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Do gastador ao pão-duro, do prevenido ao atrasado: o perfil dos estrangeiros que vêm para os Jogos

Jefferson Puff - @_jeffersonpuff - Da BBC Brasil no Rio de Janeiro

29/07/2016 07h26

Alto poder aquisitivo, viajando em família, com passagens e hotéis reservados com antecedência e em sua maioria americanos, mas também europeus e asiáticos. Este é o perfil médio dos turistas estrangeiros que virão ao Rio de Janeiro para os Jogos Olímpicos, entre os dias 5 e 21 de agosto, segundo uma pesquisa do site internacional de viagens Kayak.

De acordo com o levantamento feito pelo site buscador de passagens, hotéis e aluguéis de carros presente em 40 países, e que processa mais de 1,5 bilhão de pesquisas anuais feitas em 20 idiomas pelo mundo, a profusão de notícias negativas em torno da Olimpíada, as crises econômica e política no Brasil, a epidemia de zika, os relatos da penúria do Estado do RJ e as más notícias em relação à segurança não espantaram os estrangeiros de virem ao megaevento.

"Existiu, sim, um receio muito grande por conta dos vários acontecimentos, mas nada que tivesse impedido as pessoas de reservarem sua vinda ao Rio. Não observamos diminuição no interesse em buscas pelo Rio de Janeiro para o período dos Jogos ao redor do mundo", diz Kaio Philipe, diretor do Kayak no Brasil.

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Para ele, sempre existe uma "especulação negativa" no período anterior a grandes eventos como Olimpíadas e Copa do Mundo, mas os turistas estrangeiros já "vêm preparados" para o que vão encontrar.

"Hoje em dia, com as avaliações de outros turistas em sites, fotos e sites de viagem online, as pessoas já sabem muito sobre os destinos antes mesmo de embarcarem. A maioria já está ciente dos pontos positivos e negativos", acrescenta.

A Embratur diz esperar entre 350 mil e 500 mil turistas (brasileiros e estrangeiros) no Rio de Janeiro durante os Jogos, e a expectativa é de que a movimentação injete US$ 1,7 bilhão (R$ 5,5 bilhões) na economia do país.

No levantamento do site Kayak ao qual à BBC Brasil teve acesso exclusivo, os americanos aparecem como o grupo que mais buscou por passagens aéreas para o Rio de Janeiro nas datas dos Jogos. Segundo a pesquisa, o resultado se deve à proximidade geográfica, ao interesse nas competições olímpicas e à grande oferta de voos diários entre os dois países.

Já os alemães foram os que reservaram viagens com a maior antecedência, já a partir de maio do ano passado, e os espanhóis foram os que mais deixaram para a última hora, reservando viagens três meses antes do evento. Os alemães também foram os que mais procuraram por promoções, seguidos dos italianos e franceses.

A pesquisa mostrou que os turistas da Áustria são os que mais virão em família, seguidos dos visitantes de Hong Kong e da Itália.

"Vimos que os estrangeiros também devem ficar no Rio de Janeiro por uma média de uma semana, enquanto os brasileiros devem permanecer por uma média de quatro dias. Na Copa também foi assim. Para quem vem de fora não compensa ficar menos do que isso, já para os brasileiros um fim de semana prolongado tende a caber mais no orçamento e no planejamento. Para o brasileiro, a tendência é vir, assistir aos jogos e voltar para casa", diz Philipe.

Primeira classe, voos diretos e celulares

A pesquisa indica que os suíços são os que mais buscaram por voos sem escala para o Aeroporto Internacional Tom Jobim (Galeão), seguidos dos irlandeses e americanos. Além disso, a Coreia do Sul ficou em primeiro no ranking dos países que mais pesquisaram por voos em primeira classe, seguidos de Suíça e Estados Unidos.

"Os brasileiros são mais inclinados a comprar passagens motivados pelo preço, seja com mais ou menos escalas. Já para nacionalidades de maior poder aquisitivo, como a Suíça, voos diretos tendem a ser mais procurados. No caso dos sul-coreanos, o poder aquisitivo e a distância, com viagens de de mais de 25 horas até o Rio, ajudam a explicar a preferência por bilhetes de primeira classe", diz Kaio Philipe.

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Já os turistas do Japão foram os que mais buscaram por viagens ao Rio em celulares, seguidos de Hong Kong e Coreia do Sul.

"Não dá para fugir do clichê. Os japoneses continuam sendo os mais fortes no uso de celulares e tecnologia, e estão entre os consumidores globais que mais fecham suas férias, compram passagens de longa distância e reservam hotéis nos dispositivos móveis, algo que está apenas começando no Brasil", acrescenta o diretor do Kayak.

Zika, segurança e ingressos

Com a profusão de notícias negativas sobre o Brasil e o Rio nos últimos meses, houve dúvidas sobre o interesse dos estrangeiros pelos Jogos.

No início de junho, após alertas dos EUA e da União Europeia de que mulheres grávidas deveriam evitar vir ao Brasil por conta da epidemia de zika e os possíveis efeitos sobre a gestação, sobretudo com respeito à microcefalia, a apresentadora da rede americana NBC Savannah Guthrie, grávida de seu segundo filho, desistiu de vir ao Rio, onde cobriria a cerimônia de abertura pela emissora.

Atletas importantes de esportes como golfe, tênis, ciclismo e basquete citaram o medo da zika como razão para desisitir de participar dos Jogos.

