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Banco suíço escondeu bens de judeus na guerra; recentemente, ajudou sonegadores

Ruben Sprich/Reuters
Imagem: Ruben Sprich/Reuters

David Voreacos

16/12/2015 16h10Atualizada em 17/12/2015 20h28

(Bloomberg) -- O Dreyfus Sons operou durante dois séculos como um banco privado suíço, atendendo clientes judeus que queriam esconder seus bens dos nazistas durante os anos 1930 e a 2ª Guerra Mundial.

Mais recentemente, a empresa ajudou clientes dos EUA a esconder bens do Serviço Interno de Receita (IRS, na sigla em inglês), a receita federal do país, ocultando seus verdadeiros donos com entidades offshore (em paraísos fiscais) e armazenando ouro e dinheiro vivo em uma área separada de seus cofres.

A informação consta de um acordo, divulgado na terça-feira, entre a empresa e o Departamento de Justiça americano para não ir a julgamento.

O Dreyfus evitou um julgamento nos EUA ao concordar em pagar US$ 24,2 milhões e admitir que "não implementou controles suficientemente estritos" para garantir que seus clientes americanos pagassem os impostos, diz o acordo.

George Clarke, advogado do Dreyfus, preferiu não comentar sobre o acordo.

Os EUA anunciaram outros dois pactos na terça-feira com a unidade suíça do Crédit Agricole, que concordou em pagar US$ 99,2 milhões (o segundo maior pagamento, depois dos US$ 211 milhões pagos pelo BSI), e com o Baumann, que desembolsará US$ 7,7 milhões.

Alexandre Barat, porta-voz do Crédit Agricole, preferiu não comentar sobre o pacto do banco. Keith Krakaur, advogado do Baumann, não respondeu imediatamente a um telefonema.

Corrida do ouro

No total, 64 bancos suíços concordaram em pagar quase US$ 742 milhões em multas neste ano como parte de um programa do Departamento de Justiça que os poupa de responsabilidade criminal nos EUA se eles revelarem suas irregularidades.

Para reduzir as multas, eles estimularam milhares de clientes americanos a revelarem as contas escondidas ao IRS.

Embora muitos dos outros acordos expliquem táticas suíças clássicas, como as contas numeradas e as chamadas empresas prontas, que são usadas para ajudar os clientes a enganarem o IRS, nenhum deles detalha o uso de estoques de ouro como o pacto do Dreyfus.

Há duas décadas, o Dreyfus fechou um acordo para custodiar ouro e dinheiro mantidos por uma entidade das Ilhas Virgens Britânicas com sede na Suíça --315 contas avaliadas em US$ 440 milhões, no total.

Algumas dessas contas deveriam ter sido reveladas para o IRS e não foram, até que os clientes se anteciparam e contaram à agência fiscal a respeito delas para evitar ir a julgamento, segundo o comunicado do banco a respeito da composição do acordo.

"Embora parte da base de clientes com ouro e dinheiro tenha mantido suas contas devido aos temores relacionados ao colapso do sistema bancário", outros "mostram fortes indícios de ocultamento de bens", diz o acordo.

A entidade das Ilhas Virgens Britânicas tinha uma conta no banco e clientes americanos mantinham subcontas, segundo o pacto. As subcontas muitas vezes eram mantidas em nome de fideicomissos, fundações ou corporações do exterior.

Ativos de judeus

O Dreyfus foi fundado em 1813 na Basileia por um imigrante judeu da França. O banco cresceu e alcançou a marca de 7.000 contas avaliadas em 18 bilhões de francos suíços (US$ 18,2 bilhões) em 2013, diz o acordo. Dessas, 855 eram contas americanas avaliadas em US$ 1,76 bilhão.

Parte dessas contas era mantida em nome de corporações panamenhas, uma prática que começou após a 2ª Guerra Mundial porque os clientes judeus queriam "proteger seus bens por motivos de segurança pessoal", embora também os escondessem dos governos, segundo o pacto.

Das contas americanas, 33 eram mantidas em nome de entidades panamenhas e funcionários do banco atuavam como diretores da maioria delas.

Uma dessas contas disfarçou cheques semanais de US$ 3.900 a US$ 4.100 para uma mulher americana ou para parentes dela entre 1998 e 2013. De outra conta, aberta com US$ 1 milhão, um total avaliado em US$ 925 mil em cheques semanais foi enviado para um homem americano e para seus três filhos, segundo o comunicado.

Os outros clientes usaram um total de 34 entidades offshore em Liechtenstein, na Ilha de Man, na Libéria, nas Bahamas, em Nevis e nas Ilhas Maurício.

'Falta de sinceridade'

Após 2008, quando os EUA iniciaram uma investigação criminal ao UBS Group, o maior banco da Suíça, outras firmas suíças começaram a fechar contas americanas por causa do risco de serem implicadas na sonegação fiscal de seus clientes.

O processo de saída do Dreyfus "definhou" até 2012, quando um gerente nascido nos EUA foi nomeado para supervisionar a operação.

O Dreyfus mostrou uma "falta de sinceridade deliberada" ao não dizer ao Departamento de Justiça que o gerente possuía cinco contas avaliadas em US$ 1 milhão não declaradas ao IRS, segundo o acordo. O Dreyfus também não contou nada ao Departamento de Justiça antes de o gerente voluntariamente revelar suas contas ao IRS, o que lhe deu a chance de "regularizar discretamente seus assuntos tributários nos EUA".

O banco tentou usar sua divulgação, entre outros fatores, para reduzir sua pena. Quando o Departamento de Justiça recusou a proposta, a instituição retirou o pedido.