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Com saque do PIS/Pasep, governo esvazia fundo usado por BNDES, Caixa e BB

Cristiane Bonfanti

Do UOL, em Brasília

23/06/2018 04h00

Com a liberação do saque das cotas do Fundo PIS/Pasep para todas as idades, em um ano eleitoral, o governo federal vai abrir mão de R$ 34,3 bilhões usados em financiamentos do BNDES e em empréstimos da Caixa e do Banco do Brasil. O governo diz que não há impacto às contas públicas.

O BNDES administra R$ 19,6 bilhões do total de R$ 34,3 bilhões disponíveis no fundo. Outros R$ 6 bilhões são geridos pelo Banco do Brasil. A Caixa não informou o volume total que administra.

No caso do BNDES, esse dinheiro é aplicado nos financiamentos de obras de infraestrutura, como estradas e pontes. No Banco do Brasil e na Caixa, ele é destinado a empréstimos de capital de giro, que financiam operações de empresas.

O Fundo PIS/Pasep é apenas um entre os meios utilizados como fonte de recursos pelos bancos em suas linhas de empréstimos. As instituições afirmam que a liberação do dinheiro para saque foi planejada e que não representará impacto significativo em suas operações. Os valores representam entre 0,9% e 3,7% de suas carteiras de crédito.

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A decisão do presidente Michel Temer de liberar os recursos do fundo para mais pessoas ocorreu em um momento de fragilidade da economia e a menos de quatro meses das eleições. Além de enfrentar as consequências da greve dos caminhoneiros sobre a atividade econômica, Temer amarga o título de presidente mais impopular desde a ditadura.

Uso de recursos não afeta contas públicas

No dia 13 de junho, o presidente Michel Temer sancionou a lei que permite que pessoas com menos de 60 anos saquem recursos do Fundo PIS/Pasep.

O Ministério da Fazenda disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que os recursos são um “patrimônio dos trabalhadores cotistas do Fundo PIS/Pasep”. Segundo o ministério, trata-se de uma “fonte privada de recursos” e, portanto, esses valores não estão no Orçamento da União e não representam impacto sobre o resultado das contas públicas.

O Ministério do Planejamento também disse que os recursos são “privados” e não pertencem ao governo. “Por isso, o processo de comunicação à população sobre a existência dos recursos, sensibilizando-os para realizar o saque”, afirmou o Planejamento, por meio de sua assessoria.

Uso dos recursos será “acomodado”, diz BNDES

O BNDES afirmou que hoje possui R$ 19,6 bilhões do total de recursos do fundo, o que representa 3,7% de sua carteira total de crédito. O banco de fomento disse que o saque é um direito dos cidadãos e que a medida não prejudicará a sua política, uma vez que a demanda por crédito tem sido menor que a normal.

“O saque dos recursos do PIS/Pasep é um direito do fundo. A devolução integral dos recursos pelo BNDES ao fundo pode ser acomodada, no atual cenário de demanda por crédito”, disse o BNDES, por meio de sua assessoria.

O Banco do Brasil afirmou que administra um total de R$ 6 bilhões que estão no fundo. Esse valor representa 0,9% da carteira de crédito do banco. No momento, o valor efetivamente aplicado nas operações de crédito é de R$ 500 milhões, disse o BB. A instituição afirmou que se preparou para suprir a falta desses recursos. Com isso, a medida não deve representar impacto em suas operações, disse.

"Considerando que a distribuição dos saldos tem sido discutida junto com o governo há algum tempo, os bancos se prepararam para suprir esses recursos de forma a não ter impacto em suas operações de crédito", disse o Banco do Brasil, por meio de sua assessoria.

A Caixa afirmou que, dos recursos do fundo, tem efetivamente disponível para crédito hoje R$ 500 milhões, entre recursos aplicados e oferecidos. O banco não disse o total de recursos do Fundo PIS/Pasep que administra. Mas afirmou que possui em sua carteira outras opções de operações de crédito e, por isso, entende que “não haverá lacunas com a medida”. 

Com imagem ruim, governo faz "agenda positiva"

Questionado sobre a medida do governo em um ano eleitoral, o economista da Tendências Consultoria Thiago Xavier disse que a decisão de liberar o saque das contas do Fundo PIS/Pasep para todas as idades faz parte de uma “agenda positiva” do governo.

Xavier comparou a medida à liberação, em 2017, das contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Ao todo, os saques dessas contas colocaram R$ 44 bilhões no bolso das famílias no ano passado.

“A liberação das contas do PIS/Pasep é uma agenda positiva para o governo, ainda mais se considerarmos a greve dos caminhoneiros, que afetou a imagem do governo e as projeções para o crescimento do PIB [Produto Interno Bruto]”, disse o economista.

O especialista em contas públicas Raul Velloso afirmou que a liberação das contas do Fundo PIS/Pasep é uma boa notícia perto das eleições e em um momento em que “todo mundo pede novidade”. Ele afirmou, no entanto, que a medida é adequada do ponto de vista econômico.

“A economia está desaquecida, e o governo está antecipando a devolução desses recursos às pessoas”, disse.

Saque cumpre função de desenvolvimento do fundo

Na avaliação da pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV) Vilma Pinto, ao liberar os recursos do PIS/Pasep para saque, em tese, o governo cumpre uma das funções do fundo, a de desenvolvimento econômico.

Do ponto de vista orçamentário, Vilma disse que, se um valor é arrecadado para determinado fim, ele não pode ser utilizado com outro objetivo. Essa regra está inserida no que os economistas chamam de vinculação orçamentária.

“No caso do PIS/Pasep, uma das finalidades é o desenvolvimento econômico. Se o governo libera o saque para injetar dinheiro na economia, de certa forma ele está estimulando o país a crescer, o que pode ser visto como desenvolvimento”, afirmou.

O que é o Fundo PIS/Pasep

O Fundo PIS/Pasep foi constituído com recursos do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep).

De 1971 até 1988, as empresas e órgãos públicos depositavam as contribuições dos trabalhadores para o PIS e o Pasep em nome de cada um dos seus funcionários e servidores. Assim, cada trabalhador era dono de uma parte (cota) no fundo.

Originalmente, aquele fundo tinha como objetivo assegurar ao empregado um patrimônio e permitir o desenvolvimento econômico e social do país, entre outras finalidades.

A partir da Constituição de 1988, as contribuições para o PIS/Pasep deixaram de ser depositadas em contas individuais e passaram a ser transferidas para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). O dinheiro agora custeia benefícios como o seguro-desemprego e o abono salarial.