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'Marolinha' brasileira de 2008 deve virar 'ressaca' pós-pandemia, dizem analistas

Cenário mundial é incerto, e segunda onda de contágio é cogitada por autoridades - Getty Images/iStockphoto/sefa ozel
Cenário mundial é incerto, e segunda onda de contágio é cogitada por autoridades Imagem: Getty Images/iStockphoto/sefa ozel

Douglas Gavras

São Paulo

16/06/2020 12h03

A crise da covid-19 será pior para os brasileiros também quando se compara com um outro momento recente que abalou a economia mundial: a crise de 2008.

Se agora a expectativa é que 90% dos países analisados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) atravessem o baque melhor do que o Brasil, logo após 2008 eles eram pouco mais de um terço (35%).

Naquela ocasião, o crédito fácil e a disseminação de investimentos "podres" fez estourar a pior crise mundial desde 1929. Um marco foi a falência do banco de investimentos Lehman Brothers, mas quem mais sofreu foi o trabalhador americano, que empobreceu e viu o mercado imobiliário ruir.

"Em poucos meses, o mercado de ações perdeu quase US$ 10 trilhões. Quando o quarto maior banco de investimentos - depois do Goldman Sachs, do Morgan Stanley e do Merrill Lynch - afundou, o crédito evaporou e não havia nada que impedisse seus similares de seguir o mesmo caminho", contou o jornalista Matthew A. Winkler, em artigo publicado no Estadão em 2018, quando a quebra do banco completou dez anos.

Na época, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que a crise tomava o mundo como um tsunami, mas seria sentida como uma marolinha no Brasil. O país respondeu com uma política de expansão do crédito e foi beneficiado pelo "boom das commodities". A recessão viria na década seguinte.

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro ficou estagnado em -0,1% em 2009 e cresceu 7,5% no ano seguinte - uma alta de 3,6% no biênio 2009/2010. Isso é bem acima da queda de 1,3%, esperada para o biênio de 2020 e 2021, na crise atual.

Mar revolto

Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), concorda que a crise de 2008 foi amortecida no Brasil pelas commodities, enquanto outros emergentes que dependiam da exportação de manufaturados, como o México, sentiram o baque mais profundamente.

"Agora, a incerteza é maior para todos. Os países que estão reabrindo suas economias, como a China e grande parte da Europa, vão ser um espelho do que vai acontecer no resto do mundo nos próximos meses. Mas tudo ainda é muito incerto e os mercados temem uma segunda onda de contágio."

Para o economista da Universidade de Brasília (UnB) José Luis Oreiro, o Brasil parece descolado da realidade internacional. "Isso se percebe desde o início da crise atual, quando o ministro (da Economia) Paulo Guedes queria continuar com a discussão de austeridade fiscal, durante um cenário totalmente diferente, de pandemia." Ao comparar com os efeitos da crise de 2008, ele avalia que a crise atual será catastrófica do ponto de vista do agravamento da desigualdade de renda.

Pesquisadora do Peterson Institute, nos Estados Unidos, e colunista do Estadão, a economista Monica de Bolle já alertava desde o início da pandemia no Brasil que o País parecia não compreender a gravidade da crise e que as respostas do governo eram lentas e insuficientes.

"Em uma crise tradicional, a gente conhece as políticas econômicas necessárias para combatê-la. Em 2008, a resposta foi dar estímulo monetário e fiscal." Ela lembra que isso serviu para apagar o incêndio na época, mas na crise atual, que tem origem fora da economia, o desafio é muito maior.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.