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Para endividados, governo brasileiro tem uma saída: mais crédito

Francisco Marcelino

30/07/2015 14h49

(Bloomberg) -- A dívida das famílias brasileiras subiu para um nível recorde. O governo tem uma ideia para ajudar: crédito consignado.

A presidente Dilma Rousseff assinou um decreto neste mês que torna mais fácil o uso de crédito consignado para refinanciamento de cartões de crédito. Nos EUA, essas linhas de crédito ganharam má fama devido às tarifas altas e ao marketing duvidoso, mas no Brasil elas permitem que os tomadores de empréstimos consigam taxas de juros mais baixas em dois terços.

Isso não significa que o custo do dinheiro seja baixo -- pelo menos segundo os padrões internacionais.

Embora a dívida de famílias como porcentagem da renda ainda represente a metade da observada nos EUA, são as taxas de juros que estão preocupando analistas bancários e os órgãos de defesa do consumidor. Nos EUA, os cartões de crédito cobram em média cerca de 15% ao ano de juros. No Brasil -- onde o crédito formal ainda é um conceito relativamente novo para boa parte da população --, os consumidores pagam 85% pelos cartões e 27% pelos empréstimos consignados, diz o Banco Central.

"É muito crédito para pessoas que não possuem educação financeira e precisam pagar taxas de juros tão altas", disse Diógenes Donizete, coordenador do núcleo de tratamento do superendividamento do Procon, o órgão de proteção e defesa do consumidor, em São Paulo. Os empréstimos consignados são apenas mais um "excelente ingrediente para conseguir ainda mais pessoas superendividadas".

A presidente Dilma, em um decreto de 13 de julho, ratificou que as instituições que oferecem crédito consignado permitam que os tomadores utilizem linhas de crédito equivalentes a 35% da renda mensal, contra 30% anteriormente. A medida foi aprovada depois de um decreto, em setembro, ter ampliado o vencimento máximo dos empréstimos de 60 para 72 meses.

Dívida pesada

O aumento daquilo que para muitos é um último recurso em termos de linha de crédito ressalta como as dívidas ficaram pesadas para muitos brasileiros. Com o aumento do desemprego e a escalada das taxas de juros, a dívida crescente das famílias ameaça piorar a crise de uma economia que já caminha para a pior recessão em 25 anos.

"Os salários dos trabalhadores estão caindo e a inflação está subindo e, ao mesmo tempo, menos pessoas têm emprego", disse Rodrigo Melo, economista-chefe da Icatu Vanguarda Administração de Recursos. "O estoque de crédito vai crescer só pelo efeito da alta dos juros, que continuam subindo."

Crédito consignado

Entre os bancos brasileiros, geralmente o consignado é visto uma das linhas de crédito de menor risco, pois os pagamentos são descontados diretamente da folha de pagamento do tomador do empréstimo, disse Gilberto Tonello, analista do Grupo Bursátil Mexicano.

O Banco Bradesco SA, segundo maior banco da América Latina em valor de mercado, disse nesta quinta-feira que as provisões para empréstimos inadimplentes subiram 13% no segundo trimestre em relação a um ano antes e que as dívidas atrasadas em 90 dias ou mais subiram 0,2 ponto porcentual, para 3,7%. O lucro ajustado ultrapassou as estimativas de margens mais amplas para empréstimos. O Bradesco é o primeiro banco brasileiro a informar seus resultados.

A dívida de famílias no Brasil como porcentagem da renda disponível inchou para 46,3% em abril, nível mais alto ao menos desde 2005, ano em que o BC começou a monitorar os dados. A dívida dos tomadores nos EUA caiu para 102,1%, a mais baixa em 13 anos, segundo dados compilados pela Bloomberg.

Além das altas taxas de juros, existe outra diferença fundamental que torna a dívida do Brasil mais preocupante: a qualidade dos empréstimos. Enquanto 70% dos empréstimos familiares americanos são hipotecas, no Brasil esse porcentual é de 32%. E pedir recuperação judicial para sair de uma dívida esmagadora não é uma opção -- essa alternativa não existe para pessoa física no Brasil.