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Sucesso no Brasil, um ano depois Pix ainda perde para TED e cartões

Pix, novo meio de pagamento do Banco Central - TIAGO CALDAS/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO
Pix, novo meio de pagamento do Banco Central Imagem: TIAGO CALDAS/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

17/11/2021 04h00

Após um ano de funcionamento, o Pix caiu no gosto dos brasileiros rapidamente. Dados do Banco Central mostram que o sistema de pagamentos instantâneos já é mais utilizado que outras ferramentas de transferência, como o DOC (Documento de Crédito) e a TED (Transferência Eletrônica Disponível), e também tem abarcado boa parte das transações no comércio.

Apesar do sucesso, considerando o volume de transações em reais, o Pix ainda luta por espaço com a TED. No caso do número de transações, o sistema ainda perde para os cartões de débito e de crédito.

Na prática, o brasileiro ainda prefere fazer TED quando a transferência é de valores maiores e usar cartões ao pagar contas em restaurantes ou supermercados, por exemplo.

Pix versus TED

Prático e gratuito, o Pix se tornou a ferramenta mais utilizada para transferência de recursos entre os brasileiros. Conforme o BC, apenas em setembro deste ano foram feitas 1,04 bilhão de operações com o Pix.

No mesmo mês, foram 349,2 milhão de transações com boletos bancários e apenas 94,3 milhão de operações com TED. Os demais meios de transferência — que abarcam DOC, cheques e TEC (Transferência Especial de Crédito, pouco conhecida e utilizada) — somaram 24,7 milhões de operações.

Em reais, no entanto, o Pix movimentou bem menos que a TED em setembro, conforme os dados do BC:

  • TED: R$ 3,09 trilhões
  • Pix: R$ 554,4 bilhões
  • Boleto: R$ 420,8 bilhões
  • Outros: R$ 58,9 bilhões

De acordo com Mayara Trindade Yano, assessora do Departamento de Competição e de Estrutura do Mercado Financeiro (Decem) do Banco Central, isso ocorre porque o Pix foi bastante adotado por pessoas físicas, mas muitas empresas ainda preferem realizar transferências por meio de TED.

Na questão do valor, o Pix já superou o boleto e o DOC. Só que a TED tem uma característica particular, porque foi criada para transações de alto valor. Então, já havia o uso nos casos de alto valor, principalmente por empresas. Em volume financeiro, o Pix ainda não superou a TED, porque seu uso pelas empresas está sendo mais gradual do entre as pessoas físicas
Mayara Trindade Yano, do Banco Central

Uso do Pix por empresas exige adaptações

Mayara Yano argumenta ainda que, para muitas empresas, o uso do Pix requer adaptações. "Muitas delas utilizam sistemas integrados de gestão para fazer movimentações de alto valor, que dependem de várias alçadas dentro da companhia. Alguns destes sistemas levam um tempo a mais para serem ajustados", explica.

Os dados do BC mostram que, em setembro, as transferências entre pessoas pelo Pix somaram 647,9 milhões de operações. Já as transferências entre empresas atingiram apenas 23,3 milhões. Em muitos casos, as empresas seguem preferindo a TED.

Segundo Marco Zanini, CEO da Dinamo Networks — empresa que presta serviços para instituições financeiras na área de segurança de identidade digital e criptografia —, o Pix teve grande penetração entre as pessoas físicas que transferem pequenos valores. Isso ocorreu em função do uso gratuito, ao contrário da TED.

As empresas continuam fazendo a TED por dois motivos. Primeiro, porque muitas vezes elas têm acordos com os bancos para não pagar taxas, em função do volume transferido. Ou porque o valor da TED se torna irrelevante em função do valor da transferência. Em segundo lugar, a TED não é instantânea. Ela chega a levar 15 ou 20 minutos e, neste período, é possível para a empresa solicitar o cancelamento e o estorno, em caso de erro
Marco Zanini, CEO da Dinamo Networks

Zanini explica que muitos bancos mantêm uma mesa para monitorar transferências. Quando a TED é de um valor maior, é comum que o banco ligue para a empresa para confirmar a operação.

"Ainda há um conceito no mercado de que a segurança da TED é maior. O Pix tem uma obrigação tecnológica regulamentada de que a transferência aconteça em até 10 segundos", diz Zanini. "Na TED, não existe esta regra. Há um tempo para voltar atrás."

Pix versus cartões

Considerando todos os instrumentos de pagamento, o Pix já movimenta um volume, em reais, superior ao dos cartões de crédito e débito. Por outro lado, as operações com cartões ainda são mais numerosas.

Há clara preferência dos brasileiros em usar um cartão na hora de pagar a conta do restaurante, por exemplo, como mostram os dados mais recentes do BC.

Quantidade de transações por instrumento no segundo trimestre de 2021:

  • Cartão de débito: 3,12 bilhões
  • Cartão de crédito: 3,07 bilhões
  • Boleto e convênio bancário: 2,21 bilhões
  • Pix: 1,89 bilhões
  • Débito direto (automático): 1,64 bilhão
  • Cartão pré-pago: 1,26 bilhão
  • Saques: 917,5 milhões

A assessora Mayara Trindade Yano, do Banco Central, explica que o Pix, por suas características, concorre diretamente com o cartão de débito. "Desde o lançamento do Pix, estamos vendo o débito cair e o uso do Pix aumentar", afirma.

Segundo ela, à medida que os estabelecimentos comerciais adotarem o recebimento por Pix, principalmente por meio de QR Code — ou Quick Response Code (Código de Resposta Rápida, na tradução literal) —, a tendência é de que o instrumento supere o cartão de débito.

No caso do crédito, a concorrência é maior. Além de ser usado como instrumento de financiamento — já que a fatura é paga apenas no futuro, em data específica — o cartão de crédito permite o acúmulo de milhas, algo que o Pix ainda não tem.

O cartão de crédito tem um instrumento de crédito associado. Hoje o Pix não tem isso. O Pix é para pagamentos imediatos, que dependem do saldo na conta no momento do pagamento. Mas na agenda evolutiva do produto, estamos prevendo o que chamamos de 'Pix Garantido' ou 'Pix Crédito', que vai ter associado um instrumento de garantia, de pagamento parcelado
Mayara Trindade Yano, do Banco Central

Na prática, o Pix Garantido será um concorrente direto do cartão de crédito. Só que esta funcionalidade ainda não tem data para estrear. "É um instrumento complexo. Não está nem na agenda do ano que vem", diz Mayara Yano. Ainda não há definição se o produto permitirá o acúmulo de milhas por parte do usuário.

Descontos na ponta final

A visão do Banco Central, no entanto, é de que, apesar de o Pix ainda não concorrer diretamente com o cartão de crédito, há potencial de migração de um instrumento para outro.

Isso porque o Pix é mais barato para o lojista e o recebimento é imediato. "Então, no momento em que há uma infraestrutura de custos mais vantajosa para o comerciante, já percebemos a oferta de desconto para pagamento pelo Pix", diz a assessora do BC. "Aí o consumidor vai avaliar: é melhor pagar com 5% de desconto pelo Pix agora ou ganhar milhas no futuro?"

Para Zanini, da Dinamo Networks, o Pix vai vencer a guerra.

Com o tempo, em 2 ou 3 anos, o Pix vai canibalizar o cartão de crédito. À medida que o mercado fizer a diferenciação de preços, se descontos forem oferecidos pelo Pix, a sociedade vai perceber o benefício
Marco Zanini, CEO da Dinamo Networks