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Análise: impeachment dificulta ajuste fiscal e BC deve manter juros em 14,25% até 2017

David Biller

09/12/2015 11h37Atualizada em 09/12/2015 12h32

(Bloomberg) -- A difícil tarefa de domar a inflação no Brasil está prestes a recair diretamente sobre o Banco Central.

Esta é a conclusão a que chegaram os economistas depois que o deputado Eduardo Cunha iniciou um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff na semana passada, uma decisão que está ameaçando paralisar as medidas de ajuste fiscal pensadas, em parte, para combater o maior aumento nos preços em 12 anos.

A autoridade monetária manterá a taxa básica de juros do Brasil em 14,25%, o nível mais alto em nove anos, até 2017, mostrou uma pesquisa do BC com analistas divulgada na segunda-feira. Há apenas uma semana eles previam que o banco reduziria os custos dos empréstimos em outubro.

Embora os traders não vejam perspectiva de redução das taxas, analistas do Standard Chartered e da MCM projetavam até a semana passada que a recessão mais longa desde a Grande Depressão forçaria o BC a fazer exatamente isso.

Mas como o esforço para derrubar Dilma poderá deixar o governo em segundo plano durante meses, as autoridades do BC terão que ficar com o encargo de trazer para baixo uma taxa de inflação que superou os 10% em novembro, disse Luciano Rostagno, estrategista- chefe do Banco Mizuho do Brasil.

"O Congresso provavelmente focará no debate do impeachment e não no debate fiscal", disse ele por telefone, de São Paulo.

O BC preferiu não comentar se o processo de impeachment afetaria as políticas de austeridade e se precisará elevar os juros para conter a inflação. O Ministério da Fazenda não respondeu a um e-mail e a um telefonema com pedidos de comentário sobre se a perspectiva para a aprovação dessas medidas mudou.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, disse em 2 de dezembro que aceitou um pedido de impeachment contra Dilma, desencadeando procedimentos que poderão levar meses e envolver diversas votações no Congresso. O pedido acusa Dilma de violar a lei de responsabilidade fiscal do Brasil em 2014 e 2015, incluindo a adulteração das contas públicas. Diz também que a campanha dela recebeu recursos decorrentes de atividades fraudulentas.

Dilma, que iniciou seu segundo mandato em janeiro, negou qualquer irregularidade.

O processo de impeachment torna a aprovação da CPMF -- a medida de ajuste mais significativa do governo no momento -- ainda menos provável, disse João Augusto de Castro Neves, diretor da consultoria de risco político Eurasia Group para a América Latina.

"Necessitamos alguma clareza a respeito do impeachment antes que novas e mais ambiciosas medidas de ajuste fiscal sejam levadas adiante", disse ele por telefone, de Washington.

Piora das finanças

O governo argumenta que políticas de aperto de cinto são necessárias para conter a piora das finanças do país. O deficit orçamentário do Brasil atualmente é equivalente a um recorde de 9,5% do PIB.

Contudo, as taxas mais elevadas viriam no pior momento possível para a maior economia da América Latina. O PIB do Brasil encolherá 3,5% neste ano e 2,3% em 2016, segundo a estimativa média de cerca de 100 economistas consultados pelo BC. Esta seria a retração mais aguda em um período de dois anos desde 1901, pelo menos, segundo o instituto de pesquisa econômica do governo, o Ipea.

Expectativa de corte

Com a perspectiva de que as taxas mais elevadas poderiam prejudicar ainda mais a economia, analistas de bancos como Barclays e Bank of America estão mantendo suas posições de que as autoridades do BC cortarão os juros no ano que vem.

"O crescimento será bastante fraco, o que gerará algum tipo de desaceleração da inflação", disse David Beker, economista- chefe para o Brasil e estrategista de renda fixa do Bank of America, por telefone.

Em seu comunicado, o Comitê de Política Monetária do BC, liderado pelo presidente Alexandre Tombini, disse que os crescentes riscos políticos e econômicos ameaçam manter a inflação acima da meta de 4,5% do banco por mais tempo do que o esperado.

Mais tarde naquele mesmo dia, o diretor do BC Tony Volpon disse que a autoridade monetária precisava agir e responder "de forma contundente e tempestiva" para retomar o processo de ancoragem das expectativas de inflação. Ele foi um dos dois diretores do BC que votaram pelo aumento da taxa na primeira decisão não unânime do Banco Central em mais de um ano.

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Edson Fachin, suspendeu por uma semana a instalação de uma comissão formada para avaliar o processo de impeachment. A decisão foi tomada após uma derrota do governo na votação para seleção dos membros da comissão.