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Pedreiro diz que teve nome usado em pirâmide financeira de R$ 200 milhões

Abinoan Santiago

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

01/09/2021 04h00

A Polícia Civil de Santa Catarina apura se uma empresa teria usado o nome de um pedreiro de 47 anos para aplicar um suposto golpe de pirâmide financeira que teria causado prejuízos de R$ 200 milhões a mais de 26 mil vítimas pelo país.

A empresa de e-commerce WorkScore foi aberta em 2019, em Tubarão, a 138 km de Florianópolis. Ela tem como sócios o CEO Deivid Bruno Daros e Robson Bauer, um pedreiro que vive de bicos e que alega ter emprestado o nome para abri-la sem saber das supostas fraudes. A empresa nega irregularidades (veja detalhes mais abaixo).

A WorkScore ofertava ganhos por vendas de celulares pela internet e captação de novos investidores para o e-commerce.

Promessa de dividir 20% dos lucros

Nas vendas, os clientes aportavam dinheiro, o que daria capital de giro à empresa que, por sua vez, prometia dividir 20% dos lucros dos produtos.

Na captação de clientes, era prometido o valor de 1% do que os novos investidores trouxessem.

As vítimas, contudo, negam que existissem vendas. Elas relatam que o sustento da empresa, de fato, se dava pelo ingresso de novas pessoas como investidores atraídos pelo e-commerce.

Perdeu dinheiro dele e da família

Uma das vítimas do suposto golpe é o segurança Cláudio Castro, de 27 anos, do Rio de Janeiro. Ele conheceu a WorkScore pela internet. "Eu e minha esposa investimos R$ 10 mil, mas indicamos para parentes que juntos somam o prejuízo de R$ 100 mil. Eram nossas economias, e tudo foi perdido", afirma.

Outra pessoa que se diz prejudicada é um encarregado de obras de 34 anos, de Cubatão (SP). Ele não quis se identificar, mas disse que investiu R$ 25 mil e só teve de volta R$ 5.000. "Quando vi o dinheiro, em tese, rendendo e caindo na conta, coloquei mais. Iniciei com R$ 500 e investi R$ 25 mil até a empresa falir. É revoltante porque foi muito tempo da minha vida juntando."

Dívida seria de R$ 200 milhões

De acordo com as vítimas, a captação de investidores no e-commerce era chamada de "Revenda Work". A promessa de ganho era de 1% ao dia útil para o novo afiliado, conforme o plano escolhido, com aportes entre R$ 500 e R$ 200 mil.

As vítimas estimam a captação de R$ 725 milhões desde 2019 por meio do esquema. O cálculo foi feito por auditoria do escritório que as defende. A dívida com os investidores é estimada em R$ 200 milhões.

"[Eles] acreditaram que seus recursos eram investidos em atividades relacionadas ao pungente mercado do comércio eletrônico, que ante o seu potencial permitia resultados acima dos investimentos convencionais", diz o advogado Jorge Calazans, que defende as vítimas.

Pedreiro tem participação de R$ 90 milhões

Desde fevereiro deste ano, a empresa parou de pagar os investidores, alegando dificuldades financeiras.

Uma investigação dos próprios clientes identificou que, no mesmo mês, o contrato social da empresa foi mudado, alterando a participação do pedreiro Robson Bauer de R$ 105 mil para R$ 90 milhões. Assim, ele virou sócio majoritário, com 99% das cotas, deixando Deivid Bruno com 1%.

No entanto, Bauer diz que desconhecia ser o dono. Os clientes desconfiaram que Bauer não soubesse do esquema após verem que ele morava em uma casa humilde de Tubarão e que ainda fazia bicos como pedreiro.

O UOL tentou conversar com Bauer, mas sua advogada, Rossana Fontoura, informou que ele tem medo de represálias. Ela afirma que Bauer conheceu o sócio Deivid Bruno em 2019, sendo apresentado por um amigo, o advogado César Paganini Teixeira. Ambos teriam pedido ao pedreiro o nome emprestado para abrir a empresa.

A dupla teria dito que era para vender celulares, convencendo Bauer a fornecer os documentos após oferta de 2% dos lucros. "Pegaram os documentos e fizeram assinatura eletrônica [em uma procuração]. Estudaram o alvo para que não os procurasse depois", afirma a advogada.

Rossana diz que, depois de saber das supostas fraudes pelo advogado das vítimas, Bauer parou de trabalhar, mudou de endereço e denunciou o caso à Polícia Civil: "Está muito inseguro, o conheço há 10 anos e é uma pessoa humilde."

"Estava claro que ele não sabia de nada do negócio quando o informamos, nem que era dono de 99%, muito menos dos R$ 90 milhões", diz Calazans, advogado das vítimas.

Advogado dos investigados nega

O advogado Rafael Molina, que defende Deivid Bruno e César Teixeira, nega crimes e diz que o pedreiro sabia de tudo sobre a empresa.

"Documentos demostram que ele participava ativamente da empresa, com retirada de valores, tanto que estamos querendo a dissolução de sociedade", declara.

Molina afirma que ainda não se aprofundou na contabilidade da empresa para afirmar se é uma pirâmide financeira. "Pelo que vimos, existia um e-commerce que contemplava os investidores. Agora dizer se era ou não pirâmide, não tenho como afirmar", diz.

A empresa alega que deixou de pagar os investidores porque o pedreiro assumiu 99% do controle. Molina também acrescenta que não há previsão de reembolso às vítimas. "O David e o César estão de mãos atadas", afirma.

Polícia Civil não comenta

O caso é investigado pela Polícia Civil. Os supostos crimes verificados são estelionato, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica. Procurado, o delegado do caso, Bruno Fernandes, preferiu não comentar.

O MP (Ministério Público) de Santa Catarina e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) informaram que ainda não receberam denúncias.