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Desvalorização do bolívar no mercado negro da Venezuela afeta bonds

Sebastián Boyd

28/05/2015 12h58

(Bloomberg) - A queda livre do bolívar venezuelano está fazendo com que os traders de bonds se lembrem da capacidade que esse país tem de infligir perdas súbitas e dolorosas.

Seus bonds soberanos denominados em dólares perderam 4 por cento em maio, a pior queda nos mercados emergentes. Trata-se de um retrocesso em relação aos primeiros quatro meses do ano, quando os bonds tiveram o melhor desempenho.

A moeda do país afundou 21 por cento no mercado negro neste mês, pois a administração do presidente Nicolás Maduro está imprimindo mais bolívares para pagar os gastos orçamentários. Alguns analistas veem isso como um sinal inquietante de que a Venezuela está ficando sem dólares, necessários para pagar dívidas. Também poderia ser um sinal de que o país preferiria correr o risco de que surja uma hiperinflação do que desvalorizar sua taxa de câmbio oficial.

"Isso mostra uma clara escassez de dólares", disse Siobhan Morden, diretora de estratégia de renda fixa para a América Latina do Jefferies Group LLC, em entrevista de Nova York. "Isso está começando a se transformar em um círculo vicioso. A escassez de dólares gera inflação, o que está sendo mostrado pela taxa no mercado negro, e quando a crise piora, ela cria uma demanda maior por dólares. E ainda não há nenhum compromisso político para uma reforma econômica".

O preço do petróleo venezuelano caiu 50 por cento no segundo semestre do ano passado e deixou o país em dificuldades para encontrar dólares suficientes para pagar pela importação de itens básicos. O petróleo é responsável por mais de 95 por cento das exportações do país.

Reservas internacionais

As reservas internacionais da Venezuela caíram no dia 26 de maio para US$ 17,4 bilhões, o nível mais baixo em 11 anos, embora os preços do petróleo do país tenham se recuperado do menor valor registrado em seis anos, de US$ 38,80 por barril, em janeiro.

Estima-se que a inflação do país seja a maior do mundo, de mais de 100 por cento, segundo o Bank of America Corp. O governo não informou estatísticas oficiais sobre inflação desde dezembro.

A taxa primária de câmbio oficial da Venezuela é de 6,3 bolívares por dólar - menos de um quinquagésimo da taxa no mercado negro, de 351,92 bolívares por dólar.

Como o governo vende dólares muito baratos, e somente conforme normas estritas, ele não gera suficientes bolívares para cobrir os compromissos domésticos, segundo o Barclays Plc.

Analistas do banco estimam que o déficit do setor público venezuelano para 2015 poderia chegar a 30 por cento do PIB; dois terços desse déficit seriam cobertos com a impressão de dinheiro. Isso significa que a oferta de dinheiro poderia crescer quase três vezes neste ano, o que implica que a taxa de câmbio no mercado negro poderia cair para 600 bolívares por dólar.

Hiperinflação

Embora a Venezuela tenha apresentado em fevereiro um novo sistema cambial patrocinado pelo governo, que supostamente teria uma taxa de câmbio flutuante, analistas disseram que a taxa estabelecida, de 199,062 bolívares por dólar, não reflete a verdadeira oferta e demanda.

"É uma preocupação", disse Michael Discher-Remmlinger, gerente de recursos da Deka Group em Frankfurt. "As mudanças no regime cambial foram uma das poucas esperanças para os investidores de que ocorresse uma reforma no governo atual. Mas agora parece que não há suficiente oferta de moeda estrangeira para a demanda doméstica".

O que impede que os bonds venezuelanos caiam ainda mais? Os yields estão tão altos que, se o país não der calote, as recompensas serão generosas. Nos primeiros quatro meses deste ano, os bonds venezuelanos retornaram 24 por cento, a maior taxa nos mercados emergentes.

Contudo, há riscos. O Barclays modificou no dia 20 de maio sua perspectiva sobre os bonds, de neutro para overweight, mencionando a inércia do governo diante do choque sofrido pelo petróleo.

"Um grande colapso do bolívar não é uma boa notícia e é um sinal da enorme escassez de dólares e da enorme pressão inflacionária", disse Regis Chatellier, estrategista do Société Générale SA em Londres, em uma mensagem. A pressão inflacionária "acaba afetando a capacidade de pagar a dívida externa".

Título em inglês: 'Collapse of Venezuela's Black-Market Bolivar Spills Into Bonds'

Para entrar em contato com o repórter: Sebastián Boyd, em Santiago, sboyd9@bloomberg.net