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A Grécia vai conseguir evitar a moratória?

Robert Peston

Editor de Economia da BBC News

22/06/2015 08h00

Parte do que torna tão difícil a negociação entre a Grécia e seus credores envolve o detalhamento dos cortes de gastos e as reformas econômicas defendidas pelos governos da zona do euro e do FMI (Fundo Monetário Internacional).

Todo o resto do imbróglio se deve à guerra monumental de expectativas sobre o escopo do que pode ser acordado até o dia 30 de junho, quando vence o prazo para a Grécia devolver 1,6 bilhão de euros (R$ 5,6 bilhões) de um empréstimo tomado junto ao FMI.

O que é claro tanto pelo que o ministro de finanças grego, Yanis Varoufakis, disse na noite de sexta-feira quanto pelo escreveu em seu blog é que ele ainda está tentando alcançar um acordo, que incluiria a reconstrução das dívidas do setor público da Grécia de forma a torná-las mais sustentáveis.

Varoufakis pede por um socorro do braço financeiro da zona do euro, o ESM, sobre os 27 bilhões de euros em empréstimos do BCE (Banco Central Europeu) à Grécia, porque a agenda de repagamento desses empréstimos (ou títulos) é outra tragédia batendo à porta do país.

Mas embora o ministro grego esteja correto ao tentar eliminar a ameaça de prováveis moratórias futuras, a zona do euro é institucionalmente incapaz de fazer isso na conjuntura atual. Falta ao bloco capacidade decisória, tamanha é a dispersão de poder entre os Estados-membros e seus respectivos Parlamentos.

Parte do comprometimento econômico e político da zona do euro é que não se pode mastigar chiclete e andar ao mesmo tempo. A Grécia precisa acordar para a inescapável e desapontadora realidade.

E se o governo da Grécia, liderado pelo premiê Alexis Tsipras, quer evitar a todo custo uma moratória, precisa se concentrar em dois pontos especialmente.

O primeiro é a falta de diálogo entre a Grécia e os credores sobre a escala de austeridade necessária até 2018 - que foi reduzida ao equivalente a apenas 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto ou a soma de todos os bens e serviços produzidos por um país) da Grécia em 2016.

O segundo é a exigência dos credores por cortes mais profundos nas pensões gregas.

Varoufakis defende que cortes significativos --em torno de 40% do total--  já foram impostos sobre os pensionistas gregos, e um corte maior seria devastador para muitas famílias gregas pobres, porque o alto nível de desemprego torna toda essa parcela da população dependente de ajuda dos avós.

Mas se esses cortes adicionais são social e politicamente impossíveis para o governo do Syriza (partido que governa a Grécia), Atenas precisa oferecer uma contraproposta financeira crível.

Porque o que ficou claro nas discussões de sexta-feira --depois do novo fracasso das negociações sobre um possível acordo-- era de que a zona do euro e o FMI estão abertos a propostas factíveis do governo grego sobre de onde Atenas pretende dinheiro para pagar o que deve no futuro.

Se o governo grego pudesse achar uma única medida simbólica, parece razoavelmente claro que um acordo pode ainda ser alcançado e os euros adicionais desesperadamente exigidos pela Grécia para evitar um calote sejam liberados.

Ou em outras palavras: Tsipras e Varoufakis precisam engolir o orgulho e ver os credores não como cães sedentos do capitalismo que querem atacar e humiliar a Grécia, mas como jovens vira-latas que se satisfariam apenas com alguns ossos.

Protestos

Neste domingo, líderes europeus intensificaram esforços para tentar alcançar um acordo sobre a crise da dívida grega, às vésperas de uma cúpula emergencial em Bruxelas, na Bélgica, sede do Parlamento europeu.

O presidente francês, François Hollande, alertou que "tudo tem de ser feito" para manter a Grécia dentro da zona do euro.

O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, ofereceu novas propostas numa tentativa de evitar o calote sobre um empréstimo de 1,6 bilhão de euros (R$ 5,6 bilhões) do FMI.

A Grécia tem de repagar o empréstimo até o final deste mês ou pode acabar abandonando a moeda única e, possivelmente, a União Europeia.

As negociações para um possível acordo não avançam há cinco meses, em meio à resistência da Comissão Europeia, o FMI e o BCE de liberar fundos emergenciais de 7,2 bilhões de euros (R$ 25,3 bilhões) até que o governo grego aceite implantar reformas econômicas exigidas pelos credores.

Na noite deste domingo (tarde no Brasil), milhares de manifestantes se reuniram na capital Atenas para demonstrar apoio ao governo de esquerda, que chegou ao poder com a promessa de lutar contra o pacote de austeridade fiscal imposto após a crise europeia de 2008.

Eles protestavam contra medidas de austeridade fiscal impostas pelos credores do país em dois pacotes de socorro financeiro anteriores, que resultaram em cortes em salários e pensões, além de um em cada quatro gregos desempregado.

Manifestações também foram registradas em Bruxelas e em Amsterdã (Holanda) em solidariedade ao povo grego.

'Benefício mútuo'

Tsipras deve se encontrar com lideranças dos três credores internacionais da Grécia nesta segunda-feira, antes da reunião com os líderes dos 18 países da zona do euro em Bruxelas, no mesmo dia.

Neste domingo, ele fez uma nova proposta sobre o pacote de reformas aos líderes da Alemanha, França e Comissão Europeia, no que foi visto como um sinal de o governo grego está disposto a fazer concessões.

As propostas, que Tsipras descreveu como "mutualmente benéficas", foram discutidas em um encontro emergencial do gabinete grego, mas ainda não foram reveladas ao grande público.

Em entrevista à BBC, Louka Katseli, presidente do Banco Nacional da Grécia, a maior instituição financeira do país, afirmou que seria "insano" não chegar a um acordo sobre a crise da dívida grega.

Ela destacou que enquanto os bancos não estão sob ameaça imediata de ficar sem dinheiro, a situação era séria e, sem um acordo, se tornaria "severa".

Em entrevista à BBC, a presidente do Banco Nacional da Grécia, Louka Katseli, afirmou que seria "insano" não chegar a um acordo sobre a crise da dívida grega

No entanto, Katseli disse acreditar ser pouco provável que a Grécia seja obrigada a abandonar a zona do euro já que o custo seria muito alto para os outros países do bloco da moeda única.

Enquanto isso, o BCE deve realizar um encontro paralelo também nesta segunda-feira para decidir se eleva o nível de financiamento emergencial para os bancos gregos, depois que a instituição aprovou um empréstimo de emergência na sexta-feira.

A decisão ocorre em meio a relatos de uma corrida bancária na Grécia, o que coloca ainda mais pressão sobre os bancos do país.

Os saques entre segunda-feira passada e sexta-feira atingiram cerca de 4,2 bilhões de euros (R$ 14,8 bilhões), representando 3% dos depósitos de pessoas físicas e jurídicas mantidos nos bancos gregos no final de abril.

Apesar disso, os bancos devem abrir normalmente nesta segunda-feira.