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Bancos admitem que juro é alto e culpam medo de calote e custo trabalhista

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Imagem: iStock

Téo Takar

Colaboração para o UOL, em São Paulo

03/10/2017 19h37

Por que é tão caro pegar um empréstimo no Brasil? A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) encomendou um estudo para tentar responder a essa pergunta. A conclusão é que realmente o país é campeão em juros altos. Entre as razões para isso, citaram custos de operação de um banco, falta de informações sobre a possibilidade de calote de clientes e até encargos trabalhistas.

Além disso, a entidade elaborou uma proposta de reforma do sistema de crédito, com 14 sugestões para o governo mudar a legislação e, desta forma, ajudar a reduzir o chamado “spread”, que é a diferença entre a taxa de juros que você paga no empréstimo e a taxa que o banco paga para levantar recursos para oferecer o crédito.

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O “Estudo do Spread Bancário”, desenvolvido pela consultoria Accenture a pedido da Febraban, comparou as taxas de crédito e outros indicadores financeiros praticados pelos cinco maiores bancos do Brasil (Itaú, Bradesco, Banco do Brasil, Caixa e Santander) com os dados dos cinco maiores bancos em 12 países.

Na lista, estão países desenvolvidos, como Estados Unidos e Alemanha, e nações em desenvolvimento semelhantes ao Brasil, como Rússia, Turquia e Chile. A análise foi feita no período de cinco anos, entre 2012 e 2016. Veja algumas conclusões.

Brasil tem, de longe, o maior spread

O estudo confirmou o que todos já desconfiavam: a taxa média de spread no Brasil é, de longe, a maior entre os países pesquisados, Spread é a diferença entre os juros cobrados pelos cinco maiores bancos e a taxa básica de juros da economia.

Veja quais foram as principais taxas em 2016, pela ordem, do maior para o menor:

  • Brasil: 22%
  • México: 9,1%
  • Alemanha: 5,5%
  • Estados Unidos: 5,2%
  • Chile: 4,3%

Custos de bancos justificariam juros

O levantamento conclui que os custos para operar um banco no Brasil justificariam o spread tão alto aqui na comparação com outros países. "O custo da intermediação financeira representa 77% do spread bancário. A margem de lucro do banco representa a menor parte", diz Murilo Portugal, presidente da Febraban.

O estudo desmembrou os custos em quatro itens para analisar o impacto de cada um dentro da composição do spread: custos com inadimplência, custo financeiro, custo operacional e custo tributário.

Bancos não têm informações sobre possíveis caloteiros

Os bancos brasileiros adotam padrões de crédito bastante conservadores para lidar com a inadimplência, o que faz o volume de provisões (uma espécie de reserva de segurança no caso de calote) alcançar 4,5% do total da carteira de empréstimos dos bancos, enquanto a média global é de 1,1%.

Um argumento da Febraban para justificar o rigor das instituições na hora de oferecer empréstimos é o acesso limitado a informações sobre a situação de crédito da população. As centrais de informação de crédito, como Serasa e Boa Vista SCPC, cobrem apenas 78,9% da população adulta no Brasil, índice similar ao da Rússia (77,2%), mas abaixo de México, Estados Unidos e Reino Unido, onde 100% da população possui sua situação de crédito devidamente registrada nas centrais de informação.

Além disso, há muita imprecisão nas informações prestadas. Segundo Murilo Portugal. a implementação do Cadastro Positivo (lista que mostra quem é bom pagador) poderia melhorar isso. Mas, como hoje a população não é obrigada a registrar seus dados, o Cadastro Positivo tem uma cobertura muito limitada, de cerca de 6 milhões de pessoas.

Lei não garante tomada de bens dos devedores

Outra justificativa da Febraban para explicar o custo elevado da inadimplência é a falta de leis mais claras que garantam a retomada de bens de caloteiros, como carros e casas.

Segundo o estudo da Accenture, no Brasil o índice médio de recuperação desses bens é de 16%, contra 69% na média mundial. O prazo de recuperação por aqui também é mais lento, de 4 anos, contra média de 2 anos nos países analisados.

Depósitos compulsórios encarecem captação de recursos

O custo financeiro, ou seja, quanto o banco gasta para conseguir dinheiro para emprestar, é outro fator relevante dentro da composição do spread bancário. No Brasil, essa despesa representa 8,8% dos ativos (bens) dos bancos, contra 3,8% em países em desenvolvimento e apenas 1,1% em países desenvolvidos.

O principal culpado pelo alto custo financeiro no Brasil é o depósito compulsório, segundo a federação. Uma parcela dos valores que as pessoas depositam nos bancos fica retida no Banco Central, como forma de controlar a quantidade de dinheiro em circulação na economia.

Hoje, 45% de todos os depósitos à vista (feitos em conta corrente), 30% dos depósitos na Poupança e 36% dos depósitos a prazo (um investimento em CDB, por exemplo) são direcionados ao Banco Central. A média global é de 3% para depósitos à vista, 2% para depósitos a prazo e nenhum compulsório sobre a poupança.

“Na prática, isso quer dizer que os bancos brasileiros têm que captar três vezes mais recursos para emprestar o mesmo volume de dinheiro de bancos de outros países”, afirma Murilo Portugal.

Custos trabalhistas e carga tributária também seriam culpados

A Febraban faz coro com outras entidades empresariais, que reclamam dos elevados custos trabalhistas. Eles representariam 4,5% dos recursos dos bancários, contra 2,7% na média mundial. Os bancos também reclamam dos impostos.

Murilo Portugal destacou que a carga de impostos sobre os bancos chega a 45% (25% de Imposto de Renda e 20% de Contribuição Social Sobre o Lucro líquido), acima da carga de outros setores da economia, que pagam em média 34%. 

Febraban propõe reforma do sistema de crédito

A Febraban apresentou uma série de medidas para tentar solucionar o problema. Algumas delas dependem dos próprios bancos, como investimentos em tecnologia, busca de eficiência em processos internos, compartilhamento de caixas automáticos e a montagem de uma central de informações de crédito mais abrangente do que as existentes hoje.

Outras dependem do governo, como redução do custo da inadimplência, modernização de leis e redução de burocracia.

Algumas propostas:

  • Redução das alíquotas do depósito compulsório (depende só do Banco Central)
  • Ampliação do Cadastro Positivo (depende do Congresso)
  • Mudanças na lei de uso de bens como garantia de empréstimos.(depende do Congresso)