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Mercados argentinos voltam a cair com preocupações sobre futuro de Macri; peso recua 4%

Por Lucila Sigal

13/08/2019 11h14

Por Cassandra Garrison e Jorge Otaola

BUENOS AIRES (Reuters) - O peso argentino tornou a se desvalorizar nesta terça-feira, após um segundo dia de turbulência nos mercados, desencadeada pela vitória esmagadora do candidato de oposição Alberto Fernández nas eleições primárias, que afetaram severamente as chances de reeleição do presidente Mauricio Macri.

O peso fechou em queda de 4,29%, a 55,9 por dólar, após tocar 59 por dólar mais cedo.

Na segunda-feira, a moeda bateu uma mínima histórica de 65 pesos por dólar, em queda livre de 30%, por temores de que um governo de Fernández possa levar a Argentina de volta a políticas econômicas intervencionistas.

O banco central do país vendeu um total de 255 milhões de dólares de suas reservas desde segunda-feira, num esforço para ajudar a estabilizar a moeda.

"O mercado acredita que Fernández vai provavelmente anunciar 'default', impor controles de capital e renegociar com o FMI. Em poucas palavras, o mercado acha que Fernández é o retorno do populismo", disse Claudio Irigoyen, do Bank of America Merrill Lynch.

Fernández, que tem a ex-presidente Cristina Kirchner como sua companheira de chapa, conseguiu uma impressionante vitória nas primárias, com vantagem de 15 pontos percentuais (bem acima do esperado) em relação a Macri, defensor do livre mercado.

A derrocada do peso argentino na segunda-feira aumentou a ansiedade de investidores dos mercados de ações, com os mercados já afetados pela guerra comercial entre Estados Unidos e China e os protestos em Hong Kong.

"Sim, a Argentina é uma economia pequena. No entanto, a última coisa que os mercados globais querem é que outro governo favorável ao mercado sucumba ao populismo e/ou a problemas geopolíticos", disse o estrategista do Rabobank Michael Every.

JOGO DE CULPA

Em entrevista na segunda-feira, Fernández se disse disposto a colaborar com o atual governo depois que seu triunfo nas primárias de domingo empurrou ladeira a baixo os mercados de câmbio, ações e de bônus da Argentina.

Os resultados da primária mostraram que Fernández, ex-chefe de gabinete, está bem posicionado para vencer as eleições gerais de outubro no primeiro turno. Ele culpou Macri pela turbulência do mercado.

"O diálogo é aberto, mas não quero mentir para os argentinos. O que posso fazer? Sou apenas um candidato, minha caneta não assina decretos", disse Fernández em entrevista ao canal de TV argentino Net TV, na segunda-feira.

"Os mercados reagem mal quando percebem que foram enganados", disse Fernández no começo da segunda-feira, acrescentando que a Argentina vive em uma "economia fictícia" e que o governo de Macri não está fornecendo respostas.

Fernández, considerado um moderado dentro do movimento peronista, disse que tentará "retrabalhar" o acordo argentino de 57 bilhões de dólares com o Fundo Monetário Internacional (FMI) se vencer a eleição geral. Ele propôs um pacto econômico e social para combater a inflação, que está em 55%.

Macri também refutou a responsabilidade pela volatilidade nos mercados financeiros, ao dizer, em entrevista coletiva na segunda-feira, que a oposição deveria fazer uma "autocrítica" de suas próprias políticas na esteira da reação do mercado.

O atual presidente, descendente de uma das famílias mais ricas da Argentina, chegou ao poder em 2015 com promessas de dar o pontapé inicial na terceira maior economia da América Latina por meio de uma onda de liberalização.

Mas a recuperação prometida não se materializou, e a Argentina está em recessão.

RISCOS EM ALTA

Os ativos argentinos não registravam o tipo de queda simultânea observada na segunda-feira desde a crise econômica e o calote do país sul-americano em 2001, mostraram dados da Refinitiv.

Depois de uma tentativa inicial de alta na manhã de terça-feira, operadores disseram que o mercado oscilou e deixou os preços dos títulos denominados em dólar caírem 10 pontos-base, embora em meio a um baixo volume de negócios.

Investidores ainda estavam avaliando os danos causados ​​pela onda de vendas da segunda-feira. O risco-país da Argentina subiu 164 pontos-base para 1.631 pontos-base, o maior desde 2009.

O provedor de índices MSCI disse que ainda não considerou reclassificar o índice de ações da Argentina para excluí-lo da categoria de mercado emergente, apesar do grande aumento da volatilidade e do declínio nos preços. O índice foi elevado a esse grupo recentemente.

"A acessibilidade do mercado para investidores estrangeiros é o fator-chave aqui", disse Pavlo Taranenko, diretor executivo de pesquisa de índices do MSCI.

À medida que aumentam as preocupações sobre a capacidade da Argentina de cumprir suas obrigações de dívida, os investidores estão observando atentamente o fôlego do governo para rolar suas notas de curto prazo, conhecidas como "Letes".

"Os mercados vão ficar sob intenso estresse toda vez que um desses vencimentos chegar", disse a Jeffries Fixed Income em nota.

O custo do seguro contra um calote de dívida soberana da Argentina voltou a subir na terça-feira, de acordo com dados do IHS Markit. Os cálculos da Markit avaliam a probabilidade de um "default" soberano nos próximos cinco anos em mais de 72%.

Analistas também previram que a queda do peso continuaria. O BofA disse que espera que a taxa de câmbio alcance 70,5 pesos por dólar no final de 2019 e 106,6 por dólar no final de 2020.

(Reportagem adicional de Lucila Sigal, Walter Bianchi em Buenos Aires, Marc Jones em Londres e Rodrigo Campos em Nova York)