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Subir mais os juros para derrubar inflação pode ser inútil no Brasil hoje

Banco Central reúne Comitê de Política Monetária semana que vem para definir novo aumento dos juros - Agência Brasil
Banco Central reúne Comitê de Política Monetária semana que vem para definir novo aumento dos juros Imagem: Agência Brasil

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

13/03/2022 04h00

Resumo da notícia

  • Economistas dizem que inflação gerada por alta de preços de petróleo e alimentos que vêm de fora é mais resistente aos juros
  • Mas subir juros ainda é melhor arma que BC tem para evitar que inflação se perpetue em 2023
  • Maioria do mercado aposta que taxa básica de juros Selic vai subir de 10,75% para 11,75% semana que vem

O Banco Central reúne o Comitê de Política Monetária (Copom) na próxima semana para decidir sobre a taxa básica de juros Selic pela primeira vez desde que a Rússia invadiu a Ucrânia. O conflito já provocou aumentos de preços do petróleo e dos alimentos nos mercados internacionais e gerou uma nova onda de inflação global.

A nova escalada de preços das matérias-primas no mundo aumentou o desafio do Banco Central, que já vinha subindo juros para tentar conter uma inflação que se mostra mais persistente porque a fonte da alta dos preços está fora do Brasil. Desde março do ano passado, a Selic já subiu, de 2% para 10,75%. Mas a inflação medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), indicador usado pelo governo como inflação oficial, seguiu subindo, avançando de 6,1% para os atuais 10,4% no acumulado em 12 meses.

Aumentar juros é a principal arma do Banco Central para derrubar a inflação. Mas o poder de fogo desse instrumento é reduzido quando a fonte inicial dos aumentos de preços na economia é externa, como já vinha acontecendo ao longo da pandemia e volta a ocorrer agora.

Economistas dizem que o Banco Central não pode abrir mão dessa política, mesmo reconhecendo que o aumento de juros tem efeito mais limitado contra esse tipo de inflação e que os efeitos colaterais dessa arma -como redução de crescimento econômico e menor geração de empregos- afetam os mais pobres.

Como juros combatem inflação

Segundo economistas, juros mais elevados reduzem o consumo porque encarecem o crediário e os empréstimos. Com menos consumo, as empresas têm menos espaço para repassar aumentos de custos.

Mas como a alta dos preços que está alimentando a inflação no Brasil vem principalmente de fora, mesmo que o consumo seja reduzido na economia brasileira, as pressões por aumentos de preços continuam.

Assim, o aumento de juros trava ainda mais a economia, mas com efeito limitado contra a inflação. Por isso, para alguns economistas, adianta pouco o Banco Central manter a alta dos juros neste momento para brigar com essa inflação porque o prejuízo econômico é maior que os benefícios buscados.

As classes mais pobres tendem a sofrer mais pela desaceleração econômica provocada pela alta dos juros, pois estão mais vulneráveis ao desemprego, por exemplo.
Andre Roncáglia, economista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

Não faz nenhum sentido elevar juros para enfrentar esse tipo de inflação, respondendo a um choque de oferta numa economia que já tem 14 milhões de desempregados.
Rogério Studart, senior fellow do núcleo de economia política do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri)

Efeito dos juros sobre inflação demora mais

Embora reconheçam que o poder de fogo dos juros elevados contra a inflação é mais limitado neste momento, economistas apontam que essa arma ainda precisa ser usada para evitar que a inflação saia do controle.

Para o diretor presidente da Tendências Consultoria, Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (1992/1993 e 1995/1997), não restam alternativas ao Banco Central além de elevar juros.

Se deixar a inflação solta, o custo vai ser ainda maior para trazer a inflação de volta lá na frente. E, para reduzir a demanda, tem que aumentar os juros reais.
Gustavo Loyola, Tendências Consultoria

Segundo economistas, o aumento de juros consegue combater a inflação, mesmo quando ela é importada, por três canais.

Dólar mais baixo: Juros mais elevados atraem investidores estrangeiros interessados em aplicar na renda fixa brasileira. Com mais dólares entrando, o preço da moeda americana cai ante o real. E esse dólar mais baixo reduz aqui os preços de bens cotados em moeda estrangeira, como grãos e petróleo.

Elevar juros faz sentido porque dificulta o repasse de preços dentro da economia. Além disso, juros elevados atraem mais capital, reduzindo a cotação do dólar, o que também atenua o impacto dos preços internacionais na nossa economia.
Roberto Padovani, economista chefe do BV (Banco Votorantin)

Confiança: Quando o Banco Central aumenta juros, envia um sinal para as empresas e consumidores que não quer deixar a inflação subir mais. Se a sociedade acreditar nisso, a pressão por reajustes de preços e salários, por exemplo, é menor.

Por causa do histórico de inflação no Brasil, temos o problema da inércia. Inflação alta por muito tempo realimenta a inflação no futuro. Então, o Banco Central precisa deixar claro que vai perseguir uma meta. Mesmo que ela não seja atingida este ano.
Lucas Vilela, economista do Credit Suisse

Investimentos: Juros elevados melhoram o rendimento das aplicações de renda fixa. As pessoas e empresas são mais estimuladas a investir o dinheiro do que adquirir bens. Isso também limita o espaço para que aumentos de preços sejam repassados aos consumidores.

O aumento da taxa de juros serve também para ajustar os juros à percepção de risco que aumentou e, asim, atrair capital para investimentos, inclusive de fora.
Paulo Dutra Costantin, coordenador do curso de economia da FAAP

Inflação acima da meta

Economistas dizem que a economia brasileira ainda sofre efeitos da chamada inércia inflacionária. Por exemplo, quando as empresas alteram tabelas de preços de produtos que ainda serão encomendados, ou quando os contratos de aluguel são reajustados ou ainda quando há aumentos salariais acima da inflação.

Por isso, o Banco Central precisa aumentar os juros, no presente, para enviar a mensagem de que vai perseguir a meta de inflação, no futuro.

Segundo economistas, essa posição do BC precisa ser reforçada agora porque em 2021, a inflação medida pelo IPCA , que atingiu 10,06%, superou com a meta estabelecida, que estava numa faixa entre 2,25% e 5,25%.

Por isso, o BC teve que enviar uma carta aberta à sociedade dando as explicações porque falhou em atingir as metas e apresentando as providências para assegurar o retorno da inflação aos limites estabelecidos, incluindo o prazo no qual se espera que essas providências produzam efeito.

A meta de inflação para este ano está definida em um intervalo de 2% a 5%; e, para ano que vem, dentro de uma faixa entre 1,75% e 4,75%.