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MP-SP denuncia 'Rei dos Fiscais' e funcionários do Atacadão por propina

Atacadão, empresa adquirida pelo grupo Carrefour em 2007, na mira do MP-SP - Shutterstock
Atacadão, empresa adquirida pelo grupo Carrefour em 2007, na mira do MP-SP Imagem: Shutterstock

Paulo Roberto Netto e Fausto Macedo

São Paulo

10/03/2020 18h34

O Ministério Público de São Paulo apresentou denuncia contra o ex-auditor fiscal José Rodrigo de Freitas, o "Rei dos Fiscais", e outras seis pessoas por cobrança e pagamento de R$ 1,5 milhão em propinas entre os anos de 2010 e 2014. As vantagens indevidas tinham como objetivo garantir a segurança do Atacadão S/A em casos de dois imóveis irregulares da empresa.

A denúncia foi apresentada pelos promotores Roberto Bodini, Marcelo Mendroni, Rodrigo Mansour da Silveira e Luís Cláudio Valente, do Grupo Especial de Repressão a Delitos Econômicos, e mira esquema montado pelo "Rei dos Fiscais" em parceria com José Carlos Romero, engenheiro aposentado que à época era lotado na subprefeitura da Vila Maria e quatro funcionários do Atacadão, empresa adquirida pelo grupo Carrefour em 2007.

Segundo as investigações, José Rodrigo de Freitas e José Carlos Romero teriam solicitado propinas aos funcionários do Atacadão Carlos Augusto Monteiros Barros (Diretor de Expansão), John Kenedy de Oliveira Silva (Diretor de obras), Sergio Garcia Martins (Gerente do Departamento Jurídico) e Marco Aurélio Natale da Silva (Setor de Regularizações).

A contrapartida seria a aprovação de licença de funcionamento de imóveis em situação irregular localizados na zona norte de São Paulo. A propina foi paga entre os anos de 2010 a 2014 por meio de notas fiscais de uma empresa laranja aberta por Gil de Deus Rodrigues, que fechou delação premiada e narrou o esquema ilícito aos investigadores. Ao todo, foram repassados R$ 1,5 milhões em vantagens indevidas.

De acordo com o Ministério Público, José Rodrigo de Freitas utilizava seu cargo de auditor fiscal para localizar, na base de dados da Prefeitura de São Paulo, empresas que estavam em situação irregular na zona norte de São Paulo. As informações eram repassadas ao engenheiro José Carlos Romero, que fazia a interlocução com os empresários para oferecer proteção fiscal e administrativa em troca de propinas.

No caso do Atacadão, a dupla teria entrado em contato com os quatro funcionários do grupo empresarial.

"É certo que, em 2010, os funcionários Carlos Barros, Diretor de expansão, John Kenedy, Diretor de Obras, e Sergio Garcia, Gerente do Departamento Jurídico, cientes da situação de irregularidade dos prédios do Atacadão localizados na Rua Morvan Dias de Figueiredo, passaram a manter negociações com o então auditor fiscal José Rodrigo de Freitas, conhecido no Atacadão como 'Rodrigo da Prefeitura' , com o intuito de ilicitamente impedir autuações e fechamento dos estabelecimentos, além de buscar o favorecimento da empresa no processo administrativo de regularização das citadas unidades do Atacadão", aponta o Ministério Público.

A promotoria afirma que a atuação do engenheiro José Carlos Romero impediu novas fiscalizações contra o Atacadão, impedindo novas multas e o possível fechamento dos imóveis irregulares.

Devido aos pagamentos 'expressivos' de propina, o grupo montou uma 'engenharia fiscal e financeira' para simular os pagamentos ilícitos, apurou os investigadores. A solução encontrada foi utilizar a Gil de Deus Consultoria Empresarial, microempresa aberta por Gil de Deus, para emitir 36 notas fiscais entre 2010 e 2014 para suposta prestação de serviços ao Atacadão.

A própria empresa, segundo o MP, era de 'irrisório porte', mas firmou contratos de até R$ 300 mil com o Atacadão com justificativas genéricas como 'acompanhamento junto a PMSP do processo de auto de conclusão' e 'acompanhamento junto a PMSP do processo de licença de funcionamento'.

Em delação premiada, Gil de Deus confessou o esquema e afirmou que cobra, em média, de R$ 7 mil a R$ 10 mil pelo serviço. A menor cifra fechada com o Atacadão era de R$ 100 mil.

"Mesmo sem possuir qualquer estrutura física e de pessoal, Gil de Deus passou, a pedido de José Rodrigo, a emitir notas fiscais frias, por serviços não prestados, que seriam pagas por empresas corruptoras", afirma o Ministério Público. "Os valores de tais notas correspondiam a dezenas ou centenas de milhares de reais. Não havia a prestação de fato de serviço que ensejaram o pagamento dos altos valores. As notas, na verdade, se referiam a prestações de serviços fictos e tinham como função precípua conceder a aparência de licitude à propina paga por certas empresas ao então fiscal José Rodrigo de Freitas".

No Atacadão, o Ministério Público afirma que Carlos Barros, como diretor de expansão, foi responsável por autorizar a contratação de empresa laranja e tinha ciência dos pagamentos mensais. John Kenedy, por sua vez, era o interlocutor com o 'Rei dos Fiscais' José Rodrigo de Freitas, assim como Marco Aurelio Natale da Silva. Sérgio Garcia teria prestado auxílio ao grupo na dissimulação dos pagamentos de propinas a partir da formatação de pagamentos, contratos e justificativas

"As negociações entre José Rodrigo e os representantes do Atacadão; a emissão de notas frias de prestação de serviço simulado; a tramitação irregular do processo de licenciamento; o envolvimento irregular de José Romero em tal processo; as extensões relações societárias deste com o ex-fiscal condenado em 1ª instância; todos estes elementos probatórios apontam pela prática de crimes contra a Administração Pública", conclui o Ministério Público.

COM A PALAVRA, OS DENUNCIADOS

A reportagem busca contato com os denunciados. O espaço está aberto a manifestações.