No final de maio, uma carta assinada por 150 especialistas de todo o mundo pediu à OMS (Organização Mundial da Saúde), que pressionasse o Rio para que a Olimpíada fosse "adiada ou transferida".

O pedido foi negado pela organização ligada às Nações Unidas e, dias depois, uma carta assinada por cientistas brasileiros dizia não fazer sentido adiar ou transferir os Jogos e que a incidência do vírus deveria ser pequena no período.

Em reportagem recente, a BBC Brasil identificou que até mesmo brasileiros desistiram de vir ao Rio de Janeiro por conta do noticiário negativo, sobretudo com relação aos altos custos, crise e os níveis de segurança.

Outro indicador sobre a perda de interesse no megaevento seria o aumento da devolução de ingressos nas últimas semanas relatado na mídia brasileira. Segundo o jornal O Globo, 50 mil entradas teriam sido devolvidas após o governador interino do Rio, Francisco Dornelles, decretar estado de calamidade pública no mês passado.

Já as declarações do prefeito Eduardo Paes à emissora CNN - ele classificou a segurança do Estado como "terrível" - teriam levado à devolução de mais 20 mil, de acordo com a Veja. Por sua vez, o jornal O Estado de S. Paulo noticiou que 40 mil ingressos teriam sido cancelados após a declaração de Paes.

Procurado pela BBC Brasil, o diretor de ingressos do Comitê Rio 2016, Donovan Ferreti, negou que dezenas de milhares de ingressos tivessem sido devolvidos e afirmou que houve aumento na procura.

"Nas últimas semanas, registramos aumento nas vendas, tanto entre brasileiros como entre turistas da América do Sul e de outras partes do mundo. A procura é crescente", disse.

Até o dia 20 de julho, a 15 dias do início dos Jogos, dos 6,1 milhões de ingressos disponibilizados para venda, 4,4 milhões tinham sido vendidos e 1,7 milhões continuavam à venda. Questionado sobre a chance de "ingressos encalhados" e "cadeiras vazias" nas arenas, o Comitê Rio 2016 diz que o balanço é positivo.

"Estamos com 93% da nossa meta de arrecadação atingida. Já arrecadamos R$ 978 milhões e a meta é R$ 1,045 bilhão", disse Ferreti. Ele explica que, dos 4,4 milhões de ingressos vendidos, 1,1 milhão foram comprados por estrangeiros (25% do total).

Hotéis e expectativas do setor

Consultada pela BBC Brasil, a Associação das Indústrias Brasileiras de Hotéis do Rio de Janeiro (ABIH-RJ), diz que a taxa média de ocupação dos hotéis na cidade para o período olímpico está atualmente em 92,51%, apesar dos problemas. Segundo a entidade, os hotéis 5 estrelas estão 100% lotados nos bairros da Barra da Tijuca, Ipanema, Leblon, e Centro. Em Copacabana e no Leme a taxa fica em 96%.

"Todos os holofotes estão voltados para o Rio. Somos uma vitrine e, naturalmente, as notícias negativas tomam maiores proporções. Não se faz um grande evento sem críticas, isso acontece em qualquer lugar do mundo", diz Alfredo Lopes, presidente da ABIH-RJ.

Para ele, no entanto, a taxa de reservas do setor mostra que o interesse se manteve.

"Nossa ocupação, porém, só reforça que a demanda para o período Olímpico está bastante aquecida e que o público continua prestigiando o evento. Nossos cinco estrelas estão praticamente lotados, assim como os empreendimentos hoteleiros situados no corredor turístico. Ampliamos nossa oferta de leitos, modernizamos nosso equipamento e investimentos no treinamento de nossas equipes. Nossa expectativa é de realizar um evento memorável", diz.

A Empresa do Turismo do Município do Rio de Janeiro (Riotur), comentou a pesquisa feita pelo site Kayak e indicou grandes expectativas com os Jogos.

"Independente do estilo do turista, se programou há tempos ou decidiu em cima da hora, se virá de primeira classe ou se irá hospedar-se em albergues, tenho certeza de que vão se encantar com as belezas cariocas e a receptividade do nosso povo, que irão encontrar material informativo de qualidade nos nossos postos, de grande utilidade para a locomoção até os atrativos e arenas, e que descobrirão uma cidade que se renovou completamente para recebê-los neste momento", disse em entrevista à BBC Brasil Antonio Pedro Figueira de Mello, secretário municipal de Turismo do Rio.

Os turistas, segundo a pesquisa*

- Preparação: organizando tudo o quanto antes

1º: Alemanha

2º: Reino Unido

3º: Holanda

- Espontaneidade: por que fazer hoje o que se pode fazer amanhã

1º: Espanha

2º: Canadá

3º: México

- Eficiência: voando apenas sem escalas

1º: Suíça

2º: Irlanda

3º: EUA

- Economia: quem mais procura promoções

1º: Alemanha

2º: Itália

3º: França

- Luxo: quem mais voa de primeira classe

1º: Coreia do Sul

2º: Suíça

3º: EUA

- Família: quem mais viaja em família

1º: Áustria

2º: Hong Kong

3º: Itália

- Celular: quem mais usa dispositivo móvel para buscar viagens

1º: Japão

2º: Hong Kong

3º: Coréia do Sul

*Levantamento foi feito em 40 países entre maio de 2015 e junho de 2016