer ajuste ortodoxo, porque esse é um modelo fracassado - é só olhar o que está ocorrendo na Europa", diz.

"A mudança deve ocorrer principalmente na forma de execução (das políticas na área econômica) para que possamos destravar os investimentos. O governo precisa ter uma melhor interlocução com o empresariado e precisa resolver problemas administrativos, de gestão, que parecem ter prejudicado o resultado de leilões e licitações. Não é sensato ficar mexendo na taxa de retorno, como eles fizeram."

Visão crítica

Mais crítica ao atual governo, a professora Lourdes Sola, da USP, acredita que o fato de Dilma ter uma grande influência sobre a condução da atual política econômica é o que faz com que uma mudança estrutural seja improvável.

Para ela, o modelo econômico do atual governo teve como eixo principal o estímulo à demanda - e há algum tempo estaria dando sinais de esgotamento.

"O Estado interveio na economia por meio de políticas como a expansão do crédito e o estímulo a criação de campeões nacionais. Os gastos aumentaram, mas os investimentos e a oferta não acompanharam essa expansão - e como resultado tivemos uma deterioração da questão fiscal e a inflação cresceu", diz.

"A questão é que até o ex-presidente Lula parecia ser mais pragmático: sabia que não entendia de economia e por isso delegava a questão. Já Dilma tem convicções ideológicas mais firmes nessa área, o que dificulta uma correção de rumos que restaure o crescimento", opina.