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Sindicato de hotéis assina acordo que permite suspender salário por 4 meses

Vinícius Pereira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

01/04/2020 04h00Atualizada em 02/04/2020 20h52

Mesmo com a retirada pelo governo da proposta de suspender salários por quatro meses na crise do coronavírus, algumas categorias podem ficar sem receber. O UOL apurou que associações empresariais se movimentaram para assinar com sindicatos de trabalhadores acordos que permitissem isso.

A CNTUr (Confederação Nacional do Turismo), por exemplo, distribuiu um documento para que sindicatos aderissem às alterações. Esse aditivo a convenção coletiva de trabalho prevê que, dentre outras coisas, as empresas possam suspender os contratos de trabalho por até 120 dias sem salário, entre outras medidas. O Sinthoresp (Sindicato dos Trabalhadores em Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares de São Paulo e Região) assinou o termo em 19 de março. Dessa forma, os trabalhadores de 32 municípios, além de São Paulo, que são representados pela entidade já podem ter seus contratos de trabalho alterados por tal medida.

Segundo o Sinthoresp, a medida visa a manutenção dos postos de trabalho em meio a crise causada pelo coronavírus. A CNTUr não se manifestou até a publicação deste texto.

"Para nós, a manutenção dos postos de trabalho era o mais importante neste momento. Então, demos algumas saídas para os empresários atuarem junto a suas administrações", disse Rubens Silva, secretário-geral do Sinthoresp.

"A última opção, e mais difícil, era a suspensão do contrato de trabalho, com previsão do abono. Foi isso que nós negociamos e firmamos em nosso acordo", disse Silva. "Esperamos que as medidas do governo de crédito para pequenas e médias empresas façam efeito", afirmou.

O UOL apurou ainda que, em São Paulo, três grandes redes de hotéis e uma rede de bufê fizeram consultas ao Sinthoresp sobre o termo aditivo à convenção coletiva de trabalho. Segundo o sindicato, as medidas deverão ser adotadas já a partir de abril.

Abono de metade do salário

No acordo assinado pelo Sinthoresp, há outras possibilidades além da suspensão dos salários por quatro meses. Existe a previsão de pagamento de um abono salarial de 50% do piso salarial. Esse abono livra as empresas dos encargos tributários e sociais no período.

Como opção à interrupção do salário, pode haver ainda redução de até 25%, como previsto na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) em caso de calamidade.

O acordo também prevê a possibilidade de concessão de férias ou rescisão de contrato.

MP tem validade retroativa

O acordo encontra uma garantia na MP publicada por Bolsonaro. De acordo com o artigo 36 da MP 927, medidas trabalhistas adotadas por empregadores 30 dias antes da MP são válidas.

"Consideram-se convalidadas as medidas trabalhistas adotadas por empregadores que não contrariem o disposto nesta Medida Provisória, tomadas no período dos trinta dias anteriores à data de entrada em vigor desta Medida Provisória", prevê o artigo.

Dessa forma, o acordo assinado pelos sindicatos de trabalhadores de bares, hotéis e restaurantes, por exemplo, já é válido.

Disputa judicial é possível

Especialistas afirmam, porém, que o artigo pode ser confrontado juridicamente, dado que prever retroatividade não é algo comum nesse tipo de medida.

"A MP falar que acordos anteriores a própria MP são válidos é muito confuso. A MP já é algo atípica, uma medida de urgência. Prever retroatividade é algo bastante questionável", afirmou Marcelo Fortes, advogado trabalhista e especialista em direito do consumidor.

Para Rodrigo Shiromoto, especialista em direito do trabalho, a suspensão de salários sem uma contrapartida do governo para bancar ao menos parte dos rendimentos poderia ser prejudicial aos empregados.

A reforma trabalhista viabiliza a medida, pois permite que negociações se sobreponham à lei.

Para a CNTur, mesmo que a MP possa dar espaço a disputas judiciais, o acordo atual deve permanecer válido. "A convenção não cai com a questão da retroatividade. O princípio que rege é que o acordado prevalece sobre o legislado", disse Edson Pinto, diretor da CNTur (Confederação Nacional do Turismo).

Procurados, o Sindhotéis (Sindicato das empresas de hotelaria e estabelecimentos de hospedagens de São Paulo) e o Sindresbar (Sindicato dos restaurantes, bares e similares de São Paulo) não se manifestaram.