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Golpe da fruta no Mercadão: Um mês depois, abordagem e preço alto continuam

Barraca de frutas no Mercadão em SP: um mês após denúncias de golpe da fruta, abordagem segue sendo invasiva, segundo clientes - Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL
Barraca de frutas no Mercadão em SP: um mês após denúncias de golpe da fruta, abordagem segue sendo invasiva, segundo clientes Imagem: Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL

Vinícius de Oliveira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

16/03/2022 04h00Atualizada em 16/03/2022 07h20

Um mês após as denúncias sobre o golpe da fruta virem à tona contra vendedores do Mercado Municipal de São Paulo, o Mercadão, a abordagem mais incisiva ao cliente continua presente entre alguns comerciantes. O preço de frutas chega a ser o triplo do encontrado fora de lá. A administração admite problemas, diz que está fiscalizando, multando e que pode até tirar a licença de comerciantes infratores.

Em 12 de fevereiro, ganharam repercussão nas redes sociais as críticas de clientes do mercadão sobre práticas abusivas dentro do espaço turístico. Eles diziam que os vendedores cobravam de R$ 100 a R$ 1.200 em bandejas de frutas, constrangiam os clientes a pagar os altos valores e, ainda, ofereciam produtos como se fossem exóticos, mas eram produtos simples.

A administração do espaço chegou a interditar três boxes na ocasião. Os três já voltaram a funcionar.

O UOL voltou ao mercadão no sábado (12) —um dia repleto de turistas. E a abordagem mais invasiva ainda estava presente. Procurada, a concessionária que administra o espaço, Mercado SP SPE, afirmou que faz fiscalizações contínuas e diárias e que já coibia práticas irregulares desde setembro, antes de as denúncias virem a público. (Leia nota completa abaixo)

No sábado, logo na entrada do mercadão, vendedores ofereciam aos visitantes o que chamam de "bombom turco" ou "bombom de Dubai". Trata-se de um pedaço de morango e uma tâmara, que devem ser comidos juntos em uma mesma mordida. A mistura de sabores daria a impressão de que a tâmara é chocolate.

Depois, foi a vez da fruta semelhante ao "maracujá com limão" (conhecida como maracujá pérola do Cerrado), da laranja vermelha e de outros produtos que sempre são uma mistura de dois frutos mais conhecidos ou que foram importados de algum país distante.

"A abordagem até foi tranquila, mas eles não deixam de insistir para que o freguês compre. Se você observar bem, o vendedor insiste de uma forma persuasiva até que você se renda e compre", relata a assistente social Maria Aparecida dos Santos, de 52 anos, que gastou R$ 120 em uma bandeja com morangos, kiwis amarelos e maracujás pérola do Cerrado.

Golpe da Fruta no Mercadão - Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL - Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL
Golpe da fruta no Mercadão, 1 mês depois: Maria Aparecida dos Santos prova maracujá pérola do Cerrado
Imagem: Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL

"Ao sairmos com outras sacolas nas mãos, os vendedores de outras barracas pareceram até evitar nos oferecer frutas para degustação. O único que ofereceu começou de forma tranquila, mas foi só eu dizer que queria apenas 100 gramas da fruta que ele resolveu me deixar falando sozinha", lamentou.

O UOL consultou o preço desses produtos no site do hortifrúti Natural da Terra na terça-feira (15). Juntos, uma bandeja com 250 gramas de morango, meio quilo de kiwi amarelo e meio quilo de maracujá pérola saíam por R$ 41,98. Ou seja, no mercadão, saiu praticamente o triplo.

A abordagem contrasta com aquela encontrada dias após as denúncias virem à tona. Na época, os lojistas falavam com os clientes a distância e somente ofereciam as frutas se você pedisse para experimentar.

A jornalista Aline Küller, 33 anos, foi ao Mercadão com os pais para fazer compras de bacalhau e outros itens para a Páscoa. Ciente do assédio dos vendedores e sem gostar muito de frutas, ela já se preparou para recusar as abordagens mais insistentes.

"Vim aqui pela primeira vez em três anos. Achei que tinha um número grande de vendedores de frutas, com uma gritaria grande, tentando chamar atenção para a barraca", afirmou. "Na rua principal, eu escutei dois vendedores falando entre si: 'Hoje tá difícil, ninguém quer [fruta], ninguém experimenta. Ninguém para nem para brigar com a gente'", narra.

Mercadão - Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL - Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL
Golpe da fruta no Mercadão, 1 mês depois: vendedores oferecem frutas para clientes provarem. Em alguns casos, abordagem segue sendo invasiva
Imagem: Vinícius de Oliveira/Colaboração para o UOL

A dificuldade de abordagem dos lojistas pode ser explicada pela repercussão na mídia do "golpe da fruta", principalmente pelo preço mais alto. A professora Adrielly Gomes, 31 anos, trouxe as amigas de Brasília para conhecer o Mercadão Municipal e o famoso sanduíche de mortadela. No entanto, elas preferiam passar longe das barracas de frutas. "Como passamos direto, eles nem ofereceram para gente", relatou.

