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Após iranianos e cubanos, Obama agora joga charme para a Venezuela

Nicole Gaouette

03/08/2015 12h08

(Bloomberg) -- A campanha de sedução do governo Obama em estados hostis passou por Myanmar, Irã e Cuba. Próxima parada: Venezuela.

Poucos meses depois de declarar que a Venezuela é uma ameaça à segurança nacional dos EUA, o governo americano está trabalhando para melhorar as relações com o país, impulsionado pelo temor de que a convulsão local possa desestabilizar a região.

Altos funcionários do Departamento de Estado vêm se reunindo discretamente com funcionários do governo de esquerda do presidente Nicolás Maduro desde abril para desenvolver o que o secretário de Estado americano, John Kerry, chamou de "um relacionamento normal".

O processo é um novo teste à promessa inaugural do presidente Barack Obama, de 2009, de "estender uma mão" a regimes repressivos e corruptos se eles estiverem "dispostos a abrir" seus punhos.

A queda dos preços do petróleo, as reservas estrangeiras cada vez menores, a taxa de inflação de 68,5% e as crescentes tensões políticas estão bombardeando a Venezuela. Há tanto em jogo que nem mesmo uma investigação do Departamento de Justiça sobre os supostos laços da liderança venezuelana com o tráfico de drogas foi capaz de descarrilhar a diplomacia das negociações.

"Os EUA têm um objetivo mais amplo no país, independentemente do que pensam sobre o governo venezuelano", disse Christopher Sabatini, professor de estudos latino-americanos da Universidade de Columbia, em Nova York. "O objetivo é evitar que um buraco negro sugue outras economias latino-americanas".

Um crítico frequente da política externa do governo americano fez um elogio cauteloso ao esforço. "Estou muito contente que o governo esteja tentando negociar com eles" temas como a repressão política e a realização de eleições justas em dezembro, disse o senador Bob Corker, o republicano do Tennessee que lidera a Comissão de Relações Exteriores do Senado americano.

Além da hiperinflação que sobrecarrega os cidadãos comuns e prejudica a capacidade de investimento do governo, as reservas internacionais do país atingiram em 27 de julho o menor patamar em 12 anos, US$ 15,37 bilhões, segundo dados compilados pela Bloomberg. A cesta de petróleo e derivados do país, uma grande fonte nacional de receitas, caiu 4,2% na semana passada, para US$ 45,87 por barril, segundo o site do Ministério do Petróleo. Há um ano, cada barril de petróleo rendia à Venezuela cerca de US$ 96.

'Medo de contágio'

A Venezuela e sua empresa petrolífera estatal têm cerca de US$ 5 bilhões em pagamentos de bonds que vencerão nos últimos três meses deste ano e cerca de US$ 10 bilhões em 2016, segundo estimativas do Bank of America Corp.

O professor de Harvard Ricardo Hausmann diz que a Venezuela não terá outra escolha a não ser dar o calote em sua dívida no ano que vem, em meio à escassez de produtos básicos, como medicamentos e leite.

"Um dos medos é o de contágio", disse Carl Meacham, diretor do programa para as Américas do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, em Washington. Com as maiores reservas de petróleo comprovadas do mundo, a Venezuela tem exercido influência regional, oferecendo energia barata e subsídios a seus vizinhos.

Parceiro comercial

Existem, também, considerações estratégicas. Os EUA são o maior parceiro comercial da Venezuela, o país sul-americano atualmente tem um voto no Conselho de Segurança das Nações Unidas como um dos 10 membros não-permanentes e se aliou a Cuba e a outros países hostis aos EUA, tendo enviado petróleo ao regime da Síria apesar das sanções, em 2012, e concordado, no ano passado, em permitir que a Rússia estabelecesse bases navais e militares em suas fronteiras.

Os EUA "querem que a Venezuela relaxe suas posições internacionais em relação a países como Irã, Rússia, Síria e Grécia", disse Carlos Romero, professor de Relações Internacionais da Universidade Central da Venezuela.

"Existe um senso real de que a relação EUA-América Latina vinha sendo um pouco distante e agora tem novas possibilidades", disse Harold Trinkunas, diretor da Iniciativa América Latina da Brookings Institution. "A única coisa que poderia arruinar isso é a situação da Venezuela, por isso o governo dos EUA está buscando formas de administrar isso".