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Trump despreza visão de mundo do FMI, liderado pelos EUA

Andrew Mayeda

22/02/2017 14h27

(Bloomberg) -- Christine Lagarde está viajando por Uganda em um SUV preto. A estrada está esburacada -- e essa não é a única dificuldade que a diretora do FMI deverá encontrar na era do presidente Donald Trump.

Desde a Segunda Guerra Mundial, os EUA estabelecem a agenda da economia mundial. O Fundo Monetário Internacional (FMI) tem sido uma das principais ferramentas do país. O fundo ajudou a estabilizar as finanças da Europa arrasada pela guerra, introduziu o dólar como moeda internacional e fortaleceu aliados dos EUA, como o Reino Unido e a Coreia. E, acima de tudo, promoveu o consenso de Washington, baseado na livre circulação de capital e produtos. Podemos chamar isso de globalização.

Tudo isso, agora, pode estar sendo invertido. Trump assumiu a presidência dos EUA atacando a perda de empregos industriais e da riqueza dos americanos, colocando a culpa no comércio exterior e questionando a finalidade de instituições criadas no pós-guerra, como a Otan e a União Europeia. Ele não é o único líder ocidental a ter ganhado votos atacando as elites e seus projetos globais. Enquanto isso, a China, a potência econômica em ascensão do mundo, constrói seu próprio sistema para ampliar sua influência por meio do crédito. Com tudo isso, em que posição está o FMI?

Exatamente naquela em que sempre esteve, segundo Lagarde. "Precisamos continuar com nosso trabalho e cumprir aquela que era a nossa missão", disse ela, em entrevista a caminho do palácio presidencial de Uganda, no mês passado. Ela atribui a desaceleração do comércio mundial à fragilidade econômica -- "quando você cresce menos, você tende a ser um pouco mais protecionista em relação a seu território" -- e afirma que ambas as coisas podem acabar sendo temporárias.

Lagarde rejeita a ideia de que o FMI poderia acabar tendo objetivos opostos ao do novo governo dos EUA. "Somos um agente de estabilidade financeira de qualquer país em que operamos", disse ela. "Uma potência como os Estados Unidos tem interesse na prosperidade econômica, na estabilidade e na paz."

Como chegar lá?

Quase todos gostam dessas coisas; é a forma de chegar a elas que provoca discussões. Em relação a isso, há sinais de que os EUA e o FMI estão divergindo.

"Precisamos proteger nossas fronteiras dos estragos gerados pelo fato de outros países estarem fabricando nossos produtos, roubando nossas empresas e destruindo nossos empregos", disse Trump, em um discurso de posse muito distante da visão de mundo do FMI. "A proteção levará a uma grande prosperidade e à força."

Agora, levemos em conta onde e por que o FMI concedeu seus maiores empréstimos nos últimos tempos. Para a Grécia, com a meta de manter a União Europeia intacta; Trump diz que ficaria feliz com a desintegração do bloco. Para a Ucrânia, para ajudar a manter um incipiente regime anti-Rússia; Trump quer boas relações com a Rússia.

Em linhas gerais, o fundo canaliza o dinheiro dos países ricos para os pobres, muitas vezes exigindo austeridade e políticas orientadas às exportações em troca. Trump afirma que deixará de usar os recursos dos EUA para enriquecer os demais, que não tem interesse em impor o modelo dos EUA e que quer menos importações.

"A manifestação extrema do trumpismo é diametralmente oposta aos princípios fundacionais do FMI", disse James Boughton, que atuou como historiador oficial do FMI durante duas décadas até 2012. O fundo "terá que jogar um jogo muito delicado".