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Brexit duro sempre foi caminho escolhido por May

Mark Gilbert

16/01/2017 16h09

(Bloomberg) -- Em fevereiro de 2015, economistas do HSBC em Londres cunharam os termos Brexit "duro" e "suave". O segundo manteria "muito do status quo" se o Reino Unido votasse pela saída da União Europeia; o primeiro implicava um "enorme risco e seria operacionalmente complicado". Mesmo logo depois do referendo do Brexit qualquer um poderia ser perdoado por considerar improvável a opção dura. Mas não hoje.

A libra ficou abaixo de US$ 1,20, atingindo um novo mínimo para os últimos três meses, depois que o jornal Sunday Times publicou neste fim de semana que a primeira-ministra Theresa May dará prioridade ao controle da imigração em detrimento dos acordos comerciais nas negociações do Brexit. Eu considero essa reação surpreendente; os ministros do governo sempre se mostraram notavelmente unidos desde o referendo de junho em relação à necessidade de priorizar o controle da imigração, independentemente do preço.

Uma capa recente da revista Economist a castigou com o título "Theresa Maybe, Britain's Indecisive Premier" ("Theresa Talvez, a indecisa premiê britânica"). Aquilo me pareceu excessivamente duro; até o momento, nada que tenha vindo da primeira-ministra deu evidências de indecisão. May manteve a promessa de não fazer relatórios sobre os planos de saída. Como resultado, tem saído muito poucos e preciosos detalhes para tranquilizar os líderes empresariais, os banqueiros e os 48 por cento dos britânicos que queriam permanecer na UE.

Mas eles não precisam procurar muito para ver o destino dessa trajetória: sempre, desde seu intransigente discurso de outubro na conferência anual do Partido Conservador, May foi patente quanto a suas prioridades. Nada na postura do governo indicou outra coisa além de uma saída dura.

É claro que uma indireta não é o mesmo que uma declaração de intenção direta. Uma aparição recente diante de um painel de colegas políticos foi uma aula magna de obscurecimento. "Brexit significa Brexit" e "queremos um Brexit vermelho, branco e azul" são grandes frases de efeito, mas não exatamente um roteiro sobre como May imagina o Reino Unido pós-UE.

Por isso, no discurso dela programado para amanhã, a primeira-ministra precisa encontrar um meio-termo entre não entregar uma munição valiosa para seus adversários na negociação e informar ao povo britânico quais serão suas prioridades nas discussões.

Será que ela realmente planeja abandonar o acesso ao mercado único da UE e no lugar buscar acordos comerciais com países como Nova Zelândia? Será que o Reino Unido abandonará a união aduaneira? Será que seu aparente desdém pelo setor bancário significa que ela não tentará manter o sistema de passaportes que permite que 5.500 empresas financeiras com sede no Reino Unido vendam serviços em todo o bloco? Sobre este último ponto, especificamente, quanto mais tempo demorar para apresentar clareza, maior a probabilidade de as empresas se mudarem antecipadamente e transferirem empregos e investimentos para fora do Reino Unido.

Especificidade é algo que vem com riscos. Vale lembrar que May é uma líder não eleita, tanto no país quanto em seu próprio partido (embora tenha sido escolhida pelos parlamentares do Partido Conservador, o Parlamento como um todo nunca votou). Atualmente ela é popular, muito mais que a oposição e que qualquer outro líder político. Mas, na política, popularidade é algo que pode ser destruído rapidamente e o partido de May tem um longo histórico de lutas internas relacionadas à Europa -- basta lembrar de John Major chamando sua facção anti-UE de "bastardos" em 1993, quando era primeiro-ministro. O partido poderia acabar dividido novamente.

No discurso de amanhã, May precisará refutar categoricamente a acusação de que tem um "raciocínio confuso", feita pelo embaixador de saída para a UE, Sir Ivan Rogers, no início do mês. O eleitorado dela e o restante da UE merecem algo melhor do que os vagos e genéricos pronunciamentos feitos até agora -- mesmo que isso signifique detalhar uma postura linha-dura que preocupe aqueles que temem as consequências econômicas de um divórcio hostil.

Essa coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial nem da Bloomberg LP e de seus proprietários.