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Boulos, Tabata Amaral e mercado invadem redes para discutir autonomia do BC

Do UOL, em São Paulo

10/02/2021 16h10

O projeto de lei que garante autonomia ao Banco Central (BC) domina o debate econômico e as redes sociais de políticos e economistas e dividiu políticos da esquerda e direita. Enquanto alguns acreditam que essa mudança permitiria que o BC olhasse para políticas de longo prazo, outros criticam o projeto por deixar o banco mais voltado ao mercado financeiro.

Já analisada pelo Senado, a proposta passou pela Câmara dos Deputados, que aprovou urgência para a votação do tema. A principal mudança com o novo projeto de lei é em relação aos mandatos do presidente e dos diretores do Banco Central, que se tornam fixos. Hoje, o presidente da República pode indicar esses cargos a qualquer momento.

Políticos como a deputada Tabata Amaral (PDT), o senador José Serra (PSDB) e o ex-candidato à prefeitura de São Paulo Guilherme Boulos (PSOL) usaram suas redes sociais para comentar o tema. Economistas também comentaram o projeto.

Autonomia é prática em outros países

Favorável à política, a deputada federal Tabata Amaral (PDT) diz que a política de mandato fixo para os dirigentes do banco já é praticada em outros países, inclusive no Banco Central Europeu. De acordo com ela, a autonomia do BC impede que o país "seja vítima de governos autoritários e populistas, de esquerda ou de direita, porque o governo não vai poder, da noite para o dia e pensando em reeleição, mudar sua política monetária".

De acordo com ela, a autonomia do Banco Central não fará com que a instituição seja mais influenciada pelo mercado financeiro, porque esse risco já existe. A deputada propõe medidas para diminuir essa interferência, como aumentar o período que um ex-presidente ou diretor da instituição não pode ocupar um cargo em banco privado de seis para 12 meses.

Com os mandatos fixos de quatro anos, o BC poderia pensar políticas econômicas no longo prazo, afirma o advogado Kenneth Antunes Ferreira, sócio do escritório Lefosse Advogados e especialista em direito bancário e financeiro e favorável à autonomia. "Essa política traz um ganho de confiabilidade para o país e exige uma maturidade muito grande do país e de sua política econômica", diz ele em entrevista ao UOL.

De acordo com ele, o papel do BC é controlar a inflação. Sem essa política adequada, a população sofre quando os preços aumentam muito acima do salário. Sobre a interferência do mercado financeiro no Banco Central, Ferreira afirma que muitos presidentes e dirigentes do BC já passaram por esse setor, o que é natural, já que é o próprio mercado financeiro que forma profissionais aptos a determinar políticas econômicas.

Autonomia do BC pode impedir ação do governo, diz economista

Já para o economista Nelson Marconi, a falta de sincronia entre o Banco Central e o governo pode levar a um descompasso entre as políticas monetárias, determinadas pelo BC, e as políticas fiscais, que não cabem ao banco. Marconi é coordenador do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da Fundação Getulio Vargas (FGVcnd).

"Imaginem um governo eleito democraticamente, com um determinado compromisso econômico junto ao país, que não consegue implementar as diretrizes macroeconômicas necessárias porque o presidente do Bacen, que só mudaria no terceiro ano do mandato do governo, é contrário", escreve ele em sua conta no Twitter. O projeto de autonomia daria ao BC muito poder para determinar os rumos da economia, acredita.

Banco central e o mercado financeiro

Ciro Gomes (PDT-CE) critica a medida, dizendo que a proposição possui o objetivo de entregar "aos bilionários do sistema financeiro o destino da economia brasileira".

O Banco Central já tem autonomia operacional, para Guilherme Boulos (PSOL) . Com o mandato fixo, a instituição ganharia mais poder e estaria sujeita ao mercado financeiro. "Ainda que as diretrizes sejam definidas no CMN (Conselho Monetário Nacional), o BC teria como objetivo central defender a meta de inflação, independentemente de outras políticas, transformando-se em um "super-poder" sem qualquer controle democrático", escreve ele em sua conta no Twitter.

O Banco Central é um instrumento do Estado para que governos democraticamente eleitos apliquem suas políticas econômicas, diz o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ). No entanto, ao ganhar autonomia, o BC deixa de ter esse papel para defender interesses de banqueiros. "A política econômica já é submetida aos interesses de banqueiros e de todo sistema financeiro, as famílias que estão endividadas pagando juros extorsivos sabem bem disso. O objetivo da autonomia do BC é oficializar essa submissão, entregando a chave do galinheiro às raposas", escreve ele em sua conta no Twitter.

Não é o momento apropriado para a discussão

Para o senador José Serra (PSDB), "o projeto que institui a independência política do Banco Central é moralmente perverso e deve ser rejeitado. Essa autonomia aumenta a já enorme barreira que separa ricos e pobres", escreve ele em sua conta no Twitter. Além disso, não é o momento de discutir a autonomia do BC, assunto em pauta há algumas décadas. "O Brasil vive uma pandemia e o novo presidente da Câmara resolve mostrar serviço, tentando aprovar uma das reformas menos relevantes para o enfrentamento da crise", diz o senador.