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Mudança na lei trabalhista é positiva, mas exige controle, dizem advogados

MP publicada nesta semana regulamenta o trabalho remoto, que se popularizou durante a pandemia - iStock
MP publicada nesta semana regulamenta o trabalho remoto, que se popularizou durante a pandemia Imagem: iStock

Giuliana Saringer

Do UOL, em São Paulo

29/03/2022 04h00

O governo federal anunciou na última sexta-feira (25) um pacote de mudanças nas leis trabalhistas, e a MP (Medida Provisória) com todos os detalhes foi publicada nesta segunda (28). As principais novidades incluem a regulamentação do teletrabalho, alterações sobre o vale-alimentação e medidas para situações de calamidade pública. Especialistas consultados pelo UOL elogiaram algumas das alterações, mas alertaram para o fato de que algumas delas podem gerar dúvidas quando forem aplicadas na prática e precisam de maior fiscalização.

Vale lembrar que as MPs têm força de lei e começam a valer a partir da publicação, mas precisam ser aprovadas pelo Congresso Nacional dentro do prazo correto — inicialmente de 60 dias, prorrogáveis por mais 60 — para se tornarem leis, de fato.

Veja o que disseram os especialistas sobre alguns pontos determinados pela MP:

Regulamentação do teletrabalho

"O trabalho remoto foi muito utilizado durante a pandemia e não existe legislação específica para ele. O fato de ter uma regra pode ser positivo para os profissionais e para as empresas", afirma Rodrigo Marques, coordenador do núcleo trabalhista do Nelson Wilians Advogados.

Um dos grandes problemas do trabalho remoto é o controle da jornada. Por estarem em casa, muitas pessoas trabalham mais horas por dia, sem serem pagas por isso.

Para Gláucia Fernandes da Silva, sócia da área contenciosa e consultiva trabalhista do Maneira Advogados, o trabalho remoto já é uma realidade e a legislação vem para dar mais segurança jurídica.

"As medidas anunciadas, principalmente sobre o trabalho híbrido e teletrabalho, são positivas, porque nossas relações de trabalho têm evoluído rápido e, com a pandemia, demos mais um passo na forma de prestação do trabalho. A CLT [Consolidação das Leis Trabalhistas] é de 1943 e não acompanhou essa evolução. As medidas são importantes para proteger todos os empregados, já que esta é uma realidade, não pode ser ignorada e tem que estar respaldada", afirma Silva.

O que muda:

  • Possibilidade de adoção do modelo híbrido de trabalho pelas empresas, com prevalência do trabalho presencial ou vice-versa. Hoje, a CLT só fala sobre o trabalho completamente remoto ou presencial;
  • Se o trabalhador estiver na empresa presencialmente para tarefas específicas, ainda que de forma habitual, não descaracteriza o trabalho remoto;
  • Dá prioridade ao trabalho remoto para trabalhadores com deficiência ou para quem tenha filhos de até quatro anos;
  • Teletrabalho poderá ser contratado por jornada, por produção ou por tarefa;
  • Estagiários e aprendizes vão poder aderir ao trabalho remoto.

Silva faz uma ressalva a respeito do trabalho preferencialmente remoto para pessoas com deficiência e aqueles que têm filhos de até 4 anos. Para os pais, a vantagem é passar mais tempo com os filhos, excluindo o tempo de deslocamento.

"Para pessoas com deficiência, também é positivo pensando em facilitar o deslocamento, mas isso pode ser visto como uma discriminação dependendo da forma como for aplicado. O empregador é obrigado a manter seu local de trabalho acessível e essa regra não pode ser uma brecha para isolar e discriminar estes funcionários. A decisão precisa ser em conjunto entre funcionário e empresa", afirma Silva.

Auxílio-alimentação

A MP também altera as regras de pagamento do vale-alimentação ao trabalhador, com o objetivo de garantir que os recursos sejam usados apenas para comprar comida. Em entrevista coletiva, o secretário-executivo do ministério do Trabalho e Previdência, Bruno Dalcolmo, disse que a MP busca corrigir uma distorção de mercado existente na contratação das empresas fornecedoras. "O que estamos fazendo aqui é coibir essa fraude, fechar essa válvula. Não faz sentido que o auxílio-alimentação seja usado para pagar a TV a cabo", afirmou.

"Essa medida vai dificultar um pouco a utilização de forma desvirtuada. Na prática, precisa de uma fiscalização mais rígida, com a possibilidade de penalidades aos estabelecimentos, para que seja cumprida", afirma Silva.

Uma das mudanças é proibir descontos ou taxas negativas na hora de contratar empresas que fornecem o auxílio-alimentação. Na prática, as empresas fornecedoras dos tíquetes davam descontos as empresas que contratavam os serviços aos funcionários.

Para compensar essa perda com o desconto, as empresas dos auxílios cobravam taxas mais altas dos restaurantes e mercados, aumentando o custo ao consumidor final.

Situações de calamidade

A MP também institui novas regras trabalhistas destinadas a períodos de calamidade pública. Para Silva, a nova lei regula algo que já foi autorizado em outros momentos, mas alerta: o governo precisa deixar claro o que considera como calamidade.

"Antes não tínhamos a regulamentação para situações de calamidade. Mas é preciso esclarecer o que é calamidade, senão vai ser só mais uma forma cercear os direitos e prejudicar os empregados. As medidas são boas quando aplicadas em casos verídicos", afirma.

  • FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço): a MP autoriza o atraso no pagamento do FGTS
  • Férias coletivas ou individuais: regulamenta a antecipação de férias ou concessão de férias coletivas, além de autorizar a antecipação de feriados;
  • BEm (Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda): caso seja necessário e haja disponibilidade de orçamento, um Decreto Presidencial poderá autorizar as empresas da área afetada a adotarem o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda, que prevê redução proporcional da jornada de trabalho e do salário ou suspensão temporária do contrato de trabalho, mediante acordo entre empregador e empregado, com pagamento do BEm.