Críticas à imprensa

Um mês após a repercussão do assédio dos lojistas na imprensa e nas redes sociais, alguns vendedores dizem acreditar que a mídia não tem mostrado o "outro lado". Após oferecer diversas frutas e conversar com a reportagem, o lojista Marcos, que pediu para não ter o sobrenome divulgado, questionou: "Eu tratei vocês com desrespeito? Fui agressivo de alguma forma?".

Para ele, o problema ocorreu em "dois ou três boxes que foram interditados e tinham problemas com o CNPJ". Entre alguns vendedores de fruta, a tese difundida é de que a imprensa quer acabar com a reputação do Mercado Municipal de São Paulo.

Como reclamar ao Procon

Para o Procon-SP, os consumidores que se sentirem lesados de alguma forma podem fazer uma reclamação oficial no site do órgão. As reclamações valem para cobranças de valores elevados, incorretas ou de produtos que foram oferecidos para degustação.

Administração ameaça cassar comerciante infrator

O UOL entrou em contato com o Consórcio Novo Mercado Municipal, responsável pela administração do espaço. A empresa admite que há abusos, diz que os combate, aplica multas e pode até cassar comerciantes que continuarem com as práticas irregularidades. Leia a nota completa abaixo:

"Logo que iniciamos a administração do Mercadão, no início de setembro de 2021, ficamos sabendo desse tipo de reclamações dos usuários, sobre os comerciantes de frutas.

E ficamos satisfeitos em poder, na nossa administração e por conta dela, dar espaço para que essas reclamações viessem a público e gerassem, o que hoje percebemos, uma mudança nesse paradigma.

Antes, no entanto, de essas reclamações virem a lume, o Mercadão, pela sua nova gestora, desde setembro do ano passado, vem tomando várias medidas para coibir e evitar este tipo de situação.

Já em outubro, foram realizadas pela companhia várias reuniões setoriais com os locatários/lojistas que representam o comércio de frutas no Mercadão. Nessas reuniões, eles foram orientados justamente sobre a obrigatoriedade do atendimento ao Código de Defesa do Consumidos, das regras da Vigilância Sanitária, de atendimento ao público, entre outras.

Evidente que uma prática que já conta com mais de 30 anos no Mercadão não conseguiu ser alterada apenas com palestras elucidativas.

Ciente, no entanto, não só da sua responsabilidade como gestora, como da necessidade de um ambiente agradável para a própria realização da vocação do Mercadão, a Mercado SP SPE passou a fazer, primeiro, advertências verbais aos lojistas que transgrediram as normas. Em sequência, advertências por escrito, e finalmente, aplicar multas, que variam de 10% a 100% do valor do aluguel.

Antes mesmo de esta divulgação pela imprensa e pelas redes sociais sobre essa questão, cuidou de interditar box que, após advertido e multado, novamente foi alvo de denúncia que chegou ao nosso conhecimento.

Finalmente, após a repercussão do que veio a público em 12 de fevereiro e diante de novas denúncias que chegaram ao SAC da companhia, naquela mesma semana, três lojistas acabaram sendo interditados, até que atendessem as demandas dos consumidores lesados e adequassem seu procedimento. Eles já foram liberados, mas continuam sob supervisão.

Hoje é possível dizer que, com mais de 265 estabelecimentos e com quase 90 anos de história, os lojistas passaram a entender que o Mercadão de São Paulo não pode estar alinhado com esta imagem.

Se estamos falando de alguns locatários/lojistas que praticaram algum tipo de abuso ou irregularidade, podemos entender que se tratava de uma minoria, que hoje está atenta às condições necessárias e imperativas para trabalhar no Mercadão.

A fiscalização pela Mercado SP SPE, dentro dos limites legais que possui, na condição de locadora dos espaços, continua e é diária.
E, se por acaso os lojistas voltarem a ter práticas como as de antes, nossa gestão continuará atenta e proativa na coibição dessas práticas. E tomará, como última medida, a retomada do espaço do lojista infrator, através da competente ação de despejo.

E, como sempre, contamos com a colaboração de todos, que podem e devem nos informar sobre qualquer tipo de irregularidade, constrangimento ou desrespeito, através do nosso pessoal, presencialmente no Mercadão, e também pelo nosso serviço de atendimento ao usuário, através do e-mail sac@mercadospspe.com.br e pelas nossas redes sociais @nossomercadao."