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Servidores do 'tribunal' da Receita entregam renúncia coletiva

Marcelo Camargo/Agência Brasil
Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Giulia Fontes

Do UOL, em São Paulo

23/12/2021 14h34Atualizada em 23/12/2021 17h46

Servidores da Receita Federal que atuam como conselheiros e especialistas no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) decidiram apresentar uma renúncia coletiva nesta quinta-feira (23). O Carf é uma espécie de "tribunal" da Receita, um órgão colegiado, formado por representantes do governo e da sociedade, que julga em segunda instância processos relacionados a questões tributárias e aduaneiras. Empresas recorrem ao Carf para contestar cobrança de impostos, por exemplo. Em dezembro, o órgão tinha em seu estoque mais de R$ 940 bilhões de créditos tributários a serem julgados.

Segundo o Sindifisco Nacional (Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal), a renúncia coletiva deve paralisar o julgamento de recursos no Carf. A entidade afirma que 44 integrantes do órgão aderiram ao movimento e que "o número deve subir" durante o dia. Como são concursados, os funcionários deixam o Carf, mas voltam à Receita.

Kleber Cabral, presidente do Sindifisco, diz que a renúncia dos conselheiros "tem um componente extra" porque, em janeiro, o Carf julgaria processos sem limite de valor. "São os recursos mais relevantes", afirma.

Nesta quinta (23), o sindicato está realizando uma série de assembleias com trabalhadores da Receita para definir se haverá ou não greve da categoria.

O UOL pediu um posicionamento ao Ministério da Economia a respeito do movimento de auditores da Receita, mas o órgão afirmou que não vai comentar.

Protesto contra corte de verbas

Documento divulgado pelo Sindifisco afirma que a renúncia coletiva é uma forma de "engrossar" o movimento iniciado por auditores e analistas. Na quarta-feira (22), mais de 500 chefes de unidades da Receita Federal entregaram seus cargos. Nesta quinta (23), o número subiu para 635. Ainda de acordo com o sindicato, a Receita tem 7.500 auditores e 5.500 analistas. Destes, 2.000 ocupam cargos de chefia. Ou seja, mais de 30% dos chefes entregaram os cargos.

Os servidores protestam contra um corte de verbas no Orçamento de 2022 para a Receita Federal. Também reclamam da falta de regulamentação de um bônus, que não é atrelado a metas de produtividade.

Reajuste a policiais

O presidente do Sindifisco afirmou em entrevista ao UOL que os cortes no orçamento do órgão "foram feitos para propiciar reajustes para as carreiras policiais".

Na terça-feira (21), o Congresso aprovou o relatório final do Orçamento de 2022, incluindo a previsão de R$ 1,7 bilhão para reajustes a policiais federais. A decisão provocou insatisfação nas outras categorias de servidores públicos, que não foram contempladas. Cerca de um milhão de servidores não têm reajuste há cinco anos.

O reajuste aos policiais era uma demanda do próprio presidente Jair Bolsonaro (PL), para agradar sua base eleitoral. Segundo apurou a colunista Carla Araújo, do UOL, o ministro da Economia, Paulo Guedes, alertou o presidente sobre um "efeito cascata" provocado pela decisão. O presidente está de férias no Guarujá (SP) e deve voltar a Brasília na sexta-feira (24). Guedes também está de férias e voltará ao trabalho em 7 de janeiro.

Outras categorias protestam

Além dos servidores da Receita, funcionários do Banco Central, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e peritos médicos também disseram publicamente estar insatisfeitos.

O Sindicato Nacional dos Servidores do Ipea divulgou nota em que afirma que fez reuniões com a presidência do órgão para "chamar a atenção para a corrosão do poder de compra dos salários" dos funcionários, que não têm reajuste desde janeiro de 2019. O texto afirma que a decisão de conceder o reajuste apenas para os policiais é uma tentativa do governo de "criar um clima de confronto em pleno ano eleitoral".

A Associação Nacional dos Médicos Peritos também divulgou nota repudiando o reajuste apenas a policiais. O texto classifica a exclusão de servidores da recomposição salarial como uma "atrocidade". A entidade afirma que os servidores estão sem reajuste há uma década e que "estão dispostos a tomar todas as medidas necessárias, inclusive as mais gravosas, para se fazerem respeitados e valorizados".

O Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central) estabeleceu um cronograma de ações de protesto contra a exclusão no reajuste. O plano prevê o encaminhamento de mensagens ao presidente da instituição, Roberto Campos Neto, afirmando que os servidores esperam que ele atue de forma "mais produtiva" em 2022. O cronograma também prevê a avaliação de ações como paralisações e manifestos.