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Ex-recenseadores criam correio em favela e negócio vai virar franquia

Silas Vieira, um dos sócios da empresa Carteiro Amigo, entrega correspondência na favela da Rocinha - Divulgação/Agência Sebrae
Silas Vieira, um dos sócios da empresa Carteiro Amigo, entrega correspondência na favela da Rocinha Imagem: Divulgação/Agência Sebrae

Afonso Ferreira

Do UOL, em São Paulo

21/01/2013 06h00

A dificuldade dos moradores da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro (RJ), para receber correspondências em casa motivou um trio de ex-recenseadores do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) a criar um serviço de correio dentro das comunidades: o Carteiro Amigo. A ideia pegou e agora os empreendedores já planejam transformar o negócio em franquia.

Como as ruas estreitas e os números das casas não são mapeados pelos Correios, a solução até então adotada pelos moradores era de informar endereços de bares e pontos comerciais próximos para receber as cartas. Depois, tinham de ir até o local buscá-las. O serviço do Carteiro Amigo supre essa carência deixada pelos Correios. 

A empresa recebe as cartas destinadas aos moradores da comunidade e as leva até suas casas, onde os Correios não conseguem entregar. Para ter acesso ao serviço, cada família paga uma assinatura mensal de R$ 13. No total, mais 3.000 famílias aderiram ao serviço.

Empreendedores aproveitaram trabalho para fazer pesquisa de mercado

Da ideia à abertura do negócio foram poucos meses. Enquanto aplicavam o questionário do Censo 2000 do IBGE, os sócios Carlos Pedro da Silva, 42, Silas Vieira, 43, e Elaine Ramos, 40, perceberam que muitos moradores da Rocinha não recebiam cartas em suas casas e não sabiam informar seus endereços.

Resolveram, então, realizar uma pesquisa de mercado informal, enquanto conversavam com os moradores a trabalho. Ao fim de cada questionário, o trio passou a perguntar também se os moradores estariam dispostos a pagar uma taxa para receberem a correspondência em casa. Grande parte respondeu que sim.

“A partir daí, pensamos em um nome para o negócio e o ponto de instalação. Tudo foi planejado para criar identificação com o público”, afirma Silva. Em 2000, três meses após terminarem os trabalhos do Censo, a empresa foi aberta.

Sócios mapearam a comunidade

Silva conta que ao mesmo tempo em que ia de casa em casa aplicando o questionário, o trio aproveitava para mapear as ruas da comunidade. Cada um desenhava um minimapa das ruas por onde passavam.

Depois, as partes foram reunidas, como um quebra-cabeça, criando um mapa completo. Por fim, foram criados “subceps” –uma espécie de CEP (Código de Endereçamento Postal) alternativo-- para cada rua com o intuito de diferenciar aquelas que tinham nomes iguais.

“Algumas travessas e becos têm o mesmo nome e a numeração das casas não segue uma ordem ou padrão, o que impossibilita o trabalho dos Correios. É um problema que acontece em outras comunidades do país devido à ocupação desordenada”, diz.

Os Correios confirmam a impossibilidade de entrega de cartas em ruas sem identificação oficial ou sem ordenação numérica. No entanto, informam que os próprios moradores podem retirar as correspondências em um veículo da empresa estacionado próximo à sua agência na comunidade.

Empresa venceu desconfiança dos moradores

Conquistar a confiança dos moradores foi o maior desafio do Carteiro Amigo. No início, de acordo com Silva, foi preciso oferecer o serviço gratuitamente durante um período para provar o comprometimento da empresa.

Na época, os sócios tinham de ir até as caixas postais nos pontos de entrega –geralmente bares, açougues e armazéns--, recolher as cartas, identificar o destinatário e fazer a entrega.

“Nossa primeira entrega foi em um sábado, às 21h30. Imagina o que era andar à noite na Rocinha naquela época. A seriedade [do serviço] e a necessidade [de receber cartas] nos trouxeram clientes. Hoje, os moradores recebem em casa desde a fatura do cartão de crédito até compras feitas pela internet”, declara.

Negócio vai virar franquia

Com o número crescente de adesões ao serviço, a empresa pretende se expandir para outras regiões no formato de franquia. O registro da marca, um dos requisitos para aderir ao franchising, está concluído e a meta é chegar a todas as comunidades do Rio de Janeiro, a começar por aquelas que já foram pacificadas.

Silva diz ainda já ter recebido também propostas para abertura de unidades em São Paulo e na Bahia. “Tudo depende de fazer um estudo e o mapeamento destas regiões. Até o final do primeiro semestre, devemos ter novas unidades do Carteiro Amigo em funcionamento.”