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BC podia gastar para ajudar pequenas empresas, mas não fez isso. Por quê?

Antonio Temóteo

Do UOL, em Brasília

20/12/2020 04h00

Com a crise econômica decorrente da pandemia do coronavírus, o BC (Banco Central) recebeu autorização do Congresso Nacional para comprar títulos de dívida de empresas privadas no mercado secundário - onde o papel da companhia sai da mão de um primeiro comprador e vai para a mão de um segundo comprador.

Apesar de ter essa autorização, o BC informou que não fez a compra de títulos privados porque as "condições de mercado" não eram favoráveis. Questionada pelo UOL, a autarquia não informou quais seriam as condições adequadas para a compra dos papéis.

Pela regra, o BC pode comprar ativos com risco de crédito baixo, ou seja, com possibilidade menor de calote. Esses títulos têm classificação que varia de A (melhores) até H (piores). O BC pode comprar papéis com classificação BB- ou superior, não conversíveis em ações e com prazo de vencimento igual ou superior a 12 meses.

Também ficou definido que a autoridade monetária daria preferência às operações com ativos emitidos por microempresas e empresas de pequeno e médio portes. A autorização para a compra dos títulos vale até o fim do estado de calamidade pública.

Autorização demorou a ser aprovada, dizem especialistas

Especialistas ouvidos pelo UOL afirmaram que a medida aprovada pelo Congresso é positiva, mas demorou a ser aprovada. "Quando o BC teve autorização para usar esse instrumento, os juros já estavam caindo. O problema de liquidez já havia sido superado e não foi necessária a intervenção", disse o economista Paulo Ribeiro, pesquisador da escola de negócios Insper.

Além disso, alguns economistas afirmaram que a compra dos títulos pelo BC não foi necessária porque o pagamento do auxílio emergencial, a liberação de compulsório e a criação de linhas de crédito com subsídio do governo ajudaram as empresas no enfrentamento da crise.

"O BC poderia ter comprado os títulos, mas acabou não sendo necessário porque o auxílio emergencial, a redução do compulsório dos bancos e o fundo garantidor do Tesouro Nacional para empréstimos para micro e pequenas empresas foram suficientes para atender a demanda das empresas", disse o economista Nelson Barbosa, professor do FGV (Fundação Getulio Vargas).

Autorização deve ser permanente e restrita para períodos de crise

Ribeiro declarou que a autorização para a compra de títulos privados no mercado secundário pelo BC deve ser permanente. Segundo ele, o instrumento é usado por bancos centrais de diversos países em momentos de crise e pode ajudar no processo de recuperação da economia.

"Também sou favorável a compra dos títulos no mercado secundário. Se a compra fosse autorizada no mercado primeiro, o BC poderia comprar um título direto da empresa e isso levantaria questionamentos se os diretores não estariam favorecendo a empresa X ou Z", disse.

Barbosa declarou que a velocidade de recuperação da economia brasileira em 2021 vai reacender o debate sobre a necessidade do BC intervir ou não no mercado com a compra de títulos privados.

"A economia não vai estar em queda livre, mas em lenta recuperação. Serão necessárias medidas para a reconstrução da economia. Uma coisa é o governo garantir perdas para dar crédito para a firma atravessar o pior da crise. Teremos uma nova realidade de negócios no próximo ano, com recuperações judiciais e cobrança de impostos que foram adiados. Tem gente falando em um novo Refis. Acho que o melhor é dar assistência com crédito", disse.