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Análise: Nissan ficará bem sem Ghosn na direção

David Fickling

23/02/2017 12h14Atualizada em 23/02/2017 15h15

(Bloomberg) -- Será que a sexta maior fabricante de veículos do mundo é capaz de sobreviver sem seu salvador no comando?

A Nissan Motor, que tem Carlos Ghosn como presidente do conselho, CEO e presidente executivo durante a maior parte do período desde que a Renault a tirou da beira do colapso, em 1999, terá que se virar contando menos com ele.

Ghosn manterá a presidência do conselho, mas Hiroto Saikawa --ex-chefe de compras que trabalha na Nissan desde os anos 1970 e que atuou muitas vezes como adjunto dele-- assumirá os cargos de CEO e presidente. Os investidores não ficaram felizes, o que derrubou as ações em 1%.

Eles deveriam relaxar. Se tem uma coisa que fica clara na volumosa literatura sobre os segredos de gestão de Carlos Ghosn é que ele sempre se sentiu à vontade para delegar. Todas as decisões importantes dele na Nissan são tomadas durante a semana que ele passa em Tóquio, disse ele à publicação "Harvard Business Review", em outubro passado. Quando seu voo decola, a Nissan fica longe da vista e da mente, a julgar pelos comentários feitos em entrevista em 2014 ao LinkedIn:

"Quando estou em Paris, tomo decisões para a Renault. E quando estou na Rússia, tomo decisões para a AvtoVAZ. Eu não misturo as diferentes responsabilidades simplesmente porque quero garantir que as diferentes equipes que estão no comando se sintam responsáveis e que não haja confusão entre as diferentes empresas."

Saikawa é tudo, menos um novato. Ele cresceu sob o comando de Ghosn como gerente das operações de compras da fabricante, um dos trabalhos mais difíceis do setor no início dos anos 2000, quando o rompimento da relação de codependência da Nissan com sua cadeia de abastecimento era uma das principais responsabilidades.

Desde então, ele ocupou vários cargos importantes na companhia: há menos de 10 anos Saikawa assumiu a direção das operações norte-americanas da Nissan, sua maior unidade, que estava a cargo de Ghosn, e foi nomeado co-CEO da empresa como um todo em outubro.

Ghosn também tem coisas mais importantes a fazer. Como presidente do conselho da Mitsubishi Motors, ele precisa controlar o negócio e integrá-lo à Renault e à Nissan, em particular em áreas como a de conhecimento em veículos híbridos plug-in.

A Renault-Nissan-Mitsubishi é, agora, a maior fabricante de carros elétricos do mundo, mas depois do sucesso inicial com o Nissan Leaf vem perdendo força ultimamente diante de uma concorrência mais dura.

Como qualquer imperador poderoso, Ghosn também precisa pensar um pouco em sua sucessão. Entre os executivos das grandes empresas automotivas, apenas o CEO da Daimler, Dieter Zetsche, e o presidente do conselho da Ford Motor, Bill Ford, estão no comando há mais de uma década. Uma Renault-Nissan-Mitsubishi despedaçada após a aposentadoria de seu chefe não serve para ninguém.

"Eu me tornei CEO aos 45 e trabalhava como um animal", disse Ghosn, em entrevista à McKinsey em 2012. "Você não consegue fazer isso com 60 ou 65 anos." Ele vai fazer 63 no mês que vem.

A Nissan não é o que se pode chamar de empresa glamorosa. Devido às expectativas positivas dos investidores sobre a Tesla, a fabricante de veículos de Palo Alto, nos EUA, atualmente vale mais do que sua contraparte de Yokohama, no Japão, apesar do fato de sua produção anual ser equivalente a cerca de cinco dias de produção da Nissan. Mas a confiabilidade chata, tanto em negócios quanto em automóveis, tem suas virtudes --e a Nissan tem bastante disso.

O fim da cultura hierárquica da velha Nissan é algo normalmente visto como um dos segredos do renascimento da companhia. A empresa deverá se sair bem agora sem seu comandante franco-brasileiro.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião da Bloomberg LP e de seus proprietários.