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Disparada faz vendedor reusar óleo e subir preço de pastel e churros

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Imagem: Getty Images

Giuliana Saringer

Do UOL, em São Paulo

13/05/2022 04h00

A disparada no preço do óleo de soja complicou a vida de comerciantes que trabalham com fritura no dia a dia. Em São Paulo, vendedores de pastel de feira, pipoca e churros relatam ao UOL terem passado a espremer as margens de lucro, pesquisar fornecedores e até reutilizar o óleo "até o limite". Mesmo assim, não conseguem evitar o aumento de preços para os clientes.

O óleo de soja já subiu 20,37% só em 2022 e acumula alta de 31,53% em 12 meses, de acordo com os últimos dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).

Gislene Moneratto  - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Empresa de churros usa 400 litros de óleo por semana
Imagem: Acervo pessoal

Gislene Moneratto, sócia da empresa Tentação Churros, compra cerca de 400 litros de óleo por semana para manter sua operação em quatro locais da cidade.

A solução para economizar é buscar o menor preço em mercados atacadistas e centros de distribuição e fazer uma série de cotações por telefone. Em uma fritadeira de churros, vão dez litros de óleo.

Antes, se eu pagasse R$ 0,50 a mais no óleo, não mudava muito o custo final. Agora, o funcionário que faz as compras roda para pedir desconto. A despesa é muito grande.
Gislane Moneratto, sócio da Tentação Churros

No começo do ano, ela pagava de R$ 7 a R$ 8 na garrafa de óleo, enquanto hoje desembolsa R$ 13. Já precisou subir os preços dos churros duas vezes em 2022, primeiro de R$ 8 para R$ 9, e depois para R$ 10.

"Preferi aumentar o preço e manter a qualidade. A gente segura como dá, mas está difícil", afirma.

Em feira, pasteleiro usa óleo 'até o limite'

João Carlos Nakasama, pasteleiro - óleo - Giuliana Saringer/ UOL - Giuliana Saringer/ UOL
Nakasama diz que, se aumentar muito o preço do pastel, clientes deixam de comprar
Imagem: Giuliana Saringer/ UOL

Na zona de leste de São Paulo, o pasteleiro João Carlos Nakasama diz que não consegue repassar todo o aumento do óleo para os clientes.

"Temos que segurar e ganhar menos, porque usamos muito óleo, não tem como substituir por outra coisa para fritar. O pastel já aumentou de R$ 7 para R$ 8 desde o começo do ano. Se aumentar demais, o freguês não compra", afirma.

O reajuste do pastel não tem afastado os consumidores, segundo ele, seja pela tradição de comer pastel na feira ou por economia com o almoço.

"O pessoal acaba comprando mesmo com o preço mais caro. Pode comprar menos, mas a crise não está afetando tanto nesse sentido, já que vendo comida. Muitos comem o pastel em vez de almoçar em restaurante, gastando mais", afirma Nakasama.

Em uma fritadeira de pastel cabem cerca de 25 litros de óleo, mas Nakasama usa entre 15 e 18 litros por vez. Dois dias depois, na próxima feira, reutiliza o óleo.

Frito uns 500 pastéis com uma panela. E uso o mesmo óleo hoje e na próxima feira. Depois não uso mais.
João Carlos Nakasama, pasteleiro

Ele diz que descarta o óleo após o segundo uso porque ele fica "muito queimado".

Rafael Yukio Yamamoto, pasteleiro  - óleo - Giuliana Saringer/ UOL - Giuliana Saringer/ UOL
Preço do galão de 18 litros de óleo passou de R$ 165 no início do ano para R$ 190 em maio
Imagem: Giuliana Saringer/ UOL

Em outra feira na zona leste de São Paulo, o pasteleiro Rafael Yamamoto compra óleo em galões de 18 litros. No começo do ano, pagava R$ 165 por galão, e hoje já gasta R$ 190.

"Dezoito litros de óleo duram um dia só. Usamos o mesmo óleo o dia inteiro e descartamos no final", afirma.

Do final do ano passado para cá, a barraca precisou aumentar o preço em R$ 1 — passou de R$ 8 para R$ 9. "Ainda vamos segurar mais um pouco esse preço, mas as coisas estão difíceis", afirma Yamamoto.

O problema da estratégia usada pelos pasteleiros para economizar é que reutilizar o óleo faz mal à saúde. O ideal é utilizar uma vez e descartar logo em seguida.

"O uso do óleo já não é saudável, porque tem gorduras saturadas de má qualidade. Quando ele é usado várias vezes, é pior ainda, porque sofre um processo que deixa o óleo cada vez mais tóxico e produz substâncias que aceleram o envelhecimento celular e pode aumentar o risco de doenças crônicas, inclusive o desenvolvimento de câncer", afirma Vivian Campos, especialista em medicina integrativa.

Como fica a pipoca?

Ronivon Amaro - pipoqueiro - óleo - Giuliana Saringer/ UOL - Giuliana Saringer/ UOL
Amaro trabalha em ruas do Tatuapé, zona leste de São Paulo
Imagem: Giuliana Saringer/ UOL

A pipoca é feita com poucos ingredientes: milho, óleo e sal ou açúcar, dependendo da escolha do cliente. Para os pipoqueiros, o preço do óleo impacta diretamente os lucros, porque eles não conseguem repassar a alta ao consumidor.

O pipoqueiro Ronivon Amaro prefere ter um lucro menor a perder vendas. Hoje cobra de R$ 5 a R$ 10 por pipoca, dependendo do tamanho da embalagem.

"O pior é que não dá para aumentar o preço. O movimento já caiu bastante. Se eu aumentar mais, o pessoal não compra", afirm.

Raul Naves vende pipoca na região de Mauá (SP) e na zona leste de São Paulo, em frente a escolas, casas lotéricas e igrejas. Ele usa de quatro a cinco litros de óleo por semana para preparar cerca de 200 embalagens de pipoca por dia.

"Não mudei o preço. Se aumentar, o cliente não compra. Temos que ter um gasto maior, até para agradar e manter os clientes", afirma.

Raudson Naves - pipoqueiro - óleo - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Naves vende cerca de 200 pipocas por dia e usa de quatro a cinco litros de óleo por semana
Imagem: Acervo pessoal

Assim como os comerciantes ouvidos pelo UOL, a Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) diz que restaurantes e bares estão optando por ganhar menos para não repassar os aumentos ao consumidor.

Todo esse esforço tem sido muito duro, e é a principal razão para que um em cada quatro estabelecimentos estejam operando com prejuízo
Paulo Solmucci, presidente-executivo da Abrasel