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Presidente do Insper vê governo preocupado em 'salvar acionistas' na crise

Marcos Lisboa foi secretário de Política Econômica durante o governo Lula - Karime Xavier/Folhapress
Marcos Lisboa foi secretário de Política Econômica durante o governo Lula Imagem: Karime Xavier/Folhapress

Do UOL, em São Paulo

19/05/2020 11h57

Marcos Lisboa tem criticado as medidas tomadas pelo governo de Jair Bolsonaro na gestão da crise econômica provocada pelo coronavírus e desta vez foi mais enfático. Para o ex-secretário de Política Econômica do governo Lula e atual presidente do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), o socorro às empresas tem priorizado os seus acionistas.

"Acho que nessa crise tem uma confusão muito grande entre tentar salvar alguns negócios e o que está se configurando na prática, que é salvar os acionistas", afirmou hoje Lisboa em entrevista à Globonews. O economista também já foi diretor-executivo e vice-presidente do banco Itaú.

"Acho que a intenção é correta, de ajudar as pessoas, primeiro é uma política pública que tem que auxiliar as pessoas, seria o foco. Empresas depende, em alguns casos sim, em outros casos não, mas não usar o dinheiro do contribuinte, da sociedade, para salvar acionistas, deixando o ônus da conta para um país que está mais pobre", explicou melhor o economista.

Lisboa citou o modelo de recuperação econômica dos Estados Unidos em 2008 como um exemplo que poderia ser seguido pelo Brasil. Nele, o governo federal tem menos prejuízos ao tentar recuperar empresas que se tornem devedoras, dividindo essa responsabilidade com os acionistas.

"O governo e o sistema podem entrar colaborando, mas nesse caso se der certo ele é sócio do negócio, os acionistas terão que ser diluídos, e em dando certo o governo recebe seus recursos de volta. Em dando errado os acionistas têm que pagar a conta e o governo perdeu exclusivamente o que colocou", disse Lisboa.

"No caso das empresas maiores, o que se pede é que os bancos emprestem. Se tudo der certo a gente devolve o dinheiro, se der errado, o prejuízo é seu. Não parece ser o melhor caminho", concluiu o economista sobre o modelo brasileiro de socorro às empresas.

A ajuda a pequenas e médias empresas vem sendo criticada por não ter chegado a quem mais precisa, esbarrando principalmente no fato de ter que ser contratada junto aos grandes bancos e impor exigências que a maioria dos microempresários não pode atender. Para tentar contornar isso, o governo anunciou hoje uma nova linha de crédito voltada a esses empresários.

Retomada complicada

Sobre o futuro, após passado o pior momento da pandemia no país, Lisboa prevê um cenário complicado, no qual será preciso um "choque de realidade" para entender que não será mais possível voltar ao momento econômico que se apresentava no começo do ano.

"É preciso ter um choque de realidade, não vamos voltar ao que éramos durante muito tempo. Isso é um recado duro, mas que precisa ser enfrentado, senão se cria uma fantasia que novembro vai ser como era fevereiro. Não vai", afirmou o presidente do Insper.

"Não reconhecer esse problema está levando a muitos erros nesse momento da crise", completou Lisboa, apontando os problemas estruturais de estados e municípios como um dos mais graves para o prognóstico pessimista. Para ele, as administrações locais seguem gastando muito com o funcionalismo público e isso dificultará a retomada econômica pós pandemia.