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Quando o executivo é seu maior inimigo

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Imagem: Getty Images

Cris Olivette

12/06/2017 16h26

Casos de líderes que entram em decadência não se restringem aos que cometem algum tipo de crime. Há profissionais de sucesso que simplesmente perderam o controle da gestão dos negócios que comandavam ao caírem na armadilha do poder.

"Há diversos exemplos de líderes bem-sucedidos que perderam a linha. Olli-Pekka Kallasvuo, então CEO da Nokia, comandou a empresa no período em que ela passou de líder global em tecnologia para uma situação de semifalência, em um intervalo de cinco anos", lembra o fundador da 22Human Capital, Paulo Aziz Nader.

Afinal, o que pode levar um chefe renomado a perder sua efetividade? Nader afirma que a resposta é simples: ele parou de se questionar se estava no caminho certo e deixou de lançar um olhar crítico para si.

"Provavelmente, ele permitiu que a autossuficiência tomasse conta de seu senso crítico, deixando reinar um certo narcisismo, que todos nós temos. Essa postura costuma ser reforçada por uma manada de apoiadores incondicionais. Esses líderes acabam caindo na armadilha de si mesmo", avalia.

Segundo ele, o pior é que todos nós estamos sujeitos a seguirmos essa trilha. "A boa notícia é que já existem estudos que mostram, com certa clareza, o que acontece com estas pessoas. Sabendo disso, fica mais fácil prevenir um eventual deslize e manter a performance dos executivos em alta."

Entre os fatores de risco apontados pelos estudos citados por Nader está a falta de atenção aos próprios fatores de risco. "Uma autopercepção acurada é uma das principais características de pessoas com alta inteligência emocional. É com ela que nos percebemos com olhar crítico, notando nossas emoções e maneira de agir."

O consultor afirma que o excesso de certeza também representa perigo, porque alguns líderes acreditam que devem ter respostas para tudo.

"O medo inconsciente de não ser necessário e a soberba são exemplos comuns. Quando isto acontece, esses executivos deixam de procurar a melhor solução para cada desafio e oferecem a única solução que eles têm. Por esse motivo, algumas delas estão longe de serem as ideais."

A ausência de desafiadores também faz soar o alarme. "É comum que os executivos se cerquem de seguidores incondicionais. O problema é quando isto se torna exagerado."

Autoavaliação

Ocupando posições de liderança há 25 anos, o vice-presidente sênior administrativo do Walmart Brasil, Cléber Voelzke, considera difícil analisar a si mesmo de forma crítica sem ajuda externa.

"Desde quando comecei a ser líder, pratico muito a política da porta aberta. Qualquer funcionário da empresa pode me procurar para conversar, sempre fomentei isso. Com a prática, permito que me deem feedback", revela.

Segundo ele, o grande problema enfrentado por aqueles que crescem na carreira é obter retorno, porque os funcionários ficam com receio de falar algo que desagrade o líder.Voelzke afirma que os executivos devem fomentar esse tipo de atitude, demonstrando que estão abertos a escutar ideias diferentes das suas.

"Se não fizermos isso, nunca vamos conseguir obter retorno sobre nossa atuação. Adoto essa postura e ela me trouxe até aqui. Considero uma prática de sucesso."

Para Voelzke, quando um líder se propõe a trabalhar em equipe, as suas decisões nunca serão autoritárias ou arbitrárias. "Os questionamentos ocorrem durante o processo de definição do projeto. Quando definimos o que será feito, nos mobilizamos juntos para colocar a ideia em prática. Conseguir envolver as pessoas torna muito mais simples a jornada."

O diretor adjunto de gente & gestão da transportadora RTE Rodonaves --empresa de transportes que está no mercado há 36 anos--, Oswaldo Brison Maia, acredita que a soberba e demais atitudes derivadas de uma sensação de excesso de poder são riscos aos quais as empresas e seus diretores estão expostos todos os dias.

"Por esse motivo, os executivos da área de gestão de pessoas devem aumentar o cuidado para que os líderes não caiam nessa armadilha, estimulando-os a agir como exemplos e catalisadores de comportamentos adequados", diz.

Maia assegura que na empresa, a administração participativa é exercitada continuamente. "Dessa forma, as decisões são mais produtivas e as equipes ganham poder, levando o líder a atuar como orientador e maestro de seus companheiros de trabalho."

Voelzke acrescenta que uma prática que os líderes devem adotar para evitar que a carreira entre em decadência é manter contato frequente com bons profissionais de coaching.

"Sempre tive a oportunidade de ter mentores e coach. No Walmart, estou tendo a chance de ser mentor de algumas pessoas. Só não faço mais essa atividade porque minha agenda não permite. Também participo de diversas ações junto com o pessoal da área de capital humano da companhia."