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Colheita chuvosa causa prejuízo a produtores de soja

Tatiana Freitas

22/02/2017 14h12

(Bloomberg) -- Tanta água caiu sobre as lavouras de Mato Grosso, o maior estado produtor de soja do Brasil, que tornou-se difícil andar entre as plantas marrons prontas para a colheita. Retirar a produção do campo foi quase impossível.

Uma semana de chuva constante fez com que os grãos de soja fermentassem e inchassem dentro das vagens, que se abriram porque as oleaginosas também começaram a germinar. O dano à qualidade dos grãos em partes do Estado foi tão significativo que alguns produtores visitados durante o Rally da Safra, uma expedição anual por lavouras organizada pela consultoria Agroconsult, disseram que só receberão cerca de um terço do que ganhariam se a temporada tivesse sido normal.

Mato Grosso enfrenta a colheita mais chuvosa em pelo menos cinco anos, o que também abriu espaço para ervas daninhas e percevejos, dificultou a colheita e poderá elevar os custos de transporte. 

Embora ainda seja possível misturar os grãos "ardidos", como os produtores chamam, a outros não danificados, os processadores e exportadores de soja estão pagando menos aos produtores devido à perda de qualidade. Trata-se de mais um obstáculo para os produtores brasileiros, que já enfrentam queda nos preços da commodity, a valorização cambial e uma recessão no país.

Ricardo Arioli, da Agropecuária Novocampo, plantou 2.225 hectares de soja no município de Campo Novo do Parecis. Ele forneceu 480 toneladas a uma trading que vai transformar os grãos em ração animal ou exportá-los. Sua produção foi tão prejudicada que ele recebeu pagamento por apenas 372 toneladas do total entregue. A colheita em sua fazenda foi interrompida durante oito dias consecutivos por causa das chuvas, o que atrasou a coleta em 400 hectares que já estavam maduros.

Produção perdida

"Uma parte significativa da produção já está perdida", disse Arioli, em uma entrevista durante a expedição pelas lavouras, na semana passada.

A viagem mostrou que essa história se repete em outras lavouras de Mato Grosso. Dezesseis participantes, incluindo agrônomos, executivos de bancos e representantes de empresas, percorreram 10.000 quilômetros pelo estado. O grupo se dividiu em duas rotas: uma pelas regiões no oeste e no centro do estado, a outra pelo centro e por partes do norte. Foi a 14ª expedição anual organizada pela Agroconsult.

Embora chuvas abundantes sejam necessárias durante a etapa de desenvolvimento da soja, o excesso pode provocar problemas de qualidade, como a fermentação e a germinação. As comercializadoras, que compram a soja para processá-la ou exportá-la, aplicam descontos no peso total das entregas quando o percentual de grãos danificados, ou "ardidos", ultrapassam 8 por cento da carga e o nível de umidade excede 14 por cento.

Silvesio Oliveira, produtor no município vizinho de Tapurah, disse os descontos em uma de suas cargas foram tão altos que ele recebeu apenas um terço do total entregue a uma trading na região.

"As chuvas vão prejudicar os lucros dos produtores por causa dos descontos aplicados, mas terão impactos mínimos no volume da safra, já que os grãos ardidos ainda podem ser utilizados pelas tradings", disse Valmir Assarice, analista da Agroconsult, em entrevista no dia 17 de fevereiro, após conduzir a expedição da companhia pelas lavouras durante quatro dias.

Ele estima que a produção de soja em Mato Grosso ficará entre 30 milhões e 31 milhões de toneladas. A safra brasileira deve superar 105 milhões de toneladas.

O excesso de chuvas também pode aumentar os gastos com transporte. Os produtores normalmente pagam o frete das fazendas até os armazéns das tradings, um caminho que muitas vezes não é pavimentado. A lama pode atolar os caminhões, aumentando os preços de frete.

Além disso, o tempo de espera dos caminhões para entregar a soja às tradings se tornou maior devido ao processo de secagem dos grãos nos armazéns, que se tornou mais longo em razão do alto grau de umidade.

Segundo dados do Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia Aplicada), o preço do frete de Sorriso, um dos municípios de Mato Grosso, a Santos, em São Paulo, aumentou cerca de 50% desde o início deste ano em meio às más condições das estradas e ao aumento da demanda por transporte.