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Empresas familiares que atravessam gerações têm valores de longo prazo

Rose Mary Lopes

Colunista do UOL

19/12/2014 06h00

Fim de ano é época em que se acentua a importância do ser e estar em família. Família como nucleadora, formadora e socializadora das novas gerações. Além disso, tradicionalmente, é o contato com a primeira célula de divisão de trabalho na sociedade.

E pode ser também uma célula econômica quando os integrantes da família se juntam para produzir e/ou fornecer produtos e serviços. Sua importância na economia, geração de empregos e impostos é enorme, visto que seriam 80% ou mais do total das empresas brasileiras.

No entanto, um estudo de 2008 aponta que somente 30% sobrevivem para a segunda geração e 5% sobrevivem para a terceira geração. Ou seja, as que conseguem ultrapassar a passagem das gerações devem ter se apoiado em recursos que as outras não souberam usar bem.

Sabe-se que as empresas familiares são complexas, pois às relações afetivo-emocionais, aos papéis que exercem dentro da família – pai, mãe, irmão, filho, genro, cunhado etc. – se juntam funções e papéis de fundador, sócio, gerente, funcionário, filho do dono...

Adicionem-se as implicações de propriedade e de herança e se percebe que o cenário do negócio familiar acrescenta vertentes que não são fáceis de gerenciar no cotidiano. E, se quiserem sobreviver e crescer, devem ultrapassar as adversidades que todos os negócios enfrentam, e ainda administrar bem as relações e as transições para a próxima geração.

No entanto, nem tudo são desvantagens: os laços, os vínculos de confiança entre seus membros ajudam na formação de recursos imateriais, únicos, não imitáveis. Chamados de intangíveis e que fundamentam valores, virtudes e um compromisso de longo prazo com o negócio.

Estas famílias empresárias precisam lidar bem com estes e outros recursos intangíveis, tanto internos quanto os que se voltam para sua ligação com o meio se quiserem que a empresa perdure.

O estudo sobre estes recursos intangíveis são enfocados um livro da Editora Algar que será publicado proximamente (em inglês). No primeiro capítulo de Robert S. Nason, Ana Cristina González L. e Pramodita Sharma (2014) indicam que estes recursos imateriais internos têm a ver com a história e experiência únicas da família.

Associam-se ao conhecimento tácito que é aprendido e transmitido durante o convívio e as lides com a empresa e nos relacionamentos com as pessoas que a compõem.

Esta história da família cria um legado que impacta na formação da visão, na intenção de fazer a empresa caminhar. Gera uma visão de longo prazo, transmitida para seus membros. Torna menos provável que as decisões sejam pautadas simplesmente pelo retorno econômico-financeiro.

Outros recursos intangíveis englobam o processo de aprendizagem, a rede de relações sociais, a tomada de decisão e a profissionalização. Este patrimônio de experiência e de conhecimento tácito influencia e possibilita a criação de novos produtos e serviços, mantendo a vantagem competitiva da empresa.

Frequentemente seus gestores gerenciam por meios intuitivos (vejam a este respeito declaração da Luiza Trajano no terceiro Fórum de Mulheres Empreendedoras). É difícil articular e identificar as bases e a origem destas decisões intuitivas. Entretanto, as famílias empreendedoras precisam criar formas de conviver com elas e até de “passar” as diferentes formas de gerenciar.

A reputação é outro destes recursos intangíveis e é construída na rede de relacionamentos externos com pessoas e organizações, fazendo parte do capital social da empresa. Constitui outro patrimônio que permite surfar as turbulências do ambiente visto que encerram parcerias de confiança, com uma orientação de longo prazo.

Geralmente estas ligações com o ambiente são construídas pelo fundador ou líder da família. No entanto, outros familiares devem ser introduzidos nestas relações para permitir uma continuidade caso algo aconteça ao fundador.

A recombinação destes recursos é que permite a manutenção da vantagem competitiva. Fica então o desafio para as empresas familiares de reconhecer, inventariar estes recursos e encontrar formas de transmiti-los e potencializá-los.